UM JORNAL DOS TRABALHADORES NA LUTA PELO SOCIALISMO

sábado, 27 de abril de 2024

As mães

Todos os domingos elas vão chegando com sacolas cheias de alimentos, normalmente caladas, acompanhadas de filhas ou irmãs, e ficam aguardando abrirem-se os portões que dão acesso ao pavilhão onde estão os detidos.

São mães e esposas dos presidiários que, todo fim de semana, visitam seus familiares presos.

Conversamos com duas delas. Mães de jovens aprisionados na penitenciária de Igarassu, Pernambuco. Detidos, segundo elas, quando a boca onde eles compravam drogas caiu.

Enquanto falavam dos filhos, seus olhos se enchiam de lágrimas, relatando o sofrimento por que passam diante da situação.

Impotência e dor são as palavras que pronunciam quando perguntamos qual o sentimento delas, como mulheres e mães, por terem seus filhos presos.

Seus filhos começaram a se envolver com drogas aos 12 e 14 anos. Meninos que não tinham luxo, mas que não passavam fome; filhos de mães trabalhadoras, separadas, que reconstituíram suas famílias com novos parceiros, mantendo uma relação de amor e carinho com os filhos.

“Jamais abandonaria meu filho; mãe que ama jamais abandona o filho…” – dizem, quase uníssonas, Simone e Dolores, moradoras de Peixinhos, lutadoras pelo direito à moradia digna, militantes do MLB.

Apesar dos relatos de rejeição, de serem apontadas pelos vizinhos e familiares como mães de drogados, de levarem a culpa pela situação dos filhos, encontram força para superar o preconceito da sociedade, que não só discrimina os presidiários e ex-presidiários, mas também seus familiares.

Na sociedade em que vivemos, elas têm a responsabilidade de cuidar dos filhos, dos doentes e dos idosos da família, e são declaradas culpadas por todos os erros de sua prole. “Muitas pessoas deixaram de conviver conosco, como se tivéssemos uma doença contagiosa; algumas de nós perdem os empregos quando os patrões ficam sabendo que somos mães de detentos”.

Simone e Dolores têm consciência de que a prisão não reeduca, nem sociabiliza, mas que a convivência dentro dos presídios só alimenta a revolta inconsequente, aprimora o vínculo com o banditismo e a violência. Relatam casos de agressões na prisão. Dolores disse que teve que pagar R$ 800 para que seu filho pudesse ter um espaço para dormir, e Simone contou a degradação que seu filho, usuário de crack, passava dentro do presídio, a ponto de sensibilizar o chaveiro, que a ajudou a transferir o rapaz para a ala de triagem, para que ele não morresse. O envolvimento dessas mulheres com o sofrimento dos filhos é tal que, em determinado momento, Dolores diz que as mães sofrem mais que eles por vê-los em situação de degradação, de humilhação e desumanidade.

As duas falam que tentaram salvá-los. Dolores saía de casa de madrugada para buscar o filho em outro bairro. Ia perambulando pelas ruas até encontrá-lo e levá-lo para casa. Simone diz que assistia seu filho se consumindo e que convenceu os familiares a deixá-lo se drogar dentro de casa, para não perdê-lo, e que quase conseguiu interná-lo numa instituição ligada à igreja evangélica, mas ele foi preso depois de passar por três triagens da instituição.

Perguntamos como são tratadas nas visitas. Elas dizem que o público que frequenta os presídios é de 100 mulheres para 10 homens, e que ficam sob o sol escaldante ouvindo pilhérias dos guardas, que as agridem verbalmente, humilham. Questionam os biscoitos que elas levam, e dizem que seus filhos, bandidos, não merecem suas visitas nem os “mimos” que elas levam para eles.

Elas dizem que a droga destrói a família, que muitas mães se separam de seus companheiros por eles não aceitarem o envolvimento emocional de suas companheiras com os filhos. Elas, então, ficam sozinhas, sem apoio de familiares nem do Estado, que trata o consumo de drogas como caso de polícia e não dá aos usuários outra alternativa que não seja a cadeia. A política pública para a juventude no Estado capitalista é quase nenhuma, especialmente para os jovens usuários de drogas. Não ouvimos falar de construção de abrigos para jovens vítimas das drogas, nem de política específica que não sejam a da antiga Febem, hoje com outros nomes, mas com os mesmos expedientes: maus-tratos, tortura física e mental, apesar das boas intenções de alguns profissionais.

O consumo de drogas só tem crescido em nosso país. A indústria da droga procura envolver cada vez mais jovens com menos idade. É de interesse deste sistema em que vivemos acabar com a possibilidade de rebeldia da juventude, criando uma geração incapaz de se rebelar e sublevar contra as injustiças e desigualdades.

É de interesse das mulheres e mães destruir esse sistema que nos traz sofrimento e dor e construir um sistema baseado na igualdade e justiça, o socialismo.

Guita Kozmhinsky, Recife

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