“Enquanto não se respeitar no operário e no camponês a dignidade da pessoa humana, os cristãos não estarão sendo cristãos”.
Morreu na noite do último dia 27 de agosto, aos 98 anos de idade, o arcebispo emérito da Paraíba dom José Maria Pires, o mais velho dentro do bispado da Igreja Católica no Brasil. O bispo estava internado em um hospital de Belo Horizonte (MG) para tratar uma pneumonia depois de chegar doente de uma viagem a trabalho. Nascido em Córregos-MG, no dia 15 de março de 1919, dom José Maria Pires tinha mais de 70 anos de ordenação como padre e 60 como bispo.
O sepultamento se deu no sepulcro da Igreja Basílica de Nossa Senhora das Neves, em João Pessoa-PB, na tarde do dia 29, momento marcado por grande emoção da população paraibana residente na Capital e em diversas cidades do interior, especialmente camponeses.
Dom José foi presidente da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) – Regional Nordeste 2, que reúne os Estados do Rio Grande do Norte, Paraíba, Pernambuco e Alagoas. Nomeado como quarto arcebispo da Região Metropolitana de João Pessoa, esteve à frente da Igreja Católica na Arquidiocese entre os anos de 1966 e 1995. Sua última visita à Paraíba aconteceu em maio, quando ele participou da posse do atual Arcebispo, dom Manoel Delson. Alguns dias antes, ele tinha representado a Arquidiocese durante a Assembleia da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil.
Em nota oficial, dom Delson destacou que a morte de dom José aconteceu no domingo em que a Igreja celebra a vocação do catequista e tratou o bispo como “um grande pastor”. “Ele foi um dos catequistas mais ativos e humildes à frente do seu rebanho, e que soube impor a sua voz, sempre que necessário, em defesa dos menos favorecidos”, disse na nota.
Até 1957, era o único bispo negro no Brasil, e sempre pautou em suas missas, em entrevistas e discursos a necessidade de organização do movimento negro para lutar contra o racismo. Após uma romaria em comemoração ao centenário da abolição da escravatura, no Quilombo do Palmares, em Alagoas, passou também a ser chamado de Dom Zumbi. Proferiu uma famosa homilia na histórica Missa dos Quilombos, em 1991, na cidade do Recife, considerada pelos historiadores como um dos textos fundadores da Teologia Afro-Brasileira Contemporânea, desembocando na criação da Pastoral Afro-Brasileira (PAB).
Defensor das comunidades quilombolas, dos povos indígenas, dos camponeses, das mulheres em situação de prostituição, incentivou as Comunidades Eclesiais de Base, os movimentos populares tornando-se um dos precursores da Teologia da Libertação, bem como atuou como articulador da Comissão Pastoral da Terra (CPT). Dizia: “Enquanto imperar a fome, a miséria e o analfabetismo, enquanto não se respeitar no operário e no camponês a dignidade da pessoa humana, os cristãos não estarão sendo cristãos”.
Também atuou fortemente na defesa dos Direitos Humanos, criticando reiteradas vezes a Ditadura Militar, defendendo e visitando presos políticos em São Paulo e Pernambuco. Em 1975, o Centro de Defesa dos Direitos Humanos da Arquidiocese da Paraíba, convidando para sua presidência o corajoso advogado Vanderley Caixe, que havia sido preso político em São Paulo, em 1969, por participar da luta armada contra a Ditadura. Foi sucedido tanto no posto de arcebispo quanto na postura política por dom Marcelo Carvalheira (falecido em 25/03/17, ver A Verdade nº 193) e morreu na mesma data (27 de agosto) de dom Hélder Câmara.
Redação Paraíba