“Tem graça rir do opressor, não do oprimido”

374

O ator e escritor carioca Gregório Duvivier lançou, neste ano de 2013, seu segundo livro de poesia “Ligue os Pontos – Poemas de Amor e Big Bang”. Nacionalmente conhecido como um dos idealizadores e realizadores do projeto “Porta dos Fundos”, que se tornou, em menos de um ano de existência, o maior canal online de humor do mundo. Em Belo Horizonte para o lançamento do livro,  Gregório Duvivier  falou com exclusividade a A Verdade. 

A Verdade – Você é ator, cronista, escritor, poeta, roteirista, produtor e diretor. Agora, lança um livro de poesias. Por que “lugar de poesia não é na academia de letras e sim na academia de ginástica”?

Gregório Duvivier lança livroGregório Duvivier – Cabe em todo lugar. Gosto muito de poesia, sempre gostei. Não é à toa que lanço agora esse livro. Quando digo que a poesia tem que estar na academia de ginástica é porque entendo que o fazer e o ler poesia tem que ser através de processos comuns, vindos de todos os lugares. Às vezes, parece que o povo não sabe, não quer ou não pode saber de poesia, fica algo muito distante. A minha geração foi formada assim. No meu livro de poesia tem o Doug Funny e o Pikatchu porque eles me influenciaram bastante na vida. Acho que produzir cultura, também poesia, tem que ser um processo natural e simples, como um debate ou uma roda de conversa com as pessoas no bar, no banheiro, na academia de ginástica ou na academia de letras. Tem de ser acessível para todos. 

Como se dá seu processo criativo? Como consegue inspiração para tantas mídias e lugares?

Cada texto que escrevo tem uma inspiração. Para produzir material para o Porta dos Fundos não tem tempo de ter inspiração mirabolante porque eu escrevo dois textos por semana para lá. Então  sou obrigado a forçar minha inspiração, minha imaginação. A mesma coisa da coluna da Folha de S.Paulo); sou obrigado a escrever, se não, sou demitido. Poesia não! De todas essas coisas foi a única que não veio por encomenda. E das coisas que escrevo é a única que não é obrigatória, é a que vem da minha inteira inspiração e é fruto da minha vontade. Por isso, eu gosto muito desse livro! O que não cabe no Porta, ou na coluna, o que é mais lírico, acaba cabendo no livro. Muita coisa que escrevi ficou de fora. Mas eu acho o prazo também muito bom. Às vezes, as coisas que fazemos por encomenda são muito boas, a criatividade funciona bem também por “cabresto”.

Há muita dúvida sobre se há ou não limites para o humor. O que você quer dizer quando afirma que “nem toda piada é válida”?

É uma ótima pergunta! Realmente se se tem limites para o humor, é uma grande questão da humanidade. Acho que limite é uma palavra muito forte. Não acho que tem limites, proibições. Mas o que tem é o bom senso, a educação quase, até inteligência um pouco. Acho que a responsabilidade existe ou tem que existir para tudo. No cinema você está comovendo as pessoas. Então, você não pode fazer aquilo sem noção do alcance que está tendo. No humor também. Por exemplo, no Porta dos Fundos parece que a gente não tem limites, mas a gente tem vários. Volta e meia vamos filmar alguma coisa e dizemos “Não… isso aí está sendo agressivo um pouquinho demais”, e a gente fala que passou do limite e não faz. Alguns esquetes já foram assim. Por que, assim, a gente pode rir de tudo? Eu não sei. Tem coisas de que não vale a pena rir. Das minorias, por exemplo. Ou rir de um sofrimento real das pessoas. Não tem graça rir dessas coisas. Tem graça você rir do poder, você rir do opressor, não do oprimido. O humor, muitas vezes, cai na “presa fácil”, fica chutando cachorro morto e batendo em quem já apanha há séculos e séculos. Não tem graça você rir de gay porque é homofóbico, não é mais humor, tem um momento em que deixa de ser, ou o racismo. Não porque é uma piada que você pode tudo e ela não tem salvo-conduto para você ser escroto. Se for assim, você mata alguém e diz “não, foi só uma piada”, é stand up. A piada tem que atender às mesmas responsabilidades que todo o resto. No Porta a gente fez um vídeo sobre o racismo chamado “KKK” que é todo mundo vestido de Ku-Klux Klan e a gente ali ri do racista e não do negro. Portanto, não existem temas proibidos, existem abordagens proibidas. Você pode falar de racismo, de negros; agora, tem que se rir do racista, o objeto a rir é ele, senão é bullying, se está caçoando sem nenhuma função social.

Raphaella Mendes, Belo Horizonte