Não é casualidade que o Governo equatoriano encerre a última rodada de negociação de um Tratado de Livre Comércio (TLC) com a União Europeia (UE) no primeiro dia da Copa da Fifa.
Em torno do assunto do TLC foi montada uma grande farsa, recorrendo a diversas mentiras, como exibir várias vezes a declaração presidencial afirmando que “não se firmará um TLC”. De fato, o mesmo presidente é autor de várias publicações que descrevem com detalhes as falácias do livre comércio. Mas isso é coisa do passado, pois agora aquelas preocupações são vistas apenas como parte de uma campanha de propaganda para tratar de não mencionar a crua realidade: o TLC com a UE. Sim é um TLC.
O deslize, há alguns meses, do ministro que encabeça as negociações, admitindo que o Equador deverá aderir ao Acordo firmado por Colômbia e por Peru foi estranhamente encoberto na memória graças a inumeráveis frases oficiais ambíguas e oscilantes.
Com efeito, na Colômbia e no Peru dificilmente alguém poria em dúvida que o que foi firmado com a União Europeia é um tratado de livre comércio; reconhece-se melhor que nome de “Acordo Comercial Multipartes” é temporal para a UE, enquanto se unem Equador e Bolívia, as partes faltantes… Nem tampouco México e Chile, onde os acordos de Associação com a UE já têm vários anos de aplicação, há dúvidas que estes acordos são, em realidade, acordos de livre comércio.
Desta maneira, a UE vai completando seu plano de domínio na região. Já firmou Acordos de Associação com México, Chile, América Central, Colômbia, Peru e está abrindo caminho para retomar as negociações com o Mercosul.
O TLC Equador-UE constrói, na prática, uma ALCA maquiada com outro nome e outro autor. O plano geoestratégico dos grandes países europeus é, ao final das contas, controlar territórios e mercados com “as regras de jogo claras” (não soa conhecida essa frase?) que garantam plenamente os seus investimentos (relacionadas com o abastecimento – o controle do negócio – de petróleo, minerais, energia, água, comunicações, transporte, etc.) e os direitos de propriedade intelectual (por exemplo, as patentes sobre fármacos; os direitos de propriedade sobre as sementes e outros).
Então, a pergunta é por que tanta demagogia e eufemismo no caso do Equador? A resposta, nos parece, tem a ver com o país, pois o Equador derrubou com a resistência passada ao modelo neoliberal, com as mobilizações contra a ALCA e o TLC bilateral com os EUA e, depois, com o processo constituinte, com passos concretos para fazer frente ao livre comércio e as pretensões das corporações transnacionais, ponta de lança do capitalismo selvagem.
De fato, a Constituição do Equador proíbe a privatização da água e estabelece que sua gestão será exclusivamente pública e comunitária. Também reconhece que a soberania alimentar é uma obrigação do Estado para garantir a autossuficiência de alimentos sãos e culturalmente apropriados. Assinala que, no âmbito das compras públicas, os produtores nacionais, particularmente os médios e pequenos, terão um trato preferencial. Menciona de forma clara que não poderão ser celebrados tratados internacionais que cedam soberania em tribunais de arbitragem internacional. Posição que, com certeza, ajudou o impulso de uma auditoria de tratados bilaterais de inversão que, nas atuais circunstâncias, fica em respaldo político.
A União Europeia é o maior exportador de alimentos elaborados, o segundo maior exportador de leite e seus derivados e de carne de vaca e o terceiro maior exportador de aves. É, além disso, o segundo maior provedor de serviços. Em condições de crise, como a que atravessa o ano de 2008, a UE espera que estes acordos a ajudem a sair de sua grave situação econômica.
É um jogo de cartas marcadas. A goleada parece iminente. E, para completar o panorama, alguns espaços oficiais vêm trabalhando para “harmonizar” a Constituição com os termos do Acordo, preparando assim um gol contra.
Traduzido de www.ecuadorlibrered.tk