Em resposta ao congelamento de progressões e concursos e estrangulamento do orçamento, docentes e estudantes caminham para deflagração de greve geral da comunidade universitária. Oligarquias paraibanas reforçam sucateamento da educação
Nayara Cordeiro | Movimento Correnteza (PB)
EDUCAÇÃO – A Universidade Estadual da Paraíba (UEPB) vive um dos momentos mais cruciais de sua história. Desde 22 de setembro, professoras e professores estão em greve por tempo indeterminado, decisões tomadas em assembleia geral descentralizada da ADUEPB que atinge todos os campi. A paralisação é a resposta ao descumprimento sistemático da Lei de Autonomia (nº 7.643/2004), ao congelamento de progressões e concursos e ao estrangulamento deliberado do orçamento.
Ao mesmo tempo, o movimento estudantil também se levanta. Na última semana de setembro, assembleias em diversos campi aprovaram a deflagração de greve estudantil, formando um comando próprio para dialogar e agir junto ao sindicato dos docentes. O objetivo é claro: que a greve se encerre com conquistas para todas as categorias, garantindo assistência estudantil, restaurante universitário, moradia universitária e bolsas de permanência durante a paralisação, e que se construa um plano estadual de permanência estudantil com orçamento próprio.
O projeto de sucateamento das oligarquias paraibanas
Os motivos da greve não são novos. Há anos, as oligarquias paraibanas de situação e oposição tratam a UEPB como moeda de troca. O governador João Azevêdo (PSB) e o vice Lucas Ribeiro (PP) mantêm a universidade estrangulada com concursos travados, progressões congeladas e cortes nas bolsas. A dívida do retroativo das progressões já supera R$75 milhões. Há 393 docentes temporários para apenas 790 efetivos, segundo dados oficiais de 2024.
Na Assembleia Legislativa, presidida por Adriano Galdino (Republicanos), nem situação nem oposição cumprem seu papel de fiscalizar o Executivo. O orçamento enviado pelo governo é aprovado sem resistência. As oligarquias de oposição aparecem esporadicamente para usar a pauta da UEPB como palanque.
Lei da Autonomia e números da crise
Criada em 2004, a Lei da Autonomia deveria garantir 3% da Receita à UEPB. O artigo 3º determina que os recursos destinados à universidade constem obrigatoriamente de rubrica própria no orçamento do Estado, calculados anualmente com base na receita ordinária prevista para cada exercício financeiro.
Em 2025, conforme a Lei Orçamentária Anual do Estado da Paraíba, a receita total foi de R$21.365.510.629,00. Aplicando-se o percentual mínimo de 3% previsto na lei, o repasse para a UEPB deveria ser de R$640.965.318,87. No entanto, de acordo com dados da própria universidade, o valor efetivamente repassado foi de apenas R$455.073.874,00, uma diferença de R$185.891.444,87 a menos para a UEPB.
Esse cenário se repete ano após ano: em 2023 faltaram mais de R$152 milhões; em 2024, mais de R$171 milhões. O governo do Estado não cumpre a Lei da Autonomia, e a Assembleia Legislativa aprova orçamentos inferiores ao que a universidade realmente necessita, mantendo a UEPB refém dos caprichos políticos.
O movimento estudantil entra em cena
Semanas antes da deflagração da greve docente, o Movimento Correnteza já mobilizava os campi da UEPB sobre a crise orçamentária. Foram passagens em sala, panfletagens, convocações para audiências públicas e participação em paralisações, em diálogo direto com a ADUEPB, para tentar evitar que a situação chegasse ao ponto da greve. Esse esforço do sindicato, voltado a abrir canais de negociação entre a UEPB, o governo e a Assembleia Legislativa, foi ignorado pelo governo estadual.
Diante disso, com a deflagração da greve dos professores, o movimento estudantil compreendeu que precisava cumprir seu papel histórico: unir-se aos trabalhadores da educação. O indicativo de greve estudantil aprovado na Assembleia Unificada realizada no dia 29 de setembro, com participação de estudantes de todos os campi da UEPB e convocada pelos Movimentos Estudantis, marcou o ápice dessa mobilização, unificando estudantes e docentes no mesmo lado da trincheira. Desde então, estudantes têm participado de panfletagens, diálogo com a população, sessões itinerantes da Assembleia Legislativa e demais atividades convocadas pelo comando de greve docente e estudantil.
Dentre as pautas apresentadas pela comissão de greve estudantil estão a garantia do funcionamento do RU e moradia universitária durante a greve, manter bolsas acadêmicas e de permanência durante a greve, construção de um Plano Estadual de Permanência Estudantil e o cumprimento da Lei de Autonomia.
Panorama nacional: o ataque é geral
A crise da UEPB é parte de um quadro mais amplo. Em Minas Gerais, o governador Romeu Zema (Novo) ameaça transferir a UEMG para a União, abrindo caminho para privatizações. No Rio de Janeiro, a UERJ enfrenta atrasos salariais e cortes de bolsas. Na Bahia, a UNEB sofre restrições orçamentárias e atrasos de repasses, deixando professores sem reajuste e estudantes sem assistência básica.
As universidades estaduais brasileiras vivem uma crise orçamentária que não é fruto do acaso, mas resultado direto da política de cortes, sucateamento e privatização do ensino superior. A UEPB, patrimônio do povo paraibano, não escapa dessa realidade: falta verba para a manutenção da estrutura, laboratórios e assistência estudantil, enquanto professores e técnicos têm seus direitos trabalhistas atacados e estudantes convivem diariamente com a precarização e a falta de dignidade para estudar.
O governo da Paraíba, assim como tantos outros pelo país, trata a educação pública como gasto supérfluo, e não como investimento estratégico para o desenvolvimento da sociedade. Esse descaso aprofunda a desigualdade: a juventude trabalhadora, que depende da universidade pública, vê seu futuro ameaçado por cortes e pela lógica mercadológica que tenta transformar a educação em mercadoria.
“O governo e as oligarquias paraibanas querem que a UEPB sobreviva apenas como cabide eleitoral. Nossa luta é para garantir que a universidade continue sendo um espaço do povo, da juventude e da classe trabalhadora. Para que os estudantes possam estudar com dignidade, com comida na barriga e um teto para dormir – o que hoje não é uma realidade em todos os campi, já que faltam RU e moradia universitária”, afirma Sheyla Silva, estudante de Sociologia da UEPB.
A UEPB vale a luta!
Os estudantes da UEPB não são massa de manobra nem desinformados. O movimento estudantil é organizado, combativo e de luta. Ele continuará firme na luta pela recomposição do orçamento e pela assistência estudantil.
A UEPB vale a luta, mas essa luta tem que ser organizada. Não basta reclamar ou esperar que soluções venham de cima. Para que a greve se encerre com vitória, é necessário fortalecer os centros e diretórios acadêmicos, ajudar a reconstruir um DCE combativo e se somar às mobilizações nacionais e locais pela defesa da universidade pública, gratuita e de qualidade.
A luta pela UEPB não é apenas por orçamento. É pela dignidade de estudar, por comida no prato, teto para dormir e futuro para a juventude paraibana. É hora de unificar forças, fortalecer a comissão de greve estudantil e dizer em alto e bom som: a UEPB vale a luta!