O Dia do Índio é celebrado em 19 de abril numa referência ao 1º Congresso Indigenista Interamericano (1940), assim oficializado por um decreto do então presidente Getúlio Vargas, em 1943. Mas os povos indígenas brasileiros não querem apenas ser “lembrados” uma vez por ano. Em torno desta data, de 24 a 28 de abril, será erguido, em Brasília, o Acampamento Terra Livre com a expectativa de reunir mais de 1.500 lideranças de todo o país. Esta mobilização acontece como resposta a uma grande ofensiva contra direitos históricos das populações tradicionais promovida pelos poderes Executivo, Legislativo e Judiciário. O lema do acampamento é “Unificar as lutas em defesa do Brasil indígena”. A ação é organizada pela Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib).
Durante os dias do acampamento acontecerão marchas, atos públicos, audiências com autoridades dos três poderes, debates, palestras, grupos de discussão e atividades culturais. Alguns dos temas pautados são: suspensão das demarcações indígenas; enfraquecimento das instituições e políticas públicas indigenistas; iniciativas legislativas anti-indígenas que tramitam no Congresso; “Marco Temporal”, pelo qual só devem ser consideradas terras indígenas as áreas que estavam de posse de comunidades indígenas na data da promulgação da Constituição Federal (5/10/1988); empreendimentos que impactam negativamente os territórios indígenas; precarização da saúde e educação indígenas diferenciadas; negação do acesso à Justiça; criminalização das lideranças indígenas.
Ministro da Justiça é ruralista e anti-indígena
O novo titular do Ministério da Justiça, Osmar Serraglio (PMDB-PR), empossado no dia 7 de março, foi um dos mais atuantes deputados federais da bancada ruralista, declaradamente racista, da região Sul do país, defensor da PEC 215/00, que trata das demarcações de terras. Presidiu, em 2016, a Comissão de Constituição e Justiça quando aconteceu a cassação do mandato de Eduardo Cunha, porém sempre foi membro da tropa de choque do ex-parlamentar. Dias depois de sua posse, declarou que “terra não enche a barriga de ninguém”. Em outras palavras: “não é de terra que os índios precisam”.
“Essa declaração mostra a ignorância dele sobre a questão indígena. Deveria saber que os indígenas têm um modo de vida que depende da garantia territorial, como prevê a Constituição. Sem a terra, é impossível. Isso mostra o tamanho do desrespeito dele para com a cultura, a tradição dos povos originários”, declarou Sônia Bone, 43 anos, da tribo Guajajara, do Maranhão, e uma das coordenadoras nacionais da Apib.
No Congresso Nacional existem mais de 180 medidas anti-indígenas que visam a retroceder ou suprimir direitos. Dessas, 19 dizem respeito diretamente à flexibilização do licenciamento ambiental para facilitar a implantação de hidrelétricas, para expansão do agronegócio, da pecuária, ou seja, para facilitar o acesso do capital aos territórios indígenas. Atualmente, 13% do território nacional é terra indígena regularizada.
Sobre a questão territorial, Sônia ainda levanta outro aspecto: “Poucos têm a consciência de que esses territórios não só proporcionam a manutenção do modo de vida indígena como também proporcionam o equilíbrio ambiental, climático, o regime de chuvas, preservam as nascentes, a qualidade do ar. Tudo isso é protegido com nosso próprio modo natural de viver. E o benefício não fica só para nós, fica para todo mundo. Isso garante a vida no planeta. Se não fossem os territórios indígenas, o Brasil já seria um verdadeiro deserto”.
O Brasil tem cerca de 230 povos indígenas, que falam cerca de 180 línguas. Cada etnia tem sua identidade, rituais, modo de vestir e de se organizar. Somente no Mato Grosso há 42 etnias identificadas, o que significa uma população superior a 28 mil indígenas. Do total de 207 milhões de brasileiros, menos de 0,5% são índios.
Rafael Freire, jornalista