Nos dias 02 e 03 de agosto, a Unidade Popular (UP) realizou seu 1º Encontro Nacional LGBTI+, no Rio de Janeiro. Confira abaixo trechos da resolução final, que reafirmou os princípios classistas, socialistas e revolucionários na luta contra a LGBTIfobia.
PARTIDO – Com o objetivo de aumentar o nível de exploração da classe trabalhadora, a grande burguesia trabalha para manter um alto grau das mais variadas opressões. Manter a estrutura racista e patriarcal e cisheteronormativa, o controle reprodutivo, a violência e a divisão social, sexual e racial do trabalho são estratégias fundamentais para gerar uma mais valia cada vez maior e constante para a burguesia ao mesmo tempo que nos mantém acorrentados(as) nas atuais estruturas e relações de opressão, fortalecendo a divisão social baseada na propriedade privada dos meios de produção.
O grande capital usa todo seu aparato econômico, político e ideológico para oprimir Lésbicas, Gays, Bissexuais, Trans, Travestis, Não-Bináries, Intersexo, Assexuais e as demais parcelas sociais que não se enquadram à norma social de gênero e de orientação sexual.
Apesar da opressão contra a população LGBTI+ atingir, em alguma medida, todas as pessoas, são as LGBTI+ trabalhadoras, pobres e proletárias que sofrem mais intensamente com o desemprego, os trabalhos precarizados, o abandono familiar e o alto custo de vida. Para além das dificuldades no acesso à redesignação sexual, pessoas trans e demais identidades LGBTI+ da classe trabalhadora enfrentam barreiras cotidianas no acesso a cuidados básicos de saúde, como tratamentos hormonais, acompanhamento psicológico, prevenção a ISTs, uso da PrEP e atendimento digno e informado em saúde sexual, especialmente no caso de mulheres lésbicas e bissexuais. Também vivenciam, nas comunidades onde vivem, situações frequentes de violência, discriminação e descaso por parte dos serviços públicos: uma realidade que a população LGBTI+ da burguesia não conhece.
A sociedade de classes e a ideologia dominante trabalham para impor sua concepção de gênero e sexualidade e reprimir quem não se adequa. Mas, mesmo assim, existe uma parcela da sociedade que não se enquadra nela, rompendo com os padrões de gênero, tendo relações sexuais e afetivas com pessoas do mesmo gênero, tendo características e identidades de gênero independente de seu sexo, subvertendo a perspectiva binária de gênero, inclusive nascendo com características sexuais fora do padrão feminino e masculino, como as pessoas intersexo, e desenvolvendo manifestações de gênero e orientação sexual pautadas ao mesmo tempo por aspectos da individualidade e coletividade que não correspondem à norma.
Essa parcela, por não se enquadrar dentro dos padrões estabelecidos, além de ser superexplorada, é submetida a diversas violências físicas, sexuais, patrimoniais, psicológicas e morais, que vão desde a infância até à velhice, desde o espaço familiar até espaços públicos. As mulheres trans e travestis, que têm a menor expectativa de vida dentro da comunidade LGBTI+ no Brasil (cerca de 35 anos) são tratadas no capitalismo como objetos sexuais e descartáveis. Isso ocorre porque, em uma sociedade patriarcal, a noção de mulher ainda está limitada à função reprodutiva, à subordinação ao homem, ao papel de esposa e mãe.
É por isso que setores reacionários e machistas negam às mulheres trans e travestis o reconhecimento como “mulheres de verdade”. Essa visão, além de desumanizar e excluir as mulheres trans e travestis, também aprisiona as mulheres cis nesse papel submisso, negando-lhes autonomia sobre seus corpos e seus direitos reprodutivos.
