Os Estados Unidos anunciaram a taxação de 50% sobre produtos brasileiros exportados ao país. Além de pressionar o governo Lula a conceder anistia a aliados políticos no Brasil, Trump ameaçou processar um ministro do Supremo Tribunal Federal em cortes norte-americanas.
Wanderson Pinheiro | São Paulo (SP)
INTERNACIONAL – A taxação em 50% dos produtos brasileiros exportados aos EUA – muito além de uma retaliação à aliança do Brasil com a China e ao bloco de países Brics – é uma grande intromissão estrangeira nos assuntos internos do Brasil e representa um ataque a nossa soberania. Com essa medida, o presidente estadunidense Donald Trump quer ditar as relações internacionais do Brasil e ainda justificou suas ações declarando apoio escancarado à tentativa de golpe militar fascista de 08 de janeiro de 2023.
Trump cobra anistia para seus pau-mandados no Brasil (Bolsonaro e militares golpistas) e ameaça levar a julgamento nas cortes de seu país um ministro do Supremo Tribunal Federal do Brasil.
O imperialismo estadunidense pretende, com tudo isso, desestabilizar a economia brasileira, abrindo espaço para o avanço da extrema-direita, inclusive, para novas tentativas de golpe.
Os EUA querem estabelecer uma dominação política e demonstrar que o nosso país deve se comportar como sua área de influência de maneira servil. Para isso, precisa impor no governo brasileiro elementos da extrema-direita corrompida para cumprir o papel de capachos.
O fascista Trump apresentou também uma ameaça de investigar práticas comerciais do Brasil. Um grande grupo de lobby financiado pelas Big Techs Google, Meta, Microsoft, Amazon, Uber, Apple, Pinterest e E-Bay produziu um relatório e o entregou ao governo norte-americano pedindo retaliações ao Brasil por algumas decisões recentes do STF. É citada a suspensão do “X” (rede digital de Elon Musk, homem mais rico do mundo) por não manter representante no Brasil.
O STF decidiu ainda, no último dia 26 de junho, que as plataformas que operam as redes digitais devem ser responsabilizadas diretamente pelas postagens ilegais feitas por seus usuários. Todos os magnatas desses monopólios digitais apoiam irrestritamente o governo de Donald Trump.
Os EUA são o segundo maior parceiro comercial do Brasil, atrás apenas da China. Em 2024, o Brasil vendeu cerca de US$ 80 bilhões em mercadorias aos EUA e importou US$ 250 bilhões. Nos últimos 15 anos, as empresas estadunidenses tiveram um saldo positivo de mais de US$ 400 bilhões em relação às empresas brasileiras. Combustíveis, aço, café, soja, minério de ferro, açúcar, carne bovina café, suco de laranja e aeronaves estão entre os principais itens exportados pelo Brasil, representando 15% do total das exportações brasileiras.
Disse o presidente Lula: “Eu pretendo reunir todos os empresários que têm exportação para os Estados Unidos, sobretudo aqueles que têm maior volume de exportações. Conversar, ver qual é a situação deles, tentar todo o processo de negociação que for possível”. Ora, quem dera se a mesma agilidade e atenção fosse dada aos trabalhadores quando tentam apresentar alguma reivindicação ao Governo, tais como recomposição salarial dos servidores públicos federais, aumento do salário mínimo, redução da jornada de trabalho e fim da escala 6×1.
E essa ameaça de Trump se torna ainda mais grave justamente porque o Governo Federal tem uma política econômica incapaz de atender aos interesses do povo brasileiro. Reduz o orçamento da saúde e da educação, segue pagando R$ 2 trilhões com juros e amortizações da dívida pública e gastando R$ 800 bilhões com isenção fiscal ao agronegócio. Essa política não garante um salário mínimo digno à imensa maioria da classe trabalhadora, nem moradia para milhões de famílias.
O Governo Lula pretende sustentar essa política aumentando a alíquota do Imposto sobre Operações Financeiras (IOF) e fazendo discursos pela taxação de grandes milionários. Porém, tais medidas são completamente insuficientes para manter o pagamento de juros aos banqueiros, sem sacrificar o orçamento do setor público.
Imperialismo no mundo
A ação do fascista Donald Trump contra o Brasil não pode estar dissociada do avanço das guerras no Oriente Médio, da guerra na Ucrânia e dos demais conflitos no mundo. O imperialismo estadunidense não quer perder mais espaço para a China do que já perdeu e, para isso, utiliza as relações comerciais e taxações como armas de guerra.
Inúmeros fatos demonstram que Trump desenvolve uma economia voltada para a guerra e se prepara para um confronto militar decisivo contra a China e a Rússia, buscando, inclusive acelerar esse caminho, que é o caminho para uma 3ª Guerra Mundial. Vejamos:
Os ataques indiscriminados dos neonazistas de Israel, que promovem um verdadeiro genocídio ao povo palestino, são claramente orquestrados e financiados pelos EUA, que pretendem expulsar o povo palestino de Gaza e da Cisjordânia com o objetivo de obter os recursos naturais do território e ocupar uma região estratégica para a guerra. Israel é a ponta-de-lança dos EUA no Oriente Médio.
