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domingo, 17 de novembro de 2024

20ª Romaria das águas de Minas Gerais

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Com o tema Povos da Cidade e do Sertão Clamando por Água, Terra e Pão, e com o lema Povos, Rios, Veredas e Nascentes são Dons de Deus em Romaria e Resistência, a 20ª Romaria das Águas e da Terra de Minas Gerais acontecerá de forma processual no Noroeste de Minas, na Diocese de Paracatu, e terá celebração final no dia 23 de julho de 2017, na cidade de Unaí. Antes acontecerão várias pré-romarias nas cidades de Uruana, Buritis, Chapada Gaúcha, Arinos, Urucuia, Bonfinópolis, Unaí e Paracatu, entre outras. Convocada pela memória subversiva do evangelho da vida e da esperança, fiel ao Deus dos pobres, à terra, às águas de Deus e aos pobres da terra e das águas, também ouvindo o clamor que vem dos biomas violentados – Cerrados, Mata Atlântica, Amazônia, Caatinga, Pampas e Pantanal – e seguindo a prática de Jesus, a Comissão Pastoral de Terra (CPT), há quatro décadas, vem realizando em todo o Brasil romarias da Terra, que com o passar dos anos, foi ampliado para Romaria das Águas e da Terra.

As romarias consistem em espaço importante de reflexão, celebração, anúncio, denúncia e posicionamento frente à concentração de terras, à privatização das águas, dos direitos negados aos povos do campo e das cidades. Também anunciam as conquistas e vitórias do povo organizado, o reencontro com a terra prometida e partilham saberes e sabores.

Para a realização das romarias, a CPT conta com a participação das dioceses, paróquias, Comunidades Eclesiais de Base (CEBs), Cáritas, Pastorais Sociais, STRs e Movimentos Sociais Populares.

Em Minas Gerais acontecem romarias regionais com foco central nos problemas locais nas lutas dos camponeses e das camponesas. Desde 1996 a Romaria das Águas e da Terra vem sendo celebrada anualmente em caráter estadual como um momento forte de celebração da vida e reconhecimento da sacralidade da vida humana e de toda a biodiversidade, da Mãe Terra e de nossa irmã Água. São Francisco de Assis, patrono da romaria, é o símbolo da sociedade que queremos, onde tudo e todos devem agir como irmãos e irmãs, construindo fraternidade universal a partir dos oprimidos e superexplorados. O Papa Francisco nos apoia e exorta: “Saiam para as ruas, para a luta!”.

Antes da 1ª Romaria Estadual da Terra e das Águas de Minas Gerais, que aconteceu no dia 4 de outubro de 1996, na cidade de Manga, no Norte de Minas, à beira do rio São Francisco, aconteceram duas romarias da Terra no Noroeste de Minas. A primeira, no dia 25 de julho de 1991, em Igrejinha, distrito de Arinos, no meio de um grande conflito de terra na Fazenda Menino – que já serviu no passado de esconderijo de muitos líderes de esquerda, como Brizola, Oscar Niemeyer, Carlos Lamarca e outros, que fugiam da perseguição dos tiranos da ditadura militar-civil-empresarial.

 Nessa romaria, mais de mil romeiros/as marcharam a pé doze quilômetros, de Igrejinha até a Fazenda Menino, onde o fazendeiro José Alfredo tinha mandado seu jagunço Milton matar os irmãos camponeses posseiros Januário e José Natal. O jagunço foi condenado a 22 anos e 6 meses de prisão e esta romaria foi o ponto de partida para muitas conquistas de terra pelos movimentos sociais do campo no Noroeste de Minas. Na ex-Fazenda Menino estão assentadas mais de 500 famílias camponesas nos Caminhos do Sertão de Guimarães Rosa. A 1ª Romaria da Terra de Arinos mostrou aos fazendeiros que matar posseiros e trabalhadores rurais para tomar suas terras já não ficaria mais impune, como os assassinatos dos camponeses Praxedes, Sr. Júlio de Miranda e dezenas de outros no Norte e Noroeste de Minas.

