Moradores de bairros periféricos da cidade de Várzea Grande (MT) sofrem há anos com irregularidades no abastecimento de água e, muitas vezes, precisam recorrer ao serviço caríssimo de caminhões pipas para contornar a situação.
Rai Felix Lammel Lima | Cuiabá
Várzea Grande (VG), o segundo maior município de Mato Grosso, enfrenta, há mais de 25 anos, o problema de irregularidades no abastecimento de água durante longos períodos. As regiões mais afetadas, de acordo com o Departamento de Água e Esgoto da cidade (DAE-VG), são os bairros periféricos, como por exemplo: São Matheus, Eldorado, Colinas Verdejantes, São Simão, Serra Dourada, Paiáguas, Engordador, dentre outros.
Nesses locais, moradores relatam ficarem sem uma gota de água saindo das torneiras durante cerca de 18 dias. E quando ocorre o fornecimento, a água é suja, em pouca quantidade e acontece durante um período curto do dia.
Origem do problema
O problema crônico que assola os bairros periféricos tem uma origem: a falta de investimento público. Desde de 1997, quando o município, através do DAE-VG, passou a gerenciar o sistema de abastecimento de água, as estruturas sanitárias já estavam funcionando de forma debilitada, em razão do descaso do estado e do Governo Federal.
Vegê, apelido carinhoso dado pela população, é uma cidade que cresce rapidamente, de modo descompassado e incoerente, com planejamento precário, o que piora muito as condições básicas de serviços públicos à população.
De acordo com o estudo publicado em março de 2021 pelo Instituto Trata Brasil, VG está entre os 20 piores municípios em relação aos indicadores de saneamento básico, ocupando essas posições nos últimos 8 anos. O principal motivo do resultado se refere ao déficit de investimento feito pela cidade para universalizar os serviços. Em média as cidades deveriam investir um valor aproximado de R$ 113,30 (cento e treze reais e trinta centavos) por habitante, porém as piores posições na classificação investem anualmente (2015-2019) cerca de R$ 31,45, ou seja, 72% abaixo do patamar ideal.
Nesse contexto, os principais aparelhos e tubulações que fornecem o recurso para a população se encontram sucateados. Proporcionando inúmeras perdas hídricas por vazamentos ou erros de medição. Segundo o DAE-VG, cerca de 70,71% da água tratada é perdida antes de chegar as casas dos consumidores. Desse modo, toda essa condição ultrajante que a população várzea-grandense vive no dia a dia advém de um completo descaso das autoridades competentes.
Consequências para a vida dos moradores de Várzea Grande
Dessa forma, o serviço é insuficiente para atender as necessidades de uma família de trabalhadores, por exemplo. Assim, não é incomum que as pessoas precisem racionar água no uso do dia a dia, como no banho, na hora de escovar os dentes, ao lavar roupas, ao lavar os quintais, as calçadas e as varandas.
Para além do evidente transtorno no cotidiano, a situação torna-se um problema de saúde. Isso agrava a seriedade dessa precarização, visto que essa região mato-grossense sofre constantemente com ondas de calor, que ultrapassam os 41º graus, com longos períodos de estiagem, tendo até 110 dias sem chuvas.
Com as torneiras e caixas d’água vazias a população precisa recorrer ao serviço caríssimo de caminhões pipas, que são abastecidos pelo próprio DAE-VG. O preço varia na média de R$100,00 (cem reais) e consegue fornecer apenas dois mil litros de água, que, segundo relatos, para uma família de quatro pessoas dura cerca de 1 semana. E como se não fosse suficiente, está clara negligência do setor público: os moradores ainda ficam à mercê de altas tarifas mensais de água.
A reivindicação popular
Em VG, a revolta dos moradores é real. As pessoas não suportam mais a falta de água em um calor de 41ºC ou de terem que racionar o pouco de água suja que é fornecida. A população de VG não aguenta mais gastar uma fortuna com caminhões pipas ao passo que pagam injustamente altas faturas de água. Não toleram mais enfrentar esse problema crônico que assola a cidade há décadas por descaso da esfera Municipal, Estadual e Federal.
Por isso, passam a ocupar cada vez mais as ruas para reivindicar esse direito básico e universal. Neste sentido, ocorreram duas mobilizações populares que geraram uma ampla repercussão social na cidade: primeira efetuada em dezembro do ano passado, em que moradores do bairro Paiaguás realizaram um protesto bloqueando um trecho da Avenida Filinto Müller com barricadas e pneus incendiados. A segunda foi realizada no início de setembro deste ano, aonde ocuparam o plenário da Câmara Municipal de VG na mesma sessão em que o presidente do DAE, Carlos Alberto Simões de Arruda, participava.
Durante ambos protestos, os moradores levantaram cartazes com as frases: “Chega de brincadeira DAE, queremos água”, “Água não é luxo, é vida”, “Sem água não temos comunidade” e predominaram as palavras de ordem: “Queremos Água”.
Esses exemplos de atuação e pressão política devem ser considerados como prova da organização do povo trabalhador. Somente com uma atuação enfática nas ruas é que o problema crônico terá fim. Logo, é urgente a construção em cada canto de Várzea Grande de uma ampla “Marcha pela Água” para nós conquistemos o que é nosso por direito.