O jornal A Verdade entrevistou Antonio Guerrero Drouet, membro da União de Artistas Populares do Equador (Unape) e do Partido Comunista Marxista-Leninista do Equador (PCMLE). Guerrero foi presidente da Unape de 2007 a 2009, é membro de sua direção nacional e poeta e escritor da esquerda revolucionária equatoriana.
A Verdade – Fale-nos um pouco sobre seu ingresso no PCMLE e sobre a importância da cultura para o Partido.
Antonio Guerrero – Sou um intelectual revolucionário. No ano de 1968, mais jovem que agora, nos estatutos do PCMLE, junto às características e condições para ser um militante estava escrito: não explorar o trabalho alheio, ser operário, camponês pobre e outros aspectos que correspondiam e correspondem às qualidades básicas para ser membro do partido. Saltou a mim de maneira vivaz: “intelectual revolucionário”. Me identifiquei com isso, era professor do ensino médio, gostava de ler e escrever literatura, poesia progressista, era membro da Casa da Cultura equatoriana da minha província, Esmeraldas. Fui vice-presidente de núcleo e me esforcei para cumprir os deveres de militante. Ingressei no Partido Comunista Marxista-Leninista do Equador quando tinha 27 anos. O regime populista de Velasco Ibarra reprimia fortemente a luta dos trabalhadores, dos camponeses, da juventude universitária e secundarista. Nos forjamos nesses combates que estavam ligados à luta contra o revisionismo contemporâneo kruchevista. Meu partido, desde aquela época, prestou sempre atenção à intelectualidade revolucionária, para que estudássemos e assimilássemos o marxismo-leninismo. Em março de 1970 se realizou a 1ª Conferência Nacional do PCMLE, que aprovou nossa linha geral e os estatutos. Nossa resolução política e tática para essa conjuntura previa a luta contra a ditadura militar de corte desenvolvimentista e petroleira. Com os jovens do colégio Vargas Torres, onde eu era professor, contribuí na formação do grupo “Rumo ao povo”, que levava a arte, a literatura e o teatro aos bairros, sindicatos e comunidades camponesas. Assim, construir um poema, uma canção, um conto, tinha como propósito impulsionar a luta revolucionária para a conquista do Poder Popular.
No Equador se desenvolvia a corrente artística que tinha em “Los Tzánsicos”, de Quito, uma forte expressão política contra a dominação oligárquica nacional e norte-americana. Esses anos marcaram o ritmo da nossa poesia, da canção popular, do teatro e da pintura, que teve no Centro de Arte Nacional e em Rafael Larrea formidável destaque nas décadas de 80 e 90 e até o fim do século 20. Eu era um quadro dedicado às tarefas de construção das forças revolucionárias, mas escrevia poesia, elaborava contos e estimulava, nos coletivos em que militei, o trabalho artístico-literário popular.
Como você vê a cultura e a estética da indústria cultural capitalista?
A concepção estética do individualismo, que é a concepção estética das classes opressoras em geral e da burguesia em particular, é hegemônica, ainda que pesem as contradições que elas suportam dentro de sua arte decadente: a promoção do “antiterrorismo”, a pornografia, o erotismo, a alienação, combinando com habilidade com outras formas que atraem para a sua concepção a juventude das classes médias.
Os grandes monopólios de arte massificadora, como a Warner ou a Sony Music, promovem essas expressões artísticas alienantes e conseguem enormes recursos provenientes do mercado criado por eles. Elvis Presley e Michael Jackson ainda depois de mortos são meios de enriquecimento desses monopólios que exploram e manipulam e às vezes enriquecem e destroem moralmente (como Lady Gaga, Justin Bieber, Shakira, etc.).
Diante dessa ofensiva, nós, do Partido Comunista, temos como parte de nossa ideologia e de nossa teoria científica a nossa concepção estética proletária, que se fundamenta na tese de que a classe operária e os povos fazem a história. Este é nosso arquétipo estético vigoroso, formidável, de onde brotam nossos heróis; nosso protótipo que, no marco da crise atual do capitalismo, se expressa nas lutas que se apresentam na Europa –Espanha, Grécia, Inglaterra – e nos países árabes, na luta política e social que se desenvolve na América Latina, particularmente no Equador.
E como você define a cultura popular e a estética revolucionária? Qual sua relevância?
A arte popular (que tem expressões de classe incertas no folclore, nas etnias e nacionalidades, nas culturas nacionais), principalmente como disseram Brecht e Rafael Larrea, é aquela arte que confronta a arte e a literatura burguesas e imperialistas na atualidade, assim como a política da burguesia. O governo de Rafael Correa [o atual presidente do Equador], cada vez mais identificado com os interesses dos Estados Unidos e da China imperialista, das oligarquias nacionais, dos banqueiros e exploradores nacionais, se apresenta como “de esquerda” e vende gato por lebre às faixas sociais que ainda conseguem ganhar com as reformas e obras desenvolvimentistas. A essa política – no nosso caso e sem negar apoio no campo artístico e literário às lutas dos povos da terra – nossa arte deve apontar, para que realmente adquira conotação popular. Meu último livro O arcanjo e a pedra, se refere precisamente a esses fatos políticos e mostra o semblante do “arcanjo” Correa
Qual o papel da Unape?
A União de Artistas Populares do Equador foi reconstituída em 2004 e está preparando seu 3º Congresso. Sua concepção e práxis é construir arte popular, multicultural, emancipadora.
A Unape existe em 16 das 24 províncias do Equador, mas em todas temos alguns grupos de artistas e escritores. Temos direções nacional e provinciais. Trabalhamos com muitos grupos musicais, com dança mestiça, indígena e negra, com pintura, vídeos, literatura nos diversos gêneros. Organizamos oficinas para diferentes áreas. Naturalmente temos visão e concepção populares da arte e da literatura. Temos limitações, mas trabalhamos em todos os terrenos, agora no terreno da teoria e da práxis, da criação artística e literária para avançar no processo revolucionário.
Todos os anos realizamos eventos artísticos importantes: em agosto, em Guayaquil, já há 27 anos, realiza-se o Festival Rosa de Agosto, com música, dança, teatro etc. Esse evento acontece em homenagem a uma jovem professora, Rosa Paredes, militante do PCMLE, morta durante a greve nacional do magistério durante a ditadura militar petroleira desenvolvimentista, em 1973. Em fevereiro realiza-se, em Quito, o festival Jaime, Hermano Pueblo, em memória de Jaime Hurtado, dirigente comunista assassinado durante o governo da democracia cristã de Jamil Mahuad, no fim do século passado.
A Unape continua o trabalho do Centro de Arte Nacional, criado por Rafael Larrea, poeta, músico, propagandista, organizador e formador de quadros para todas as frentes. Contribuiu também no alinhamento dos artistas militantes para que construíssemos um polo de atração para os artistas e escritores progressistas, democráticos e patriotas. Consta da linha do nosso partido que o Equador é um país plurinacional, multiétnico, pluricultural e, por meio dessa organização, trabalhamos para fortalecer a luta de classes e o processo emancipador que se desenvolve no Equador.
E para encerrar?
Envio um abraço fraterno e revolucionário para os camaradas do Partido Comunista Revolucionário no Brasil.
Vivian Mendes, Redação