Trabalhadoras assumem controle de fábrica na Venezuela

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O jornal A Verdade conversou com as operárias venezuelanas Jane Abreu e Norix Parra, militantes do Movimento de Mulheres Ana Soto, que participaram da tomada da fábrica Thomas Greco, localizada no Estado de Lara, na Venezuela, em 2017. Atualmente, ambas estão no conselho da empresa, que é dirigida pelas trabalhadoras.

Renato Campos


Como se deu o processo em que as trabalhadoras da fábrica assumiram o controle da produção?

Jane Abreu A Thomas Greco é uma empresa transnacional, que produz documentos que necessitam de selos de segurança, como passaporte, códigos de segurança, licença para dirigir, diplomas universitários e bilhetes de loteria. É uma empresa originalmente de capital inglês, mas atualmente a maioria de seus acionistas são colombianos e está em 13 países, incluindo o Brasil. Os seus principais clientes são os governos dos países em que ela está sediada. Em 2017, a empresa fechou as portas e demitiu mais de 100 trabalhadores, deixando salários atrasados, dívidas trabalhistas, entre outros graves problemas. Os donos da empresa alegaram que não tinham condições de desenvolver o negócio e que não havia clientes para se manter na Venezuela. Para a tomada da empresa, tivemos um apoio decisivo da Federação Bolivariana Socialista dos Trabalhadores de Campo e Pesca, que era a entidade sindical que reivindicava nossos direitos frente aos patrões. O Ministério do Trabalho interveio e os trabalhadores organizados decidiram assumir o controle da fábrica e reativar a empresa. No entanto, em meio a sanções dos EUA, não tínhamos o timbre fiscal e havia dificuldade para conseguir matérias-primas.

Como funcionava a fábrica antes de vocês assumirem?

Norix Parra – Havia muita exploração, as jornadas de trabalho eram muito extensas, 12 horas por dia. Cheguei a trabalhar 24 horas sem descanso, pois o trabalhador que me renderia não chegou. A realização de movimentos repetitivos no ritmo das máquinas por muitas horas seguidas levou muitos companheiros a desenvolverem doenças ocupacionais, inclusive problemas graves nos ossos e pulsos das mãos. Dentre os 126 trabalhadores, 86 eram mulheres. 

Como vocês conseguiram superar os problemas para conseguir realizar a produção?

Jane Abreu – Quando assumimos a fábrica, nossa matéria-prima era o papel. Decidimos produzir cadernos escolares porque estavam muito caros devido ao bloqueio dos EUA. Foi um período muito complexo com as sanções, de um lado, e, a pandemia, de outro. Hoje, estamos fazendo feiras de materiais escolares para nosso povo.

Como está a situação das trabalhadoras da fábrica?

Norix Parra – Estamos trabalhando entre três a oito horas por dia. São, ao todo, 16 trabalhadores, 15 mulheres e um homem. Houve uma grande mudança porque a empresa não se importou em nenhum momento conosco quando anunciou o fechamento. Nesse processo, além dos problemas físicos, tivemos problemas psicológicos, muitas mães solo ficaram sem nenhum apoio. Agora, somos nós que decidimos, nos relacionamos muito bem com a organização Operária e Camponesa da Comuna em nosso território.

Jane Abreu – Um ponto importante é que enfrentamos mudanças tecnológicas e na forma de produzir. Temos que estar sempre atentas para superar as adversidades. 

Qual recado vocês deixam para os trabalhadores e trabalhadoras do Brasil?

Jane Abreu – Que as mulheres trabalhadoras do Brasil e do mundo devem lutar contra a exploração dos patrões. E devem fazer isso de forma organizada, pois vivemos uma luta de classes. Devemos defender o socialismo e assumir a produção. Só dessa maneira podemos, vamos superar nossos problemas, colocando a classe operária à frente desse processo.

Matéria publicada na edição nº 293 do Jornal A Verdade