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terça-feira, 24 de dezembro de 2024

Quem mandou matar Kadafi

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Logo após chegar à Líbia, no dia 18 de outubro, cercada de um forte esquema de segurança, a Secretaria de Estado dos EUA, Hillary Clinton, fez a seguinte declaração à imprensa: “Esperamos que ele (Muamar Kadafi) seja capturado ou morto logo. Assim não precisaremos mais ter medo dele”.

Dois dias depois, 20 de outubro, às 13h07, o Conselho Nacional de Transição (CNT) anunciou a prisão de Kadafi. Às 13h53, 50 minutos depois, as agências internacionais de notícias informaram o assassinato do ex-dirigente líbio. Segundo médicos legistas que analisaram fotografias, o coronel líbio foi bastante espancado antes de morrer e levou três tiros, dois deles na cabeça.

A ONU (Organização das Nações Unidas) pediu uma investigação sobre a morte de Kadafi, pois, segundo as leis internacionais, mesmo durante uma guerra, prisioneiros não devem ser assassinados, mas levados a julgamento. Para Rupertt Colville, do Alto Comissariado de Direitos Humanos da ONU, “os vídeos que mostram Kadafi vivo e minutos depois morto são muito perturbadores”. Já Abdel Hafiz Ghoga, vice-presidente do CNT, disse que “O responsável pela morte, quem quer que seja, será julgado e receberá o que for justo”.

Porém, os assassinos de Kadafi e de seu filho Mutassim Kadafi, também preso e executado no mesmo dia, já sabem o que dizer em suas defesas: cumpriram as ordens da secretária Hillary Clinton, que declarou em alto e bom som que Kadafi deveria ser “morto logo”. E foi o que os mercenários líbios friamente fizeram.

Relata o jornal mexicano La Jornada que a secretaria norte-americana, ao ser informada da morte de Kadafi, reagiu com grande satisfação. Hillary Clinton estava concedendo uma entrevista à cadeia CBS quando um de seus assessores lhe passou um celular com a notícia da prisão e morte de Kadafi.  As câmeras flagraram a reação da secretaria abrindo os olhos e levando a mão à boca, numa expressão de satisfação, ao tempo em que pronunciava a frase: “Vinimos, vimos y murió”.

Porém, não é só a morte de Kadafi que precisa ser investigada. Os mais de 130 mil bombardeios realizados desde março pela Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN) e pela França, Inglaterra, Espanha e Estados Unidos mataram mais de 50 mil líbios. Lembremos que a resolução 1973 do Conselho de Segurança Nacional da ONU, aprovada no dia 17 de março deste ano, dizia claramente que o objetivo da ação na Líbia deveria ser apenas “implantar uma zona de exclusão aérea na Líbia e impedir que civis sejam mortos”. Mas, o que a OTAN fez foi jogar no lixo essa resolução e implementar uma intervenção militar criminosa e covarde num país que tinha um governo reconhecido pela ONU e cujo principal dirigente gozava da amizade de vários chefes de governo dos países imperialistas, como Nicolas Sarkozy, que chegou a receber dinheiro de Kadafi para sua eleição, e de Silvio Berlusconi, que também recebeu presentes do coronel. Aliás, Kadafi tinha uma admiração especial por Condoleeza Rice, ex-secretaria do governo Bush, a quem chamava de “princesa africana”. Rice revelou em sua biografia Não há honra maior, lançada essa semana, que Kadafi pediu a um grande compositor líbio para fazer a canção “Flor Negra da Casa Branca” em sua homenagem.

Portanto, saber como Kadafi foi assassinado, em vez de analisar porque a resolução da ONU foi desrespeitada, é apenas uma cortina de fumaça para esconder que o verdadeiro objetivo da guerra imperialista na Líbia é se apossar do petróleo do país. Como se sabe, antes da guerra, a Líbia produzia 1,8 milhão de barris de petróleo por dia, e possui reservas para, pelo menos, 80 anos.  A Itália importa 20% de seu consumo de petróleo da Líbia, e a França, a Suíça, a Irlanda e a Áustria dependem em 15% de suas importações do petróleo líbio.

Segundo o jornal New York Times de 22 de outubro, a empresa italiana ENI, a francesa Total e a austríaca OMV realizam há dois meses reuniões para discutir os contratos de exploração do petróleo líbio. Segundo ainda o jornal norte-americano, o ministro das Relações Exteriores da Itália, Franco Frattini, disse na TV estatal italiana que a companhia petrolífera italiana Eni “terá o papel número um no futuro” do país norte-africano. O sr. Frattini chegou a afirmar que técnicos da Eni já estavam a caminho do leste da Líbia para reiniciar a produção.

A Eni, com a britânica BP, a Total da França, a Repsol YPF da Espanha e a OMV da Áustria, foram todas grandes produtoras na Líbia antes da guerra, e querem aumentar seu peso no país. As companhias americanas Hess, ConocoPhillips e Marathon, embora  tenham feito acordos com o regime de Kadafi, e dependam em menos de 1% das importações da Líbia para seu consumo, pretendem também ampliar seus negócios.

Aliás, antes de chegar ao poder, os chamados rebeldes líbios criaram uma companhia de petróleo para eles, a Agoco ou  Libya’s Arabian Gulf Oil Co.   O fato é que os governos imperialistas — especialmente os países da OTAN, que apoiaram os rebeldes com armas e dinheiro — querem ter certeza de que suas companhias ficarão em posição destacada para explorar o petróleo líbio.

Fica, portanto, a lição – particularmente para aqueles que dizem que o imperialismo não existe mais e riem da luta pela soberania nacional – de como os monopólios internacionais e os países imperialistas tratam seus “amigos” quando o que está em jogo é o lucro e o controle de fontes de matérias-primas, como o petróleo, que além de limitado e indispensável para o funcionamento da sociedade capitalista, teve nos últimos anos enorme elevação no seu preço. Ou seja, não existe ética, nem amizade com governantes, resolução da ONU ou leis internacionais que impeça o imperialismo e suas centenas de corporações internacionais de tornarem-se cada vez mais bárbaros e assassinos e tudo realizarem para impor sua ditadura à humanidade e saquearem o mundo, principalmente quando vêem seu sistema mergulhado numa grave e interminável crise.

Editorial

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