Digam que sou uma comunista

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Tradução do artigo Call me a communist, de Rossana Cambron, vice-presidente do Partido Comunista dos Estados Unidos, publicado pelo People´s World em 08.07.2019. Tradutor: Odon.


Como ativista, logo no início de meus vinte anos de idade, eu não sabia muita coisa sobre o que era realmente o comunismo; tudo que ouvia era que os comunistas eram pessoas más, que faziam mal a você e a seus entes queridos. Atuando no movimento estudantil de Chicago, conheci um membro do MEChA (Movimento Estudantil Chicano de Aztlan) que me falou que o Partido Comunista dos Estados Unidos estava promovendo um curso de Marxismo e perguntou-me se eu tinha interesse em frequentá-lo.

No primeiro dia, o professor explicou por que havia pessoas ricas e pessoas pobres. Esclareceu que existiam pobres porque os donos de empresas fabris, negócios e recursos naturais (os “meios de produção”, como entendi naquela tarde), exploravam os que alugavam sua capacidade de trabalho, pagando-lhes salários baixos ao mesmo tempo em que acumulavam, consequentemente, montões de dinheiro ao venderem as mercadorias produzidas pelos trabalhadores. Como exemplo claro e simples, explicou empregar 50 centavos de dólar para fazer um par de sapatos, e vender logo após o mesmo par de sapatos por dois, três ou mais vezes o valor inicial. Esse novo valor representava a origem do lucro. “Isto faz sentido”, pensei imediatamente.

No segundo dia de aula, o professor explicou como as sociedades se modificaram no decorrer do tempo. Na sociedade humana primitiva, o comunismo primitivo, todos partilhavam o disponível, mas havia muito pouco para repartir. Ao enfrentarem a escassez, as pessoas eram forçadas a aprender como domesticar animais, a prendê-los nas proximidades a fim de conseguirem alimentos. Nesse período, alguns indivíduos tornavam-se necessários para ajudar a manter os rebanhos, lavrar a terra e assim surgiu a escravidão.

Dessa forma, as pessoas começaram a ser separadas por classes. Alguns passaram a controlar os excedentes produzidos, enquanto outros executavam o trabalho para produzi-los. O conflito surgiu por causa das horríveis condições de trabalho suportadas pelos escravos, todavia, crescia a tal ponto que estes passaram a exigir mudanças. E, assim, surgiu a sociedade feudal. Os escravos adquiriram um pouco de liberdade.

Sob o sistema feudal, os proprietários fundiários encarregavam outros, os servos no amanho da terra que possuíam, a fim de aumentarem a produção de alimentos. Em regra, os proprietários exigiam mais do que os servos eram capazes de produzir para a própria sobrevivência. Estes, por sua vez, começaram a impor mudanças, enquanto nos centros urbanos nova classe surgia, e esta já não extraia sua riqueza da terra e sim da produção e venda de mercadorias.

Este grupo de mercadores e manufatureiros era o que conhecemos como a classe capitalista. Diante dos senhores feudais e do conflito entre estes e a classe capitalista, um novo sistema – o capitalismo – gerou-se. E a gente que saia da lavra da terra para trabalhar nas fábricas e demais indústrias formava a classe operária hoje conhecida. Da maneira como a história parecia desenvolver-se diante de nós, eu sentia como se fossem peças de um quebra-cabeça flutuando em minha cachola e logo após juntando-se logicamente.

Há uma ciência que pode explicar as razões que conduzem a essas mudanças, como eram fundamentadas, como se baseavam na desigualdade entre os indivíduos e firmadas nas posições que mantinham na economia – fincadas na classe a que pertenciam. Isto lançava luz sobre a exploração de uma classe por outra, e também mostrava que quando uma classe explorada realiza seus interesses e age em conjunto, ela pode abolir a classe dominante. Se outros grupo explorados podiam agir assim então os trabalhadores podiam agir da mesma forma. “Pensei, busca-se uma explicação científica”. Logo cheguei à expectativa coerente de que uma sociedade melhor é possível e também conclui que se necessita de uma organização para efetuar as mudanças.

O que aprendi naqueles primeiros dias é que podemos construir uma sociedade melhor, uma sociedade em que não existam pobres. E que partilhemos nossos talentos em benefício de todos. Também aprendi que os detentores do poder deste não se desfazem facilmente; que farão tudo farão para que você acredite que não pode mudar as coisas, e sinta-se impotente ao mesmo tempo dizendo-lhe mentiras. Nessas mentias incluem coisas que a mim e a muitos outros são ditas sobre o comunismo.

Na década de 1950, os comunistas eram de tal forma demonizados que chegava ao ponto de afugentar as pessoas, e as famílias temiam falar abertamente de assuntos importantes de suas vidas. Mas como isso acontecia? É por que a abolição do capitalismo, do colonialismo, do imperialism1o, segundo as ideias de Marx, de Engels e de Lenine atraem muita gente em inúmeras partes do mundo. Os povos buscam solução para seus problemas e isto tornava os capitalistas temerosos de perderem seu poder. Assim eles, os capitalistas, não podiam tergiversar e levar as pessoas a pensarem que as ideias socialistas e comunistas não lhes favoreciam.

São coisas que os porta-vozes governamentais ainda fazem hoje em dia. O senador Lindsay está chamando o agrupamento de mulheres progressistas de “A Turba”. Segundo sua classificação, os representantes Ocasio Cortez, Ilham Omar, Ayanna Pressley e Rashida Tlaib são comunistas, na tentativa de empregar a mesma tática dos anos 1950. Os que ocupam o poder fazem qualquer coisa que julguem possível com o objetivo de manter seus bilhões e explorar os trabalhadores mantendo-os  divididos, atemorizados e culpando uns aos outros pelas desigualdades sociais. Seja isso anticomunismo, racismo, sexismo, homofobia ou ódio aos imigrantes – a finalidade é a mesma.

Os membros progressistas do Congresso falam claramente e apontam as injustiças a fim de que não sejamos vítimas de mais uma lavagem cerebral. Agora, vivemos uma oportunidade em que podemos facilmente entender o que é e o que não é o comunismo. Estou atenta às palavras do arcebispo brasileiro Dom Helder Câmara, que afirmou “Quando dou pão aos pobres chamam-me de santo. Quando pergunto pelas causas da pobreza, me chamam de comunista”.