Um dos maiores artistas da música brasileira, Jackson do Pandeiro tornou-se patrimônio imaterial da Paraíba, estado natal do artista, um reconhecimento que serve para reafirmar a cultura popular e levantar o debate em torno de como esse sistema trata seus artistas e suas obras.
Redação Paraíba
CULTURA- José Gomes Filho, filho do coco e do batuque, inventou uma forma de tocar o Nordeste que virou clássico da música popular brasileira. Nascido em Alagoa Grande, Paraíba, em 31 de agosto de 1919, filho de Flora Mourão, cantadora de coco e de um oleiro, José Gomes. Teve uma infância muito pobre e nunca frequentou uma escola. Já em Campina Grande trabalhou como engraxate e auxiliar de padeiro para sustentar a família após a morte do pai.
Seu ritmo, sua percussão e sua voz nasceram da periferia, trabalhada nas feiras e nas festas. As músicas de Jackson mostram a cultura do povo, suas tradições, seu cotidiano, além de retratarem seus sentimentos e suas origens. Por isso que valorizar Jackson é também valorizar a raiz afro-brasileira que sustenta o forró, o coco e tantos modos de viver nordestinos.
A verdade é que a arte popular sempre foi uma das formas mais poderosas de resistência do povo trabalhador. Jackson mostrou isso quando cantou “Chiclete com banana”, ironizando a influência americana na música brasileira, e quando exaltou o cotidiano do Nordeste em “Forró em Campina”.
“Eu só boto bebop no meu samba quando Tio Sam tocar um tamborim
Quando ele pegar no pandeiro e no zabumba
Quando ele aprender que o samba não é rumba.”
Reconhecimento tardio
A Paraíba deu um passo importante ao reconhecer a obra de Jackson do Pandeiro como Patrimônio Cultural Imaterial do Estado. O reconhecimento veio próximo ao dia da Consciência Negra, data que marca a morte do herói Zumbi dos Palmares e a luta contra a escravidão e o racismo.
Porém o que o Estado chama hoje de “tesouro cultural” é o mesmo que por décadas foi ignorado, desvalorizado e até ridicularizado pela indústria e pela elite. E agora? Esse reconhecimento simbólico vai virar compromisso real com sua memória e com os artistas que fazem cultura popular?
Um povo que cria, um sistema que apaga
A história da música brasileira tem muitos casos parecidos, mas sem a devida atenção. O cantor e compositor Cassiano é um caso emblemático: Também paraibano, foi um dos maiores nomes da Black Music nacional. Mesmo assim, morreu em 2021 sem o reconhecimento que merecia, esquecido pela mídia e abandonado pela indústria. Cassiano, Jackson, Cartola, Clementina de Jesus, todos sofreram em algum nível com o mesmo sistema que lucra com a cultura negra, mas não devolve o que deve a seus artistas.
No capitalismo, o talento só é valorizado quando dá lucro e não escancara a pobreza e a fome do nosso povo. A arte, nesse modelo, é tratada como produto e não como expressão de vida e identidade. Por isso que nossa crítica precisa ser direta e clara: arte não é luxo, é direito. Enquanto o povo cria, a elite lucra. Enquanto o batuque e o pandeiro ecoam nas ruas, a concentração de renda cala vozes, fecha espaços e destrói sonhos de jovens paraibanos. A liberdade da arte popular depende da libertação do próprio povo trabalhador. Os artistas comprometidos com a cultura popular continuam fazendo sua arte, tendo em Jackson do Pandeiro uma referência de resistência. Tornar sua obra patrimônio imaterial é prova disso. Prova de que não deixaremos a memória dos nossos ser esquecidas.
Viva Jackson do Pandeiro! Viva a cultura popular que resiste!