Carla Castro*
OPINIÃO – Enquanto os eleitores lutam para sobreviver sem emprego, comida, saúde e moradia digna, os vereadores de Porto Alegre vão gastar R$ 10,6 mil para a confecção de carteiras de couro legítimo e personalizadas. Ao todo, serão produzidos 144 exemplares para os 36 vereadores, ao custo de R$ 74 a unidade. De acordo com o presidente da Câmara de Vereadores de Porto Alegre, Marcio Bins Ely (PDT), a demanda surgiu dos vereadores eleitos para o primeiro mandato em 2020 e que o modelo escolhido foi inspirado nos legislativos estadual e federal.
O argumento de identificar efetivamente os vereadores cai quando a mesma licitação contrata a confecção de cartões de identificação funcional por um valor bem mais baixo: R$ 15, o que totaliza R$ 540 reais.
O velho e conhecido carteiraço está sendo institucionalizado e será pago por todos nós. Porém, é visível que os nobres vereadores não se debruçaram sobre a legislação vigente no país, pois de acordo com a Lei 13.869/19 trouxe a figura típica que até então não existia no ordenamento jurídico brasileiro. Também conhecida como Lei de Abuso de Autoridade, ela prevê como crime a utilização de cargo ou função pública ou até mesmo invocar a condição de agente público para se eximir ou para obter vantagem ou privilégio.
Nos dois casos há previsão de pena no Código Penal. No primeiro, se agente público impor a vantagem está configurado crime de acordo com o artigo 316, já se o agente público solicitar, receber ou aceitar promessa de vantagem indevida, estará configurado o crime de corrupção passiva, conforme o artigo 317.
Cabe a nós, eleitores acompanharmos os processos licitatórios que correm nas Câmaras e nas Assembleias para que casos como esse não se repitam. É inconcebível que em plena pandemia vereadores se preocupem mais com uma carteira de couro do que com as centenas de pessoas em situação de rua que passam as noites frias sem um teto para dormir. Esse sistema serve a quem só pensa em quantificar votos através de ações assistencialistas. É nítido que não há interesse em acabar com a desigualdade social, pois a pobreza gera dependência, que por fim, gera voto.
Até quando eles vão se aproveitar disso?
* Jornalista, estudante de Direito, coordenadora estadual do Movimento de Luta nos Bairros, Vilas e Favelas do RS (MLB/RS)