Claudiane Lopes | Porto Alegre
LUTA POPULAR – O Movimento de Luta nos Bairros, Vilas e Favelas (MLB) ocupou, no dia 28 de maio, um prédio de dez andares da União, que estava abandonado há mais de cinco anos no Centro de Porto Alegre. No lugar, organizou a Ocupação Sepé Tiaraju, uma homenagem ao líder da República Comunista Guarani, que lutou bravamente contra as metrópoles (Portugal e Espanha).
Depois de quatro meses de negociação com a Secretaria do Patrimônio da União (SPU), o movimento conquistou, no início de setembro, os critérios necessários para assumir a posse do prédio,. No momento, o MLB aguarda a assinatura do contrato pela Caixa Econômica Federal e a suspensão da reintegração de posse para prosseguir o enquadramento do imóvel para o programa Minha Casa, Minha Vida / Entidades.
A Ocupação Sepé Tiaraju abriga cerca de 80 famílias pobres, indígenas, vítimas de violência doméstica, pessoas com deficiência e estudantes, proporcionando um ambiente seguro, organizado, salubre, com luz, água e refeitório. “Eu morava de favor em várias casas, com meu filho, e estava em situação de vulnerabilidade social. Fui morar na Casa Mulheres Mirabal, com quem fui construir a Ocupação Sepé. Hoje, eu e meu filho temos um teto, comida, formação política, geração de renda e logo mais terei meu apartamento. Estou muito feliz de estar construindo essa luta”, afirma Tâmisa Fleck, 33 anos, coordenadora da ocupação.
A Sepé tem uma equipe técnica composta por arquitetos, engenheiros e seguranças do trabalho, que construíram um projeto de interesse social, que fará a obra chamada de “retrofit” (reforma de prédios abandonados para serem usados no programa de habitação federal). Esse projeto garantirá a construção de apartamentos, biblioteca, brinquedoteca, salão de festa, auditório, três salas de aula, sala de reunião, bicicletário e quatro lojas no térreo para geração de renda para os próprios moradores.
A ocupação ocorre em um momento em que o déficit habitacional no Rio Grande do Sul atinge mais de 220 mil famílias. Dados do Departamento Municipal de Habitação (Demhab) apontam que há hoje, em Porto Alegre, mais de 60 mil famílias em programas habitacionais. Há ainda 84 mil pessoas vivendo em 142 áreas de risco, mostra levantamento do Serviço Geológico do Brasil.
Essa situação não difere do resto do país, é o que afirma Poliana Souza, coordenadora nacional do MLB: “O déficit habitacional é gigante, temos 8 milhões de famílias brasileiras sem teto, e é fundamental pensarmos numa política habitacional que vá além de novas construções de casas, mas que destine imóveis sem função social para moradia. As ocupações urbanas só cresceram nos últimos seis anos. O MLB fez 30 ocupações durante a pandemia, muitas delas ainda não regularizadas. O Governo Federal tem 790 mil imóveis que não cumprem função social em todo o Brasil. É necessário que se faça a regularização fundiária para milhares de ocupações irregulares existentes no país e se destinem prédios sem função social para moradia. Só assim podemos ter uma verdadeira reforma urbana numa sociedade em que o lucro não fique acima dos direitos”, pontua ela.
O coordenador do MLB no Rio Grande do Sul, Luciano Schafer, conta que os moradores receberam a notícia como uma batalha vencida em decorrência da mobilização das famílias e de apoiadores. Segundo ele, o grupo continua mobilizado para avançar para a próxima etapa, conseguir que o projeto seja aprovado e que a posse do prédio seja definitiva para os ocupantes. “A Ocupação Sepé Tiaraju é um exemplo de organização popular na luta pela moradia digna. A revitalização de prédios públicos abandonados possibilita o acesso a todos os equipamentos públicos, como espaço com salubridade e segurança, saneamento básico e esgoto, posto de saúde, ruas com asfaltos, ônibus, creche, praças, pontos de cultura, escolas e universidades. Estamos lutando para que a Sepé seja uma delas, pois só a luta muda a nossa vida”, afirma.
Matéria publicada na edição nº 279 do Jornal A Verdade.