“É uma história de crime, mas é também uma história de guerra sobre a luta de classes”. Assim, Michael Moore define o seu mais novo filme Capitalismo: uma história de amor.
O cineasta de Tiros em Columbine e Fahrenheit 11 de setembro denuncia dessa vez os efeitos da crise que começou em 2008 e se arrasta até os nossos dias. Como temos acompanhado no jornal A Verdade, a crise econômica do capitalismo tem feito vítimas em todo o mundo e já são milhões de novos desempregados, famintos e desabrigados. O grande mérito do filme é dar nome, rosto e voz a esses anônimos que sofrem as conseqüências da crise que os capitalistas criaram. Várias são as denúncias que Moore faz ao longo do filme, desde famílias inteiras sendo despejadas de suas casas por não terem dinheiro para arcar com suas dívidas, até multinacionais que fazem seguro de vida de seus funcionários em nome da empresa. Ou seja, a morte desses funcionários deixa essas empresas mais ricas em alguns milhares de dólares.
Mais profundo que seus demais filmes, Capitalismo: uma história de amor denuncia o assalto aos cofres públicos, com a retirada de mais de U$ 700 bi do tesouro norte-americano e a entrega desse dinheiro aos bancos, montadoras e monopólios. Para isso, homens da inteira confiança de Wall Street são sempre os indicados para o Ministério do Tesouro (qualquer semelhança com o nosso Henrique Meireles, ex-diretor do Bank of Boston, não é mera coincidência). Senadores e deputados são subornados com empréstimos facilitados, um golpe é dado no Congresso, e implanta-se, assim como foi feito para preparar a invasão ao Iraque e Afeganistão, uma imensa propaganda para amedrontar as pessoas, ou nas palavras de Bush: “(…) sem a ação imediata do Congresso, os EUA podem entrar num pânico financeiro (…) Mais bancos irão falir, inclusive os da sua comunidade, a bolsa de valores cairá ainda mais, o que desvaloriza o seu fundo de pensão, o valor de sua casa despencará, as execuções hipotecárias aumentariam drasticamente. Ficará mais difícil obter crédito. Empresas fecharão suas portas.” Em outras palavras, ou dás o dinheiro aos coitadinhos dos banqueiros ou ficarás pobre, desabrigado e desempregado.
Com a eleição de Obama, a esperança ressurge e vários são os que acreditam que agora realmente as coisas vão mudar. Por isso, a imprensa e os poderosos começam uma intensa campanha para identificá-lo como socialista (ponto alto quando Arnold Schwarzenegger, diz que saiu da Europa porque o socialismo tinha acabado com as oportunidades. O detalhe é que a Áustria, país do exterminador do futuro, nunca foi socialista). E o mais impressionante é que, quanto mais o identificavam como socialista, mais ele crescia nas pesquisas, e uma pesquisa feita durante a eleição apontava que apenas 37% dos adultos nos EUA preferem o capitalismo ao socialismo, contra 33% que acham o socialismo o melhor sistema. “O capitalismo é um mal. Não se pode regular o mal. Temos que eliminá-lo e construir algo que seja bom para todos!”, nos diz Moore.
O filme é coroado com a resistência do povo estadunidense a todos esses absurdos. Operários ocupam fábricas, a juventude protesta, trabalhadores fazem greves, donas de casa se solidarizam com grevistas, deputados denunciam os crimes cometidos no congresso e a falsa democracia no capitalismo (ápice quando uma deputada denuncia que o centro do poder não é o congresso, mas Wall Street). Enfim, cria-se um pólo de resistência ao capitalismo no coração do sistema e a lente de Michael Moore nos mostra tudo ao som da Internacional (em inglês, no ritmo de jazz: mais norte-americano impossível).
São duas horas de olhos grudados na tela, alguns risos, cenas comoventes e muita pedrada no capitalismo e nos responsáveis pelo sofrimento do povo. “Fiz esse filme como se fosse o último filme que eu estaria autorizado a fazer”. Se for, Michael encerrará em grande estilo.
Iuri Pires Rodrigues – Pernambuco