A cada semana cerca de 3.000 famílias estão sofrendo corte no fornecimento de água na cidade de Detroit, Michigan, EUA, por débitos de $150 dólares ou mais de dois meses de atraso no pagamento.
Este foi o caso de Charity Hicks*, uma respeitada líder comunitária afro-americana que sempre esteve à frente de diversas campanhas para garantir aos cidadãos de Detroit o direito a uma água pública e acessível.
Quando os representantes da empresa chegaram ao seu prédio, Charity, caminhando em direção ao carro da companhia, exigiu que lhe mostrassem a notificação de corte. A resposta do funcionário foi avançar o veículo em sua direção, ferindo sua perna. Dois policiais brancos chegaram rapidamente – não para fazer um boletim de ocorrência, mas para prende-la. Ela foi conduzida à delegacia debaixo de zombarias e permaneceu presa por dois dias.
Ao mesmo tempo em que os pobres estadunidenses sofrem com a interrupção do fornecimento de água em suas casas, privando-lhes de um direito básico para uma vida digna, grandes usuários também estão devendo a companhia de água, como o clube de golfe de Detroit, a arena de Hockey do Red Wings e o estádio de futebol da Ford, totalizando uma dívida de cerca de $30 milhões de dólares. Mas nenhum funcionário da companhia, no entanto, apareceu para cortar a água de nenhum deles.
Diversas manifestações populares tem ocorrido em Detroit. Uma das mais expressivas ocorreu no dia 18 deste mês, quando milhares de pessoas marcharam rumo ao Detroit’s Hart Plaza e conseguiram suspender os cortes por 15 dias. Com gritos de “banks got bailed out, we got sold out” (algo como “os bancos são resgatados, nós somos rifados”, em tradução livre), os manifestantes expressavam sua indignação com o fato de que a empresa de abastecimento de água, a DWSD, doou $537 milhões de dólares a bancos para evitar sua falência.
Outra manifestação, ocorrida ontem (24), portava um abaixo-assinado com cerca de 6 mil assinaturas de todo o país contra os cortes, e também solicitava que o Canadá, que faz fronteira com a cidade de Detroit, fornecesse água para os cidadãos estadunidenses.
Segundo Cataria de Albuquerque, relatora especial da ONU para o Direito à Água e ao Saneamento, o corte de água constitui uma violação aos direitos humanos caso as pessoas afetadas realmente não tenham condições de pagar.
Na última década o número de famílias que apresentam atrasos na conta de água em Detroit aumentou 119%, chegando agora a mais de 150 mil consumidores. E os principais atingidos são a população negra, que constitui a parte mais pobre da cidade.
Glauber Ataide, com informações de The Guardian e Truthout
Atualização: A ativista Charity Hicks, citada nesta matéria, morreu poucos dias após o episódio aqui relatado. Ela foi atropelada em um ponto de ônibus em Nova York por um motorista que fugiu do local.