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sábado, 20 de abril de 2024

CPC: a cultura como uma trincheira de luta

Abril de 1964, a sede da União Nacional dos Estudantes (UNE) é destruída pela Ditadura Militar fascista, e, junto com ela, é reprimida uma das mais avançadas organizações culturais do país. O Centro Popular de Cultura (CPC) surgiu em 1962 com o objetivo de disseminar a cultura popular revolucionária e apontar as contradições do sistema capitalista, colocando-se ao lado do povo na produção artística.

A sede da UNE, no Rio de Janeiro, foi a mais conhecida da organização do CPC, contudo, o movimento cultural não se restringiu a este estado e, por meio da UNE Volante, nos anos de 1962/1963, foram criados CPCs estaduais, geralmente ligados a ma União Estadual dos Estudantes (UEE).

Muitos dos ideólogos partidários da arte burguesa acusam falsamente a arte engajada do CPC como uma arte panfletária, portanto, inferior, que valoriza mais o conteúdo do que a estética. Vale ressaltar que tal conceito, tomado como universal e absoluto, é uma mostra da percepção burguesa do mundo, reflexo de uma classe dominante que despreza totalmente as manifestações artísticas que contestam a exploração e a injustiça do sistema capitalista.

Vianinha e o Teatro Militante

Num contexto de estruturação da indústria cultural na década de 1960, iniciaram-se as discussões sobre como o teatro brasileiro poderia ser valorizado e disseminado. Ocorria um debate nacional acerca de como popularizar e politizar o teatro brasileiro.

O Teatro de Arena passa a incorporar esta discussão de se fazer teatro a partir de peças brasileiras que valorizassem a cultura do país, além de denunciar a situação do povo, contudo, por ser de iniciativa privada, possuía limitações: altos preços de ingressos e apresentações em teatros que não eram frequentados pela maioria da população trabalhadora. O principal autor dessas críticas ao Teatro de Arena era Oduvaldo Vianna Filho, o Vianinha, que defendia peças apresentadas nas ruas, praças, fábricas, escolas, universidades, sindicatos, gratuitamente ou a preços baixíssimos, e principalmente que tivessem por base a teoria marxista, ou seja, defendia o desenvolvimento de um teatro militante.

A UNE Volante

A peça A mais-valia vai acabar, seu Edgar é a que melhor representa a experiência do teatro militante construído por essa organização de artistas, que passava ao público os conceitos básicos do marxismo, mostrando como eles estavam presentes na vida cotidiana do trabalhador, utilizando uma linguagem direta, simples.

Foi então que, em 1962, Oduvaldo Vianna Filho, Carlos Estevam Martins e Leon Hirszman propuseram à diretoria de UNE a criação de um curso de filosofia que utilizasse a peça A mais-valia vai acabar, seu Edgar como ferramenta didática. A partir dessa experiência, nascem as condições para a organização do CPC da UNE.

A partir da UNE Volante, projeto que proporcionava debates sobre a Reforma Universitária e apresentações teatrais do CPC nas capitais do Brasil, surgem 12 Centros no país.

O CPC possuía várias características que o diferenciavam dos demais movimentos culturais, pois trazia a proposta da arte como ferramenta de elevação da consciência da classe trabalhadora, uma arte que denuncia as injustiças do sistema capitalista e congregava todos os artistas (escritores, atores, artistas plásticos, compositores, músicos, etc.) que possuíssem o compromisso de produzir intelectualmente em prol da classe operária. Além das produções artísticas, os CPCs também promoveram alfabetização com cartilhas e livros de leitura baseados no método de Paulo Freire. Entre os envolvidos no CPC estavam os artistas Tom Zé, Capinam, Cacá Diegues, Carlos Lyra, Sérgio Ricardo, João do Vale.

Retrocesso

Infelizmente, a diretoria da UNE, composta majoritariamente há anos por setores reformistas, renega o compromisso da arte engajada do CPC da década de 1960. As iniciativas culturais da entidade, como o Circuito Universitário de Cultura e Arte (Cuca) e as Bienais de Arte, Cultura e Ciência se limitam a artistas populares entre os universitários, que são uma minoria da população brasileira, e priorizam uma arte que não questiona a sociedade capitalista, sendo, na verdade, um eco da ideologia burguesa.

A Rede Fora do Eixo é outro movimento cultural da atualidade. Surgiu em 2005 com a proposta de formar uma rede de cultura fora do eixo central Rio-São Paulo. As atividades organizadas pela rede incluem desde música, fotografia e filmes até teatro e poesia. Com o rápido crescimento da Rede, ela logo incorporou à sua rota o eixo Rio-São Paulo.

Apesar de fomentar as iniciativas artísticas alternativas e “independentes” da indústria cultural brasileira, o Fora do Eixo não possui a arte engajada como princípio, tirando do foco temas sociais. Além disso, há muitas críticas ao Fora do Eixo porque ele utiliza verba púbica para financiar seus festivais e, muitas vezes, não remunera os artistas de maneira justa. Empresas como a Vale do Rio Doce e Petrobrás se anunciaram patrocinadoras oficiais da Rede. Esse fato, somado à “neutralidade” política da Rede, mostra que está fora de cogitação desse movimento a perspectiva revolucionária.

Portanto, as maiores organizações culturais da atualidade não desenvolvem uma cultura combativa contra o capitalismo como o era com o CPC da UNE. Há algumas iniciativas culturais pontuais no sentido de denunciar o capitalismo, porém não há uma unidade nacional de ação neste sentido.

“Quero ser um propagandista do comunismo e quero sê-lo em tudo o que eu possa pensar, falar e descrever, e em tudo o que possa pintar. Quero usar a minha arte como uma arma”, palavras do artista plástico mexicano Diego Rivera.

É preciso unir todos os artistas que, assim como Rivera, acreditam na arte como uma arma revolucionária em prol da construção de um mundo mais justo em uma frente de produção cultural revolucionária. É preciso reconstruir um movimento cultural nacional que realmente tenha como objetivo principal elevar a consciência da classe trabalhadora acerca das contradições do capitalismo, permitir a popularização da arte e promover a disseminação de uma cultura popular que tome como base a história de luta do povo contra a exploração.

Mariana Mendes, militante da UJR

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