Em festival realizado no centenário da histórica líder camponesa Elizabeth Teixeira, um representante da Comissão Pastoral da Terra denunciou: “É preciso mostrar com orçamento, com política, que vai se realizar o sonho de João Pedro Teixeira. O Governo Federal está apaixonado pelo agronegócio. É preciso continuar a marcha contra o latifúndio”.
Redação PB
Nos dias 13, 14 e 15 de fevereiro, aconteceu na cidade de Sapé (PB) mais uma edição do Festival Cultural da Memória Camponesa, desta vez, no centenário da grande militante pela reforma agrária, Elizabeth Teixeira. O evento reuniu representações nacionais, estaduais e municipais e delegações de outros estados, que vieram prestigiar a luta das Ligas Camponesas na Paraíba.
O evento teve o seu início com a inauguração da exposição “100 faces de uma Mulher Marcada para Viver”, realizada na sede do Memorial das Ligas e Lutas Camponesas, antigo lar do João Pedro e Elizabeth Teixeira, no povoado de Barra de Antas, na Zona Rural de Sapé, honrando a memória e a luta com diversos registros fotográficos, audiovisuais e escritos que mostram um pedaço da história das lutas na região. O dia se encerrou com o “Parabéns para Elizabeth”, celebrando seu centenário de vida ao lado de sua família.
No segundo dia, houve o lançamento de obras que homenageiam a trajetória da luta camponesa e a preservação da memória, como os livros “Eu marcharei na sua luta” e “Memória Camponesa”, além do acervo digital do Memorial das Ligas e Lutas Camponesas (MLLC). Fundado em 2006, e considerado como museu e ponto de cultura, é um espaço que ajuda a preservar a memória e história de lutas travadas naquela região. “Neste momento, ocupar o latifúndio do saber, apresentando essas belíssimas produções que materializam nossa memória, tendo possibilidade de chegar a tantas outras pessoas, é muito importante”, afirmou Alane Silva, presidenta do Memorial.
À tarde, em frente à Praça da Comunidade Tradicional da Barra de Antas, sindicatos, estudantes, movimentos sociais e partidos se reuniram para participar da “Marcha da Memória Camponesa”. Bandeiras das ligas camponesas e chapéus de palha tomaram conta das ruas para homenagear e celebrar a importante conquista de desapropriação do latifúndio da região, após 28 anos de muita cobrança e luta. O latifúndio dará nome ao assentamento Elizabeth Teixeira. A marcha se encerrou em um expressivo ato cultural, homenageando a história e os símbolos presentes na caminhada.
O terceiro e último dia aconteceu na Praça de Eventos de Sapé, com uma feira de agricultura familiar camponesa reunindo mais de 10 mil pessoas. João Pedro Stédile, dirigente nacional do MST, relembrou os anos de repressão durante a ditadura militar fascista em nosso país: “Segundo relatos da Comissão da Anistia, foram mais de 700 camponeses assassinados entre 1964 e 1968 no Nordeste. Alguns, os donos de usinas até passaram o trator por cima. Essa memória é condenada ao esquecimento, uma vez que era proibido falar em Ligas Camponesas”.
O ato político, à tarde, foi um momento de grande agitação em torno da pauta da reforma agrária. Carlos Lima, dirigente da Comissão Pastoral da Terra (CPT), denunciou: “É preciso mostrar com orçamento, com política, que vai realizar o sonho de João Pedro Teixeira. O Governo Federal está apaixonado pelo agronegócio. É preciso continuar a marcha contra o latifúndio”.
História de resistência
João Pedro Teixeira foi assassinado a tiros de fuzil em 02 abril de 1962, à beira da estrada, próximo a Sapé, quando voltava para casa, regressando de João Pessoa, levando cadernos e livros para seus filhos. O crime foi encomendado por um grupo de latifundiários locais. Em 1964, o cineasta Eduardo Coutinho iniciou as filmagens do documentário “Cabra Marcado para Morrer”, que contaria a história de João Pedro, no entanto, as filmagens foram interrompidas pelo golpe militar. O documentário somente foi finalizado e lançado em 1984. Hoje, seu nome está gravado no Livro dos Heróis da Pátria.
Elizabeth, então, reforça sua atuação nas Ligas Camponesas e tem que cuidar sozinha dos 11 filhos do casal. Com o Golpe de 1964, teve sua casa incendiada e foi presa diversas vezes, até entrar para a clandestinidade. Este período durou 18 anos, vivendo no interior do Rio Grande do Norte com outro nome e com apenas um de seus filhos, pois foi obrigada a deixar os demais para que outras famílias cuidassem. Atualmente, reside na capital paraibana, João Pessoa.
Matéria publicada na edição impressa nº 308 do jornal A Verdade