Nossa luta não é contra os trabalhadores homens cis, que se identificam com o gênero com que foram identificados ao nascerem, e heterossexuais, e sim contra a norma que oprime e exclui dos espaços da sociedade parte importante da classe trabalhadora, as pessoas LGBTl+. Somos contra a própria burguesia e o Capitalismo, verdadeiros responsáveis por todo sistema de opressões. Desejamos um mundo diverso que não crie barreiras, que promova o diálogo entre os seres humanos, para que todos, todas e todes possam ser amados e respeitados, como são. Também somos contrários ao sistema burguês individualista, que trata as pessoas, o sexo e as relações sexuais, como meras mercadorias à sua imagem e semelhança.
Não confundimos liberdade sobre os corpos, sobre os sentimentos afetivos, sobre o amor, que é revolucionário, com as relações liberais de consumo, de exploração sexual e de reprodução, que alimentam o sistema de opressão.
Nossa luta não está à venda!
O capitalismo transforma tudo em negócio e utiliza as opressões como base para sustentar a lógica absurda de mercantilizar até mesmo as relações sociais e a forma como existimos no mundo. Uma das expressões centrais desse processo é a opressão de gênero e sexualidade, que é instrumentalizada para gerar lucro e manter estruturas de dominação.
A ideologia burguesa tenta capturar a revolta da população LGBTI+ e transformá-la em algo inofensivo, restringindo nossa luta à conquista de alguns direitos. Embora esses direitos sejam importantes, não representam o essencial. Por exemplo, não podemos dizer que conquistamos nossa liberdade apenas porque hoje existe o direito legal ao casamento.
Em outra frente, o capitalismo tenta cooptar nossa luta para defender as pautas do imperialismo no mundo. As maiores vítimas dessa tática oportunista hoje é o povo palestino, que sofre acusações de serem lgbtifóbicos enquanto o estado de Israel seria “a favor da população LGBTI+”.
Nada mais mentiroso, pois o genocídio em Gaza é também o genocídio da população LGBTI+ palestina. Em Israel, o regime nazi-sionista e seus agentes, muitos dos quais pessoas LGBTI+, não são nossas aliadas nem querem a nossa libertação, mas procuram usar a luta em defesa da diversidade sexual e de gênero como uma máscara para encobrir o extermínio de um povo. Na Palestina, assim como no Brasil e no mundo, a opressão contra os LGBTI+ ocorre por conta da dominação imperialista e a submissão dos povos à exploração do trabalho. Por isso reafirmamos: Não em nosso nome!
Não podemos nos considerar livres em um país que lidera o ranking de assassinatos de pessoas LGBTI+ no mundo. Nossa liberdade não está em sermos vistos como um novo mercado consumidor para garantir os lucros dos capitalistas. A verdadeira liberdade só será conquistada com o fim da exploração que sofremos e com a garantia de condições dignas de vida: trabalho, moradia, saúde e educação de qualidade.
Essa transformação só será possível com a destruição do capitalismo e a construção de uma nova sociedade: uma sociedade socialista, baseada na liberdade, na solidariedade e na compaixão, onde a classe trabalhadora seja a verdadeira dona das riquezas que produz. Organizar aqueles(as) que lutam todos os dias para viver com dignidade é essencial, porque quem conhece na pele o que é viver preso, também deseja libertar os outros.
“Comunidade” é uma palavra que tem o radical “comum” (aquilo que é compartilhado por muitos). E como LGBTI+ comunistas, esta palavra tem muito significado para nós. Por isso reafirmamos que aqueles que nos exploram e que atuam como agentes do imperialismo no Brasil e no mundo, nunca poderão fazer parte da nossa comunidade LGBTI+. Nossa comunidade é parte da classe trabalhadora, por isso, para se manter unida, organizada, lutando de forma coletiva e consequente, ainda que tenha demandas específicas, precisa estar integrada à luta geral da classe.
Neste sentido, a Unidade Popular (UP), nesse primeiro encontro nacional, reafirma sua determinação em organizar essa parcela importante da classe trabalhadora, dos estudantes, do povo sem teto, sem terra, da juventude e dos demais setores do nosso povo. Crescer nossa atuação entre os LGBTI+ da camada mais oprimida da sociedade é a nossa tarefa imediata.
Matéria publicada na edição impressa nº319 do jornal A Verdade