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quinta-feira, 28 de agosto de 2025

As Donas Marias e a escola do povo

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Em fevereiro, a cidade de Diadema (SP) ganhou a Escola Nacional Eliana Silva, iniciativa voltada à alfabetização de jovens e adultos. O projeto, do Movimento de Luta nos Bairros, Vilas e Favelas (MLB),  enfrenta o analfabetismo em territórios populares.

Caroline Alencar  e Victoria Magalhães | São Paulo (SP)


LUTA POPULAR – Em fevereiro deste ano, a cidade de Diadema (SP) se tornou mais um território onde a luta contra o analfabetismo ganhou forma concreta com a Escola Nacional Eliana Silva. Desde o início, o desafio foi grande: convencer as pessoas de voltar a estudar, superando o constrangimento e a descrença. Muitas famílias dos bairros, especialmente mulheres, não acreditavam mais na possibilidade de aprender e carregavam a culpa pela exclusão educacional.

“Tenho vergonha, já tô velha pra isso”, disse Rita. Outros, mesmo querendo estudar, viam-se divididos entre o compromisso com a igreja e os horários das aulas: “Eu queria ir, mas é no dia do culto”, relatavam. Por isso, entendemos a importância de incentivá-los a participar, mostrando que podem aprender para ler a Bíblia com seus próprios olhos e, a partir daí, começar a ler outros livros que vão libertar todos nós da fome e da humilhação.

Nosso método parte do cotidiano: trabalhamos com o que está na vida das pessoas – o nome dos familiares, receitas, palavras do dia a dia, cabeçalhos, entre outros. Mas, para além disso, as aulas se fundamentam numa pedagogia revolucionária, que revela o analfabetismo como parte de um projeto de exclusão do povo trabalhador. A desigualdade educacional não é um acaso, é consequência do sistema capitalista, que lucra com a retirada de direitos.

Por isso, firmamos parceria com a Rede Jubileu Sul Brasil, que passou a oferecer formações mensais na nossa escola.  Assim, além das aulas semanais de alfabetização, uma vez ao mês, aprofundamos também a formação política entre os educandos. Nessas aulas, as famílias do Movimento de Luta nos Bairros, Vilas e Favelas (MLB) puderem compreender como o pagamento da dívida pública – que consome mais de 40% do orçamento federal – retira recursos essenciais da saúde, educação, moradia e cultura. “Enquanto o Governo paga a dívida dos ricos, falta escola, moradia e vivemos endividados”, disse um participante na aula.

É imensurável o tamanho dessa contribuição. Queremos aprender e ensinar não como um processo individual, mas sim coletivo, de aprofundar nossa possibilidade de compreensão sobre as injustiças impostas a cada um de nós.

Os frutos da campanha por um território livre do analfabetismo já começam a surgir. Com base em nosso Projeto Nacional Político e Pedagógico, Maria Aparecida, uma das primeiras alunas que se convenceu de estudar para ter acesso às matérias do jornal A Verdade, já consegue ler e escrever várias palavras sozinha. A primeira delas foi “luta”, não por acaso. É a palavra que melhor expressa o que a educação popular e revolucionária pode proporcionar: consciência e organização ao povo. Maria José, outra aluna, também já escreve seu nome e reconhece todas as letras do alfabeto.

Um dos métodos que temos adotado é realizar visitas às pessoas em suas casas, para ouvi-las, apresentar a Escola e convencê-las da importância de voltar a estudar. Foi assim com Ana Lúcia: durante a visita, ela compartilhou o sonho de se alfabetizar para poder ler a Bíblia sozinha. Com escuta, acolhimento e incentivo, ela decidiu retomar os estudos e passar a frequentar as aulas semanalmente. Hoje, Ana Lúcia, além de educanda da Escola, está sempre firme e presente nos atos convocados pelo MLB.

A Escola Nacional Eliana Silva não transforma apenas a vida dos estudantes, mas também impacta profundamente os educadores voluntários que chegam até ela por meio das ações de divulgação, como panfletagens no bairro. “Está sendo muito importante porque estou conseguindo aprender e também ensinar, e estar em um Movimento é não estar sozinha. Tenho muito orgulho de fazer parte da Escola Nacional Eliana Silva. A escola foi o início e hoje luto por justiça social e pelo socialismo fazendo parte do MLB. Minha profissão está sucateada e eu não aceito fazer parte de um sistema que destrói os professores, mas tenho o dever de ainda sim lutar por uma educação – não só da escrita e leitura, mas de consciência política. A mudança vem pela mobilização da sociedade e educação, esses dois são indissociáveis”, compartilha Valdenice.

Além de Diadema, a Escola Nacional Eliana Silva inaugurou, há alguns meses, uma turma na Ocupação Chaguinhas, no Centro de São Paulo, onde educadores voluntários oferecem aulas de alfabetização e de língua portuguesa para as famílias imigrantes. No bairro do Pantanal, em São Paulo, já temos uma sede estruturada e alunos preparados para o início das atividades; o mesmo em São Bernardo do Campo. As famílias aguardam ansiosamente o começo das aulas que já estão com data marcada para começar.

Aos poucos, estamos convencendo mais Donas Marias de que é possível aprender a ler o jornal A Verdade, pegar um ônibus sozinha sem constrangimento, seguir uma receita e, mais do que isso, derrubar um sistema que impõe pobreza, fome e analfabetismo.

Viva a educação popular!

Viva a Escola Nacional Eliana Silva!

Matéria publicada na edição impressa  nº319 do jornal A Verdade

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