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sábado, 23 de novembro de 2024

As mães

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Todos os domingos elas vão chegando com sacolas cheias de alimentos, normalmente caladas, acompanhadas de filhas ou irmãs, e ficam aguardando abrirem-se os portões que dão acesso ao pavilhão onde estão os detidos.

São mães e esposas dos presidiários que, todo fim de semana, visitam seus familiares presos.

Conversamos com duas delas. Mães de jovens aprisionados na penitenciária de Igarassu, Pernambuco. Detidos, segundo elas, quando a boca onde eles compravam drogas caiu.

Enquanto falavam dos filhos, seus olhos se enchiam de lágrimas, relatando o sofrimento por que passam diante da situação.

Impotência e dor são as palavras que pronunciam quando perguntamos qual o sentimento delas, como mulheres e mães, por terem seus filhos presos.

Seus filhos começaram a se envolver com drogas aos 12 e 14 anos. Meninos que não tinham luxo, mas que não passavam fome; filhos de mães trabalhadoras, separadas, que reconstituíram suas famílias com novos parceiros, mantendo uma relação de amor e carinho com os filhos.

“Jamais abandonaria meu filho; mãe que ama jamais abandona o filho…” – dizem, quase uníssonas, Simone e Dolores, moradoras de Peixinhos, lutadoras pelo direito à moradia digna, militantes do MLB.

Apesar dos relatos de rejeição, de serem apontadas pelos vizinhos e familiares como mães de drogados, de levarem a culpa pela situação dos filhos, encontram força para superar o preconceito da sociedade, que não só discrimina os presidiários e ex-presidiários, mas também seus familiares.

Na sociedade em que vivemos, elas têm a responsabilidade de cuidar dos filhos, dos doentes e dos idosos da família, e são declaradas culpadas por todos os erros de sua prole. “Muitas pessoas deixaram de conviver conosco, como se tivéssemos uma doença contagiosa; algumas de nós perdem os empregos quando os patrões ficam sabendo que somos mães de detentos”.

Simone e Dolores têm consciência de que a prisão não reeduca, nem sociabiliza, mas que a convivência dentro dos presídios só alimenta a revolta inconsequente, aprimora o vínculo com o banditismo e a violência. Relatam casos de agressões na prisão. Dolores disse que teve que pagar R$ 800 para que seu filho pudesse ter um espaço para dormir, e Simone contou a degradação que seu filho, usuário de crack, passava dentro do presídio, a ponto de sensibilizar o chaveiro, que a ajudou a transferir o rapaz para a ala de triagem, para que ele não morresse. O envolvimento dessas mulheres com o sofrimento dos filhos é tal que, em determinado momento, Dolores diz que as mães sofrem mais que eles por vê-los em situação de degradação, de humilhação e desumanidade.

As duas falam que tentaram salvá-los. Dolores saía de casa de madrugada para buscar o filho em outro bairro. Ia perambulando pelas ruas até encontrá-lo e levá-lo para casa. Simone diz que assistia seu filho se consumindo e que convenceu os familiares a deixá-lo se drogar dentro de casa, para não perdê-lo, e que quase conseguiu interná-lo numa instituição ligada à igreja evangélica, mas ele foi preso depois de passar por três triagens da instituição.

Perguntamos como são tratadas nas visitas. Elas dizem que o público que frequenta os presídios é de 100 mulheres para 10 homens, e que ficam sob o sol escaldante ouvindo pilhérias dos guardas, que as agridem verbalmente, humilham. Questionam os biscoitos que elas levam, e dizem que seus filhos, bandidos, não merecem suas visitas nem os “mimos” que elas levam para eles.

Elas dizem que a droga destrói a família, que muitas mães se separam de seus companheiros por eles não aceitarem o envolvimento emocional de suas companheiras com os filhos. Elas, então, ficam sozinhas, sem apoio de familiares nem do Estado, que trata o consumo de drogas como caso de polícia e não dá aos usuários outra alternativa que não seja a cadeia. A política pública para a juventude no Estado capitalista é quase nenhuma, especialmente para os jovens usuários de drogas. Não ouvimos falar de construção de abrigos para jovens vítimas das drogas, nem de política específica que não sejam a da antiga Febem, hoje com outros nomes, mas com os mesmos expedientes: maus-tratos, tortura física e mental, apesar das boas intenções de alguns profissionais.

O consumo de drogas só tem crescido em nosso país. A indústria da droga procura envolver cada vez mais jovens com menos idade. É de interesse deste sistema em que vivemos acabar com a possibilidade de rebeldia da juventude, criando uma geração incapaz de se rebelar e sublevar contra as injustiças e desigualdades.

É de interesse das mulheres e mães destruir esse sistema que nos traz sofrimento e dor e construir um sistema baseado na igualdade e justiça, o socialismo.

Guita Kozmhinsky, Recife

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