Outro fato concreto é a exigência dos EUA aos países da Otan para ampliarem seu orçamento militar para 5% do PIB. É uma exigência que vai para além dos investimentos financeiros que atenderão aos interesses dos lucros da indústria bélica norte-americana, mas que também significa uma efetiva preparação desta aliança militar para uma possível guerra mundial.
No outro campo, estão os imperialismos chinês e russo, que buscam acumular forças. A Rússia deu início à ampliação de suas fronteiras, ocupando a Ucrânia. Mas se, de um lado, isso representa uma saída do cerco promovido pela Otan no Leste Europeu, representou, concretamente, o início de uma nova redivisão do mundo. Divisão esta que China e Rússia só podem alterar na proporção de seus capitais e demonstrando a nova correlação de forças na prática.
A Rússia anunciou a implantação da sua indústria bélica na Venezuela, sendo parte importante na corrida armamentista, financiando e lucrando com a produção de armas na região. A Rússia ainda atua para atrair imigrantes pobres indianos para serem utilizados como mão de obra barata e bucha de canhão na guerra com a Ucrânia.
A China lidera o bloco de países Brics, acelerando a criação de uma nova moeda para circular no interior do bloco, ameaçando, assim, o poder internacional do dólar. A China tem ainda fortalecido a Organização para Cooperação de Xangai (OCX), um bloco de países criado em 2001 no Oriente para expandir sua influência econômica e militar na região.
Esse grupo de países inclui Paquistão, Irã, Índia, Rússia e várias ex-repúblicas soviéticas, ricos em petróleo e gás natural, e contam com suporte de capitais chineses. A China tem ainda o Irã como seu aliado estratégico no Oriente Médio, que recebe financiamento para desenvolvimento energético de US$ 400 bilhões, em um acordo que durará 25 anos. Todas essas alianças têm adquirido cada vez mais conotações estratégicas e militares.
Soberania nacional
O Brasil está no meio dessa luta entre potências capitalistas e deve tomar uma posição clara, qual seja, romper com qualquer dependência dos países imperialistas, em vez de “diversificar” sua dependência a mais de uma potência mundial. Para isso, é necessário o rompimento com os interesses da grande burguesia, como banqueiros e o agronegócio, que são setores que se acomodam com o desenvolvimento associado ao imperialismo.
Também não podemos, num cenário de guerra, aceitar ser parte de um bloco de nações capitalistas em detrimento dos verdadeiros interesses da classe trabalhadora que luta pelo direito de usufruir os frutos do seu próprio trabalho.
Lutar pela soberania, denunciar as agressões aos povos e às nações oprimidas, não significa ter que escolher entre um dos blocos imperialistas. Uma escolha como esta significa, ao fim e ao cabo, a defesa do desenvolvimento dos monopólios capitalistas que lutam para ampliar seus lucros, sugar recursos naturais dos países dependentes e explorar os povos como mão de obra barata.
Trata-se de um grande erro o Governo tentar conciliar os interesses da classe trabalhadora com os da grande burguesia, pois estas classes têm interesses completamente opostos. A burguesia brasileira aceita perfeitamente ser parte da linha de produção imperialista, produzindo produtos de menor valor agregado para atender aos interesses dos capitalistas estrangeiros. Estes setores da burguesia dependente obtêm lucros mesmo se submetendo aos capitais externos, graças à cruel exploração dos trabalhadores brasileiros, que não ganham sequer o mínimo para sobreviver.
É obvio que não conseguiremos sair dessa crise, nem vencer a extrema-direita, continuando o financiamento do agronegócio e pagando exorbitantes taxas de juros de 15% ao capital financeiro. O atual governo do Brasil finge agir pela soberania com uma narrativa anti-Trump, mas mantém todos os acordos e uma política de dependência externa das principais potências mundiais. Além disso, defende a Palestina em palavras, mas mantém o envio de minérios, petróleo e libera a compra de armas de Israel.
Existe sim uma saída para a crise em que vivemos, mas essa saída não está no Parlamento, nem nos governos reformistas da social-democracia. A saída para defender a soberania do nosso país, barrarmos a intromissão do imperialismo e a guerra que se avizinha é nos organizarmos e unirmos o conjunto da classe trabalhadora para lutar por uma revolução socialista.
Na construção desse processo, é preciso lutar pelos reais interesses do povo pobre, revertendo as privatizações e retomando os recursos estratégicos do país. Lutar para impedir a sangria de recursos da União, com o pagamento de juros da dívida pública aos banqueiros, que representa um desvio de quase 50% do orçamento do Governo Federal. Também colocar todos os fascistas no banco dos réus. Julgar exemplarmente os torturadores de ontem e de hoje como criminosos de lesa-humanidade.
Em uma guerra, não podemos ter medo. A classe trabalhadora tem força e precisa trilhar seu próprio caminho.
Matéria publicada na edição impressa nº317 do jornal A Verdade