São incessantes e numerosos os casos de corrupção no nosso país. Não param as denúncias contra funcionários públicos, parlamentares, secretários e ministros do poder Executivo. Aliás, pelo menos nove ministros sofreram pesadas queixas de crimes do colarinho branco, e seis deles já foram afastados pela presidenta Dilma Roussef, numa clara demonstração de que a corrupção é um câncer no Estado brasileiro. Porém, é preciso se perguntar porque entra governo e sai governo, ano após ano, o dinheiro dos impostos do povo brasileiro é surrupiado por esses criminosos de paletó e gravata. Para responder a essa pergunta, é necessário sabermos o que é e como funciona essa estrutura política chamada Estado.
O Estado é o destacamento de homens fortemente armados, supostamente criado para defender a pátria, com acréscimo de um grupo regular de funcionários públicos, aparentemente acima de todos na sociedade. Esta primeira característica é o principal traço do Estado, pois ele existe desde que surgiram as classes sociais e é um instrumento de repressão de uma classe por outra, a qual domina o poder econômico. Em outras palavras, somente existe ‘Estado’ porque uma minoria necessita dominar a maioria e o utiliza para manter seu poder sem que ninguém sequer questione o porquê. É preciso notar que esse poder é exercido no Brasil pelas Forças Armadas (Exército, Marinha e Aeronáutica), que aparentam a ‘mais pura’ de todas as estruturas, o que já foi diferente, pois sofremos o controle desses militares durante mais de duas décadas envoltos em inúmeros casos de roubo do dinheiro público.
Toda essa estrutura aperfeiçoada durante séculos apresenta-se como inquestionável e inquebrantável. Mas, uma das provas mais seguras da sua fragilidade é a corrupção. Desde que surgiu o Estado com o fim da sociedade primitiva de clãs¹, existe a corrupção. Mais do que isso. Ele surgiu a partir de uma tremenda injustiça: garantir a proteção legal, por meio das armas, das propriedades de um reduzido grupo de pessoas que se apossaram dos bens produzidos socialmente.
Como resultado desse desenvolvimento que remonta a milhares de anos, na nossa época atual, portanto, a corrupção do Estado é resultado do domínio político dos capitalistas. Desde juízes, promotores, deputados, vereadores, prefeitos, governadores, ministros, enfim, todos estão envolvidos pelo câncer da corrupção. Muito embora alguns ocupem cargos de forma honesta, trata-se de toda estrutura que é podre e não pode ser modificada nos marcos do atual regime econômico. Exatamente por isso, mudam-se os nomes, mas o papel que cumprem os substitutos é o mesmo. Por mais investigação que se faça, a Polícia Federal não haverá de modificar tal realidade nos marcos da sociedade capitalista.
A forma do roubo dos nossos impostos
Vejamos agora como funciona esse assalto aos nossos bolsos.
O poder Executivo, os governos, recolhem os nossos impostos com a justificativa de nos dar condições adequadas de saúde, educação, lazer, infraestrutura, etc. Utilizam, para isso, a coação dos cidadãos. Quem não pagar os impostos perde direitos sociais. Veja que essa medida somente pode ser imposta aos trabalhadores, pois, os capitalistas não recolhem impostos, eles os embutem nos preços das mercadorias que nos vendem. Logo, desde o pagamento dos tributos somos lesados pelos dominadores.
Ao recolher todos esses impostos o governo administra tais recursos por meio de um plano chamado Orçamento. É com ele que os diversos funcionários públicos podem gastar os recursos. Porém, existe uma particularidade interessante: o governo não pode contratar diretamente os serviços ou obras criando empresas próprias para execução em virtude do seu caráter liberal². Ele seleciona tais empresas mediante editais públicos chamados de licitações. Ora, trata-se de uma concorrência pública para executar os serviços ou obras que, na prática, se tornam peças de um jogo de interesses das empresas capitalistas. Em virtude dos subornos, os processos são fraudados e se caracteriza a forma de transferência de recursos do nosso dinheiro para os bolsos dos grandes empresários. Por outro lado, sem consultar nenhum cidadão, o governo paga desse mesmo orçamento uma soma estratosférica de recursos de juros de dívidas a bancos e especuladores, e, exatamente por isso, sempre afirma que não dispõe de dinheiro para os serviços sociais. Esses bancos (seus donos, os banqueiros) repassam aos ‘parlamentares’ somas enormes de dinheiro para que sejam mantidos os pagamentos. No popular, “uma mão lava a outra”. Caso não aceitemos tais imposições, somos encarcerados. Se nos manifestamos, denunciamos, questionamos esse poder dos capitalistas, está lá o poder ‘policial’ para impedir qualquer mudança significativa.
