Poema | Um quilombo em cada poeta negro

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Arte: Karen Almeida

UM QUILOMBO EM CADA POETA NEGRO

Minha cabeça dói

E a insônia me consome as boas palavras

dentro de cada poeta negro existe um quilombo

Mas me mastiga cada vértebra

A movimentação dos homens

O movimento é a sede dos que tem

pressa

Então escrevo

Assim talvez minimizo o pouco que faço

devorando-me o osso a indiferença

Então escrevo

Assim talvez as palavras mudem o curso do barco

Lateja minha sanidade o prato vazio

Lateja minha sanidade a podridão dos porões

A mistura de todas as necessidades

A Fome, as fezes, a fé….

Lateja minha sanidade cada mãe pobre preta

A febre, o frio…

Tirando da própria boca para dar ao filho

Eles indiferentes invisibilizaram a nossa dor

Mastigaram os nossos sonhos

Em cada cana de açúcar triturada

Beberam nosso suor engenho a dentro

Nos castraram e nos trataram como animais

Nos castigaram, trancaram tronco a dentro

E talvez essa seja a menor das dores

Me olho no espelho a cada dia

Envelhecendo décadas em anos

Violados fios de cabelo a dentro…

Mergulho pela última vez na água salgada

Meus irmãos, milhares afogados mar a dentro

Porém, lá no fundo algo me sussura aos ouvidos:

viver é a minha maior vingança!

Victor Aicau

Este poema também pode ser lido e interpretado de baixo para cima.