Em julho deste ano,foram divulgados na imprensa a existência de cartel e o pagamento de propina nas licitações de contratos para compra e manutenção de trens e metrôs em São Paulo. Essas denúncias foram feitas em maio ao Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade), baseadas em revelações de uma das empresas envolvidas, a alemã Siemens. A Siemens já foi multada na Alemanha, em 2007, por casos de propina, e resolveu revelar os fatos do metrô de São Paulo para ter imunidade no processo. Já foram confirmados mais de R$ 500 milhões de superfaturamento ao longo de 20 anos de governo do PSDB no Estado de São Paulo, envolvendo os governadores Mário Covas, José Serra e Geraldo Alckmin.
Neste caso de cartel, chamado de propinoduto tucano, os contratos para compra e manutenção de trens eram negociados entre as empresas concorrentes (e outras 19 envolvidas), que alternavam quem seria a ganhadora. Em uma licitação, deve ser contratada a empresa que oferecer o menor valor para um serviço dentro das exigências do Governo. Com a negociata das concorrentes, todas apresentavam propostas com um valor superfaturado.
Caberia ao Governo de São Paulo entender que esses valores eram altos demais, já que a manutenção de um trem com mais de 30 anos de uso custava cerca de 83% do valor de um trem novo. Para que o Governo fizesse vista grossa sobre os contratos eram pagas propinas a seu alto escalão e a funcionários do Metrô e da CPTM (empresas estatais que administram o funcionamento das linhas metroviárias e ferroviárias, respectivamente). Com as propinas e o superfaturamento gastou-se cerca de R$ 500 milhões a mais dos cofres públicos, e existem suspeitas de que esse valor chegue à casa dos bilhões de reais.
Em matéria especial da revista IstoÉ, aparecem os nomes de diretores da CPTM e do Metrô, secretários dos governos do PSDB, além dos três governadores de São Paulo do PSDB.
Fica claro que o principal partido da direita brasileira e as empresas foram os beneficiados com o desvio de dinheiro público. Justamente por isso, a imprensa paulista (e brasileira) esconde do povo esse crime absurdo.
Quem perde com a corrupção no metrô?
Em todo o Brasil os trabalhadores sofrem com a deficiência dos transportes públicos e a falta de estrutura para mobilidade urbana nas cidades, principalmente nas capitais. Em São Paulo, assim como vários outros fatos, tudo é maior. A linha 3-Vermelha, que liga a Zona Leste à Oeste, transporta cerca de quatro milhões de pessoas por dia. Nos horários de pico, os trens chegam a transportar 11 pessoas por metro quadrado. Uma condição insana onde não é possível mexer sequer um braço durante várias estações.
A lotação dos transportes também proporciona o aumento do assédio sexual sobre as mulheres, que passam por situações constrangedoras todos os dias. Em alguns horários, é preciso ficar por vários minutos aguardando para embarcar e constantemente ocorrem discussões e brigas dentro dos vagões ou nas plataformas. Em algumas linhas a viagem pode demorar mais de uma hora e as pessoas precisam voltar do trabalho em pé, prensadas e suportando altas temperaturas, já que os equipamentos de refrigeração quase nunca funcionam.
Enquanto os donos de altos cargos no Governo e nas empresas recebem salários exorbitantes e propinas milionárias, trabalhadores e estudantes passam aperto – literalmente – todos os dias. Diariamente ocorrem também casos de agressão e afastamento de funcionários que tentam manter a ordem nos embarques. Todos os anos, o Sindicato dos Metroviários e Ferroviários precisa fazer grandes mobilizações, que quase sempre terminam em greve, para poder receber um mísero aumento salarial. A terceirização causa ainda mais precarização com a contratação de seguranças quase sempre despreparados e funcionários da limpeza e manutenção sem equipamentos ou com salários baixos.
Os acidentes e paralisações de linha que aumentam a cada dia são reflexos da falta de verbas para manutenção e compra de trens. Ainda pior é o caso da tarifa, que, em São Paulo, chegou aos R$ 3,20 e só manteve o valor anterior de R$ 3,00 porque milhares de paulistanos foram às ruas em junho. Os estudantes sofrem com uma cota limitada para o acesso à meia-passagem – são apenas 48 viagens por mês. Estudantes de cursos pré-vestibulares e de idiomas não têm direito a essa cota, e os que estudam fora da Capital não podem usá-la no transporte municipal.
Como vemos, o sistema capitalista não foi feito para melhorar a qualidade de vida da população. Ao contrário. Nele, toda a riqueza produzida pelos trabalhadores vai parar nas mãos sujas de uma reduzida elite, enriquecendo ainda mais os já ricos, seja por meio do aumento das tarifas e dos impostos seja por meio de propinas e desvios de verbas públicas.
Lucas Marcelino, São Paulo