Além dessas, para realizar as demais transferências dos nossos recursos para as empresas ‘seguras’, dentro dos esquemas de benefícios de uns e outros, são realizados outras diversas formas de subornos, esquemas ilegais e desvios. São bizarras e escrachantes as formas que os capitalistas utilizam para realizar esse roubo – desde os parlamentares junto com capitalistas criarem grandes empresas nos nomes de seus parentes até mesmo construções de obras públicas dentro de terras privadas.
As famílias Sarney, Magalhães, Collor, Jereissati, Serra, Calheiros, por exempo, possuem dezenas de empreendimentos vultosos. Até mesmo o filho de Luís Inácio (PT), conhecido como Lulinha, criou uma empresa de tecnologia, disputou licitações, milagrosamente ganhou-as e já se tornou milionário em poucos anos. Por outro lado, tais empresas financiam campanhas dos parlamentares e governantes, nomeiam parentes, desviam funcionários públicos das suas funções, criam cargos fantasmas, subornam juízes e promotores, etc. Teríamos que escrever centenas de páginas para citar todas as formas de corrupção, mas este não é o objetivo do presente artigo.
Outro ponto importante a ser lembrado: muitos historiadores interligam a nossa corrupção ao modelo de colonização portuguesa. Até chegam a compará-la às decisões da Corte Portuguesa de enviar para cá ‘degredados’³ para diversas regiões do país. Trata-se, pois, de mascarar a raiz do problema. Embora tal colonização e suas características tenham certa influência na forma, nem de longe expressam o conteúdo dessa questão. Basta ver os casos de corrupção em todos os países imperialistas e nas suas semicolônias. Costa do Marfim, por exemplo, foi colonizada pela ‘civilizada’ França e é considerada um dos países com piores índices de corrupção; ou o Paraguai, colonizado pelos espanhóis, que está em 140º lugar entre os 145 países em casos de desvio de recursos públicos.
Assim, o que fica demonstrado é que a corrupção em qualquer país capitalista está ligada fundamentalmente a quem detém o poder econômico. Em último caso, tais ‘funcionários públicos’ são corrompidos exatamente por essas empresas. Os servidores públicos, unindo-se a elas, tornam-se também capitalistas e sucede-se assim a ‘cadeia produtiva’ dos roubos que não param de acontecer.
Para solucionar tudo isso, seria necessário destruir toda a estrutura podre do Estado. Seriam obrigatórios: um total controle popular dos recursos dos trabalhadores, o fim da imunidade e inamovibilidade desses funcionários públicos, especialmente parlamentares e governantes; fim dos recursos de capitalistas nas campanhas eleitorais; proibição de todos os políticos com família ligada as empresários, juízes democraticamente eleitos e com mandatos revogáveis. Tais medidas mudariam esse quadro desolador do nosso país; mas antes delas serem implementadas, teremos de enfrentar uma intensa luta contra esses mesmos ‘ladrões’ de colarinho branco, sejam funcionários das empresas capitalistas sejam os infiltrados no serviço público.
Notas:
¹Comunidade de clã: forma social de uma coletividade igualitária unida pelos interesses econômicos e espi¬rituais, a mesma origem e os mesmos laços de parentesco. Nascida sob o regime do casamento por grupos, era matriarcal, ou seja, baseada nos laços de parentesco pelo lado materno.
²Cárater Liberal do Estado: forma de organização estatal com intervenção na economia reduzida em virtude da expressão idealista do conceito de ‘autorregulação do mercado’. Tal caráter se evapora nos momentos de crise econômica quando todas as estruturas estatais são mobilizadas para salvar o sistema capitalista de produção;
³Degregados: termo para designar cidadãos portugueses que eram punidos com seu traslado para a colônia em virtude de crimes tais como – Matar a mulher – 4 anos de degredo no Brasil; Roubar uma carteira – 2 anos de degredo; Xingar algum administrador público português – 5 anos.
Serley Leal, Fortaleza
Um
texto interessante mas com algumas falhas. O modelo de Estado já nasce
antes do capitalismo como o conhecemos. O Estado já é discutido em
regimes monárquicos e contratação de serviços e rede de “funcionários
públicos” já existe muito antes da ascenção do modelo capitalista ou
republicano.Concordo
que a concentração de poder gera a corrupção mas afirmar que é algo
“inerentemente” capitalista ou neoliberal sem olhar a corrupção de
cortes, de regimes totalitários comunistas e outras formas é falha.Outros
países do mundo que são capitalistas e neoliberais não tem o nível
absurdo de corrupção que temos por outros fatores. E arrisco dizer que a
cultura do povo espelhada na boa vontade dos chefes da Nação é a
principal fonte de maior igualdade social.