A luta pelo fim da escala 6×1 e a redução da jornada do trabalho é central para as mulheres trabalhadoras de todo o Brasil, que se vêem exploradas pelo capital em seus empregos e no trabalho doméstico não-pago
Rede JAV SP
No último período, a mobilização pelo fim da escala 6×1 e a redução da jornada de trabalho ganhou fôlego no Brasil. Com essa força, a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que transformaria o fim dessa escala exaustiva em lei, protocolada pela deputada Erika Hilton (PSOL-SP), conseguiu as assinaturas necessárias para tramitar no Congresso Nacional. A PEC prevê também a redução da jornada de trabalho para 36 horas semanais, distribuídas na escala 4×3 (trabalham-se quatro dias, folgam-se três).
Trata-se de um passo significativo na história da luta de classes brasileira, tendo em vista que a última redução de jornada aconteceu em decorrência da implementação da Constituição Federal de 1988, fortemente influenciada pela luta operária que derrubou a ditadura. A pauta tem ganhado muita força de maneira orgânica no seio da classe trabalhadora, como demonstrou a luta dos trabalhadores da PepsiCo no estado de São Paulo.
Trabalhadoras lidam com escala 6×1 e trabalho doméstico
As mulheres trabalhadoras, sobretudo as mulheres pretas, estão entre as que mais sofrem com essa escala. Para além dos 6 dias que lhe são tomados de suas vidas todas as semanas e das 4 horas em média que se gasta de transporte entre casa e trabalho, as mulheres encaram dentro de casa sua segunda jornada: o trabalho doméstico.
Mas por que abordar o debate do fim da escala 6×1 a partir desse ponto de vista? A resposta é simples: uma pessoa, para poder se apresentar ao trabalho precisa, antes de mais nada, estar apta ao trabalho. Só é possível explorar o trabalhador continuamente se esse se apresentar ao seu posto nas condições mínimas de subsistência todos os dias. Em outras palavras, a venda da força de trabalho pressupõe a reprodução dessa mesma força de trabalho; a garantia e manutenção das condições materiais para que essa força de trabalho seja reproduzida.
Essa reprodução da força de trabalho, também chamada de “reprodução social do trabalho”, acontece através do trabalho doméstico. Lavar, passar, cozinhar, cuidar dos filhos e familiares idosos ou enfermos. Todas essas tarefas fazem parte da manutenção básica das condições de nossa existência e são, antes de qualquer coisa, trabalho não pago. Trabalho esse que, segundo dados da Oxfam, é em grande maioria (75%) colocado sobre as costas das mulheres. Em média, uma mulher dedica semanalmente 20 horas a mais que os homens às tarefas de manutenção do lar e da família.
Lutas se complementam
É verdade que a exploração da reprodução social do trabalho não acaba com o fim da escala 6×1 e a redução de jornada. Outras políticas como lavanderias comunitárias e restaurantes populares a preço acessível são necessárias para libertar a mulher do trabalho doméstico não pago. Um projeto de lei (PL 2762/2024) atualmente tramita na câmara para tratar de questões que tocam no assunto, visando criar uma Política Nacional de Cuidados. Embora tenha seus limites, trata-se de um grande passo no debate público sobre essa questão.
O que não se pode ignorar é o fato de que a carga global de trabalho sobre os ombros das trabalhadoras diminuirá consideravelmente caso seja aprovada a PEC do fim da escala 6×1, e esse tempo de vida arrancado de volta será dela novamente para que possa, dentre outras coisas, se organizar politicamente e avançar na conquista de mais direitos.
Na história do movimento operário, a força das mulheres trabalhadoras organizadas é facilmente perceptível. Basta lembrar que foi a mobilização de 90 mil operárias russas em 1917 em defesa melhores condições de vida e de trabalho que abriu a avenida histórica para que a classe trabalhadora – dirigida pelos bolcheviques com as palavras de ordem “Paz, Pão e Terra” – tomasse o poder e construísse o primeiro país socialista da história da humanidade, a Rússia Soviética, que assegurou à mulher seus direitos reprodutivos, socializou o trabalho doméstico e promoveu a igualdade entre os sexos.
A luta pelo fim da escala 6×1 é também uma luta pela liberdade das mulheres, e a luta das mulheres é a luta pela liberdade de toda a classe trabalhadora.