Entrevista com líder do PCT da República Dominicana

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Em maio deste ano, ocorreram as eleições para a presidência e o parlamento da República Dominicana, país com uma população de 9,9 milhões de habitantes e que divide com o Haiti a Ilha de São Domingos. A eleição foi marcada pela fraude e pela compra de votos por parte do governo e de seus aliados, que distribuíram até eletrodomésticos aos eleitores.

Apesar de a República Dominicana ter conquistado sua independência em 1821, o país já sofreu duas invasões dos Estados Unidos e continua sendo espoliado pelo imperialismo. Para conhecer um pouco mais a realidade do país, A Verdade entrevistou Manuel Salazar, secretário geral do Partido Comunista do Trabalho (PCT). Salazar é doutor em Políticas Públicas, formado em Economia, diplomado em Relações Internacionais e autor de diversos trabalhos, entre eles “A Esquerda não é minoria”.

A Verdade- Que avaliação o PCT faz das recentes eleições no país?

Manuel Salazar – Nas eleições parlamentares deste ano, na República Dominicana, o esforço do Partido Comunista do trabalho (PCT) foi centrado em compor uma Frente Ampla com candidatos de partidos alternativos progressistas, com um único candidato à presidência da República, com um só programa de governo e uma só linha de campanha. Essa reivindicação partiu do anseio de muitos jovens, como também de diversos setores da população, que almejavam a unidade dos setores progressistas.

A maioria do povo dominicano deseja o fim do PLD (Partido da Libertação Dominicana); a questão é ter uma alternativa que canalize essa insatisfação. Esse é o desafio para o movimento progressista. Se o movimento se mantiver dividido, o povo será derrotado; se o movimento progressista de esquerda se unir, pode ganhar a população descontente e ter força para apresentar uma opção viável, uma alternativa com possibilidade de triunfo. Enfim, a esquerda não é minoria, mas precisa estar unida.

Quais os principais problemas que o povo dominicano enfrenta atualmente?

Bem, no plano econômico e social, o povo e o país enfrentam atualmente os rigores da crise capitalista em curso e que hoje está agravada pela manipulação aventureira e corrupta da economia nacional feita pelo governo do PLD, o que aumentou o déficit fiscal e impôs ao povo uma reforma tributária que trouxe mais impostos e cortes significativos nas áreas sociais impostos pelo FMI.

Já em relação à política nacional, à frente do Estado está um setor reconhecidamente corrupto, abusador e que faz uso dos recursos do país em benefício próprio, controlando todos os poderes e instrumentos (Congresso e Justiça) para perpetuar-se no poder. Exemplo disso foi o que ocorreu nas últimas eleições, quando o governo PLD se impôs na base do uso e abuso dos recursos estatais. O resultado foi que os dois principais partidos burgueses, o PLD e o PRD (Partido Revolucionário Dominicano), obtiveram 98,21% dos votos, o que acontece desde 1966, ratificando o caráter centralizado do regime.

Em resumo, o atual governo significa a confirmação das piores práticas e valores dominantes, mas deixa também um amplíssimo campo para desenvolver uma frente nacional popular. Esta é a questão principal.

Que mudanças o PCT defende para o país?

Para nós, do Partido Comunista do Trabalho (PCT), a situação vivida pela República Dominicana abre um importante espaço para os setores populares na vida nacional.  Acreditamos que o momento agora nos impõe desenvolver nosso trabalho político e ganhar o povo para derrotar o grupo no poder, que é o elemento principal da contradição a ser resolvida em nosso país.

A República Dominicana faz fronteira com o Haiti. Qual a situação desse país vizinho? 

A situação do Haiti é muito preocupante. Lá, tudo é muito mais difícil porque a economia do Haiti, seus recursos naturais, tudo foi dizimado, foi roubado pelas potências imperialistas como França, EUA e Holanda, que praticamente transformaram o país num mercado que só dispõe de mão de obra barata. Ao contrário do que muitos pensam, a economia haitiana foi destruída muito antes dos fenômenos naturais que atingiram o país. Os problemas do Haiti não são consequência dos terremotos, de problemas naturais; claro que estas catástrofes foram um agravante, mas os problemas principais são consequência da apropriação que os países imperialistas fizeram de suas riquezas naturais.

Mas esse povo, que continua sendo surrupiado, não se entrega; pelo contrário, se mantém na luta, está nas ruas todos os dias para combater esses abusos que não são divulgados pela imprensa. O povo haitiano vai às ruas proclamar, exigir, a democracia e a sua soberania, pois o Haiti é um país ocupado militarmente por tropas estrangeiras apoiadas pela ONU, inclusive tropas brasileiras, que supostamente estão lá para ajudar e dar tranquilidade ao país, mas na verdade são tropas de ocupação, são tropas estrangeiras que estão retirando a soberania do povo haitiano.

Entre o povo dominicano e o povo haitiano, há um esforço por combinar e acertar uma coordenação de esforços. Ainda este ano, vamos organizar o que chamamos de “Encontro das Ilhas”, com diversos povos, e cujo propósito é coordenar ações, unificar ideias, esforços e unificar iniciativas que nos coloquem em condições de conquistar melhores condições de vida para ambos os povos. Vamos fortalecer a ideia de que somos dois povos irmãos, diferentes, mas irmãos, unidos por uma história comum, por uma história de luta anticolonial comum e que vivemos e ocupamos a mesma ilha. Teremos que buscar uma maneira de coexistir, de nos complementarmos e levarmos a cabo a luta para preservar as nossas reservas minerais, lutar pela nossa democracia e a nossa soberania de uma maneira comum.

Para encerrar, qual sua mensagem para o PCR e os revolucionários brasileiros?

Quero reiterar o nosso carinho e nosso respeito ao Partido Comunista Revolucionário e a todos os seus militantes, em especial ao nosso queridíssimo irmão Lula Falcão, que é um dirigente muito querido por nós, e não só pelo nosso Partido, mas por todos os partidos que integram a Conferência Internacional dos Partidos e Organizações Marxista-Leninistas (CIPOML). Lula é um dirigente muito maduro e com muitas ideias, muitas soluções para os debates que travamos no movimento. Seu trabalho O falso socialismo chinês é uma referência em matéria de educação nas fileiras de nossos partidos e de outros partidos irmãos. Desejamos que cuide de sua saúde e se mantenha forte. Este também é o nosso sentimento por esse partido irmão, ou seja, que siga crescendo e se desenvolvendo. O PCR é muito importante, não só para a classe operária brasileira, mas para todo o movimento revolucionário. O papel do Brasil, não somente na América Latina, como no mundo todo, é fundamental. Para nós é muito importante ter um partido irmão como o PCR num país como o Brasil. Obrigado!

Denise Maia, Rio de Janeiro