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quinta-feira, 28 de março de 2024

Kaiowás mais uma vez sob ameaça do nazismo do agronegócio

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As famílias que compõem a comunidade indígena de Kurussu Ambá, localizada a 420 quilômetros de Campo Grande, capital do Mato Grosso do Sul, estão sendo mantidas sob ameaça constante de despejo pela Justiça Federal e confinados num verdadeiro campo de concentração pelas milícias dos latifundiários, em mais um capítulo do genocídio do povo Guarani-Kaiowá pelo agronegócio. Os indígenas foram isolados pelos fazendeiros, sem acesso a água nem comida, e uma adolescente de 16 anos foi atropelada por seguranças particulares, segundo relatos indígenas.  Tudo isso sob um criminoso silêncio por parte da grande imprensa.

A situação pode resultar num massacre se for confirmada a ação de despejo pela Justiça Federal. A disposição dos Kaiowás é resistir a qualquer custo. O Aty Guasu (Conselho Indígena de Dourados) divulgou na última segunda-feira a seguinte posição: “já sabemos que uma juíza federal já autorizou diversos armamentos de fogo pesado contra as nossas vidas; juíza já mandou atacar, massacrar e matar nós, em qualquer momento seremos atacados”; “uma juíza fazendeira da justiça federal vai matar todos nós Guarani e Kaiowá na nossa própria terra tradicionais”; “nós como povo originário, hoje temos somente as nossas vidas, nossa decisão é resistir e ser todos mortos pela justiça federal e policiais do governo federal”.

A Faixa de Gaza Indígena

Os guarani-kaiowá são o segundo povo indígena mais numeroso do Brasil, possuem uma população total de cerca de 40 mil pessoas, que além do número considerável de suicídios, vive violência constante dos grandes latifundiários brasileiros. A região onde fica localizada a comunidade de Kurussu Ambá é conhecida como o velho oeste brasileiro, pela forte presença de grupos armados, que atuam como milícias privadas dos latifundiários para tocar o terror entre os indígenas que vem tentando retomar as terras originárias de seu povo, que lhes foram roubadas através de um processo de expulsão que teve início na década de 1970, protagonizado por uma aliança entre o agronegócio e a Ditadura Militar.

Só em 2013, foram assassinados 33 índios no Mato Grosso do Sul, segundo levantamentos do CIMI (Conselho Indigenista Missionário), vinculado à CNBB (Confederação Nacional dos Bispos). Este número está dentro da média de assassinatos que tem ocorrido todos os anos naquele Estado: de 2003 a 2013, foram assassinados 349 índios em MS, na maioria Guarani-Kaiowá, resultando numa média de 31 assassinatos por ano. Estes números são realmente alarmantes: está em marcha no nosso país um verdadeiro genocídio do povo Guarani-Kaiowá!

A presença de grupos armados na região e o cerco a que são submetidos os Guarani-Kaiowá renderam ao território de Kurussu Ambá outro apelido negativo: “Faixa de Gaza Indígena”, numa comparação da estratégia dos latifundiários com a política genocida do Estado de Israel. Seres humanos, inclusive mulheres grávidas, crianças e idosos, estão vivenciando todo tipo de violência. As famílias sofrem diariamente com ameaças, intimidações e fome. Não bastasse, a água consumida pela comunidade está contaminada por agrotóxicos, o que resultou na morte de várias crianças Guarani-kaiowá!

A mais recente vítima de violência na região, segundo a EcoAgência – agência de notícias ambientais criada por voluntários do Núcleo de Ecojornalistas do Rio Grande do Sul – NEJ/RS, é a indígena Jocikelle Martins, neta da rezadora Xurite Lopes. Conforme os Guarani-Kaiowá, Jocikelle foi alvo de um atropelamento criminoso, no dia 17 de novembro, por um motoqueiro: “Os pistoleiros atacaram os estudantes indígenas, uma aluna com 17 anos foi agredida e ferida gravemente e se encontra no hospital. Segundo as comunidades, hoje de manhã os pistoleiros estão atacando as crianças/alunos, essa menina Guarani Kaiowá massacrada entrou em coma, com pernas fraturadas, e ouvidos ensanguentados. Está em estado grave.” Xurite Lopes, uma idosa de 70 anos, foi assassinada por pistoleiros, na frente de seus netos, em 2007, na primeira tentativa retomada das terras ancestrais pelos Guarani-Kaiowás.

A luta pela retomada da terra ancestral indígena

Nesta primeira retomada, que ceifou a vida de Xurite Lopes, foi assinado um TAC (Termo de Ajustamento de Conduta) entre o Ministério Público Federal e FUNAI, em que ficou estabelecido a identificação de 36 terras indígenas reivindicadas pelos Guarani-Kaiowá, nas 06 bacias hidrográficas espalhadas no sul do estado. Porém, até agora só foi publicado apenas um relatório de identificação; o GT (Grupo Técnico) que visa a fazer a identificação do território de Kurussú Ambá está paralisado.

Em 22 de setembro deste ano, cansados de esperar pela demarcação de suas áreas tradicionais, os indígenas resolveram agir: saíram dos quatro hectares onde foram confinados e ocuparam uma pequena parte de seu território tradicional – terra que utilizam para plantar e onde se localizava a aldeia antiga e o cemitério, uma minúscula parte dos 18 mil hectares de terra que reivindicam.

Esta foi a quinta retomada da terra por parte dos indígenas. O movimento de recuperação das terras, que organiza as Grandes Assembleias – ATY GUASU – foi iniciado em 2007 e é uma reação ao confinamento que o Estado Brasileiro impôs aos Guarani-Kaiowá. Esse confinamento foi realizado para viabilizar a instalação do agronegócio ali: cana-de-açúcar, soja, gado, milho produzidos para exportação, em parceria com multinacionais, como Bunge, Cargill, ADM e Monsanto.

Mas toda essa violência não é suficiente para fazer o povo Guarani-Kaiowá desistir de lutar pela retomada de suas terras ancestrais. “Todos os Guarani-Kaiowá estão apoiando o movimento, a guerra não vai parar porque nunca resolveram a demarcação, enquanto isso lideranças são mortas e baleadas. Uma violência tamanha que já não aguentamos, mas vamos continuar resistindo”, declarou Eliseu Guarani-Kaiowá, liderança indígena.

Clodoaldo Gomes, jornalista
Conceição Cabral, bióloga

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