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sábado, 21 de dezembro de 2024

A Justiça neste país é pra rico, não é pra pobre

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No dia 22 de janeiro deste ano, a Polícia Militar do Estado de São Paulo, alegando cumprir um mandato de reintegração de posse emitido pelo Tribunal de Justiça do Estado, cercou e invadiu a ocupação conhecida como Pinheirinho, em São José dos Campos.

A área de aproximadamente 1 milhão de metros quadrados pertence à massa falida da empresa Selecta AS, de propriedade do megaespeculador Naji Nahas, que, em 1989, foi preso sob a acusação de manipular preços na Bolsa de Valores no Rio de Janeiro. Essa área foi adquirida por Nahas na década de 1980 depois do assassinato, nunca solucionado pela polícia, dos antigos donos, em 1969. Hoje a Selecta SA possui uma dívida de mais de R$ 15 milhões com a prefeitura de São José dos Campos.

A partir de 2004 o terreno, que se encontrava abandonado, passou a ser ocupado por famílias pobres e trabalhadoras e, em 2012, já estava com aproximadamente seis mil pessoas.

Em meados de janeiro, o governo do Estado e a prefeitura da cidade, ambos administrados pelo PSDB, exigiram a reintegração de posse da área, e várias idas e vindas na Justiça transformaram o caso em uma grande confusão. Mas a ordem de reintegração de posse do terreno foi suspensa quando o governo estadual e o governo federal entraram em acordo para abrir uma janela de negociação de 15 dias, para que a prefeitura local pudesse decidir se iria em frente com a reintegração ou transformaria o terreno em área de interesse social, passando então a titularidade para os moradores, em geral trabalhadores pobres e suas famílias.

O acordo, porém, não foi cumprido, e uma nova ordem judicial estadual, expedida pela juíza Márcia Faria Mathey Loureiro, manteve a desapropriação do terreno apesar de existir uma determinação  da Justiça Federal contrária ao despejo.  Na dúvida sobre a competência legal, coube à PM decidir continuar com a desocupação e ao desembargador do Tribunal de Justiça de São Paulo Rodrigo Capez – irmão de um deputado estadual do PSDB – confirmar a suposta legalidade da ação. Na manhã do domingo, dia 22, a Polícia Militar chegou ao local, sem aviso e com um efetivo de mais de 2 mil homens fortemente armados e um número ignorado de policiais municipais, para desocupar o terreno. A pressa para a reintegração de posse se explica pela imensa valorização dessa área nos últimos oito anos e pela proximidade entre o dono do terreno e líderes políticos poderosos.

Não há confirmação oficial sobre o número de mortos ou de feridos. Por um lado, a Polícia Militar e a Secretaria de Comunicação da Prefeitura de São José dos Campos informaram que são poucos os feridos e não havia nenhum morto, mas as diversas imagens comprovaram que ao menos o número de feridos era elevado. A OAB da cidade falou em vários mortos, inclusive crianças, e moradores denunciaram que houve de 3 a 4 mortos.

Campo de concentração

Desalojados de Pinheirinho

Há denúncias de que a polícia e a guarda civil da cidade estariam sequestrando feridos e mortos para evitar que entrassem nas estatísticas oficiais. O capitão Antero, da Polícia Militar, havia informado que não havia registro de mortos e tampouco de feridos graves no começo da noite do dia 22, porém os fatos começaram a desmenti-lo, como, por exemplo, informou o Blog da Solidariedade à Ocupação Pinheirinho que um morador pode ficar paraplégico depois de ser atingido por bala da polícia.

Após a desocupação, a prefeitura de São José dos Campos, demonstrando todo seu caráter fascista, identificou todos os moradores de Pinheirinho com pulseiras azuis e os conduziu para alojamentos precários que posteriormente se mostraram uma armadilha, pois, de acordo com relatos que podem ser vistos neste site, a Guarda Civil da cidade e a tropa de choque transformaram os alojamentos em verdadeiros campos de concentração onde houve mortes e agressões além da impossibilidade de acesso por parte da imprensa à área interna.  Mesmo apanhados de surpresa, os moradores tentaram armar barricadas, ateando fogo em carros e prédios públicos vizinhos e atirando pedras – demonstrando total combatividade frente à ação violenta da polícia.

A ação da PM de São Paulo, além de ilegal, foi realizada com o intuito de submeter os trabalhadores de Pinheirinho aos interesses econômicos dos poderosos da região, entre eles um criminoso comprovado como Naji Nahas. Para tanto, se promoveu um dia de terror, encurralando-se a população em suas casas e depois em alojamentos para agredi-la e humilhá-la, na esperança de que deixasse a cidade definitivamente. Para tanto, colocaram à disposição passagens para aqueles que quisessem ir embora, principalmente para o Nordeste, numa política de higienização populacional digna da época do nazismo.  O massacre do Pinheirinho é também mais uma prova de que “a Justiça neste país é pra rico, não é pra pobre”, como bem declarou o advogado das famílias do Pinheirinho, Antônio Donizete Ferreira.

Marcelo Viola, São Paulo

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