A 2ª Romaria da Terra do Noroeste de MG aconteceu na cidade de Arinos no dia 25 de julho de 1993, com aproximadamente 5 mil romeiros. Os fazendeiros, com o poder do coronel Jarbas, organizaram 250 policiais para prender os caminhões que traziam os romeiros e tentar proibir a entrada deles na cidade de Arinos. Os romeiros tiveram que seguir a pé por até 20 quilômetros. A desculpa era: “caminhão sem toldo não pode carregar ninguém na carroceria”. Revistaram todas as bolsas das mulheres, jovens e idosas. Depois desta romaria, todas as grandes fazendas de Arinos se tornaram assentamentos, que hoje são 27 ao todo. Nos 14 municípios do Noroeste de MG, os camponeses Sem Terra, sob liderança dos STRs (Fetaemg) e MST, já conquistaram 77 assentamentos de reforma agrária. “Conquistamos a terra, mas agora estão nos roubando as águas”, lamentam os camponeses.

Todas as romarias têm, no geral, os mesmos problemas e reações e têm, acima de tudo, como missão ouvir os clamores dos camponeses, das terras e das águas como princípio e sustentabilidade da vida. A região Noroeste de Minas Gerais, marcada pela luta pela terra, pela reforma agrária e por direitos básicos no campo está sendo violentada pela multiplicação dos agentes do agronegócio e do hidronegócio. Os municípios de Unaí e Paracatu são os campeões do Brasil em número de pivôs de irrigação e em área irrigada, mais de 150 mil hectares. O exagero de agrotóxico jogado na agricultura empresarial tem causado uma “epidemia” de câncer, Alzheimer e outras doenças.

As fontes de água, que eram abundantes, estão sendo dizimadas pelo capitalismo e pelos capitalistas. Barragens construídas em nascentes de córregos, voltadas para a irrigação das terras dos grandes empresários, têm secado córregos de água que serviam aos moradores locais, o que provocou crise hídrica gravíssima na região. Sob a liderança do Comitê de Defesa da Bacia do Rio Urucuia (Comdhru), o povo camponês de Buritis fez vigília durante nove meses na nascente do Córrego Barriguda (a cerca de 50 quilômetros da cidade de Buritis, MG) denunciando a injustiça agrária e hídrica vivida no Noroeste de Minas, as dificuldades impostas aos moradores locais/camponeses e alertando para a necessidade de lutas coletivas para a superação da crise hídrica desde a sua raiz  – neste caso, o Rio Urucuia, um dos principais afluentes do Rio São Francisco.

Antigamente, esperava-se vir a chuva para plantar, mas agora os empresários do agronegócio plantam várias vezes por ano. E para isso captam água das lagoas, dos córregos, dos rios e do lençol freático via poços artesianos. Só que a captação está beneficiando apenas alguns proprietários empresários e deixando milhares de famílias camponesas na dificuldade. Assim, a miséria está se alastrando no campo e na cidade no Noroeste de Minas também.

 O que acontece naquela região é que os grandes fazendeiros praticantes da agricultura empresarial têm avançado na consolidação de seus projetos de irrigação de forma abusiva. Ocorre que se tornou rotina na região a construção de barragens nas cabeceiras dos principais córregos, em nascentes e lagoas, com o objetivo de captar água para a irrigação. Isso funciona com uma quantidade enorme de água sem que eles sejam autorizados ou licenciados pelos órgãos ambientais. E esses córregos são responsáveis pelo abastecimento dos rios Urucuia, Preto, Paracatu e outros afluentes do rio São Francisco. O poder público/Estado e os órgãos ambientais estão sendo cúmplices dessa devastação socioambiental. Não fiscalizam e concedem licenças ambientais, que na prática são usadas para se captar muito mais água do que o permitido legalmente. A 20ª Romaria das Águas e da Terra de Minas vem denunciar isso e anunciar que o caminho justo e ecologicamente sustentável é a reforma agrária e a agricultura familiar agroecológica em comunhão com a preservação ambiental. Isso precisa ser garantido através de lutas coletivas em nome da responsabilidade socioambiental e geracional que temos.

Para mais informações: www.xxromariadasaguasedaterramg.blogspot.com.br

Frei Gilvander Luís Moreira, da CPT

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