Inovação tecnológica para quem?

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Com o aprofundamento da crise econômica no Brasil, o Governo Federal lançou a sua política para tentar evitar o processo de desindustrialização¹, o plano chamado “Brasil Maior”.  Desde o ano passado, ocorreu uma série de movimentações políticas com o objetivo de lançar as bases do repasse de muitos bilhões para o setor privado com a roupagem de “fomento à inovação tecnológica” e “competitividade”. Vejamos esses passos.

Uma das medidas mais importantes é o fortalecimento da Financiadora de Estudos e Projetos (Finep). O órgão recebe 0,5% do PIB² e passará a receber 0,9%, até 2014. A Finep utiliza os seus recursos para financiar projetos públicos ou privados. Mas, segundo o Ex-ministro de C&T, Aloísio Mercadante, a prioridade é o setor privado: “Colocamos mais recursos para crédito exatamente para incentivar a empresa privada fazer inovação”. O orçamento da Financiadora é atualmente de R$ 6 bilhões, enquanto o próprio ministério de Ciência e Tecnologia sofreu cortes de verbas de R$ 2 bilhões, ficando com R$ 4,7 bilhões.

Esse incentivo às indústrias é a política de inovação tecnológica, isto é, passar dinheiro público para os industriais, visando aumentar a competitividade da indústria do país que, a cada dia que passa, perde na balança comercial³, mostrando a fragilidade da economia brasileira, majoritariamente exportadora de commodities, com a tendência de aprofundamento da crise no país.

Projetos ameaçam conquistas da classe operária

As outras medidas do plano para salvar a indústria são de um campo único que visa impor derrotas a conquistas históricas dos trabalhadores brasileiros. Medidas para flexibilizar as leis trabalhistas e subsidiar a produção para “manter os empregos no Brasil”.

A verdade é que a tática do Governo é promover a aliança entre o capital e trabalho. A declaração do deputado federal José de Fillipi (PT) sentencia claramente: “Os trabalhadores terão de se sentar à mesa com os industriais numa nova perspectiva, não mais na dicotomia entre capital e trabalho. Essa dicotomia não vai deixar de existir, mas os representantes dos dois setores vão ter que negociar”.

Entretanto, a política de conciliação se mostra ineficiente a cada dia, e os capitalistas querem “concessões negociadas para manter os empregos”. Os dados de desemprego na indústria só aumentam. Segundo a Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), só em março, foram demitidos 4.500 trabalhadores4 no Estado, que é maior parque industrial do país.

Vejamos a  relação entre capital e trabalho que será empreendida

Os trabalhadores ficam com o “Brasil Menor”

O Ministério do Trabalho prepara um projeto para que as empresas possam contratar nas seguintes modalidades, atualmente ilegais: um contrato eventual em que o trabalhador só receberá quando for chamado para trabalhar, isto é, contratar e chamar para trabalhar quando lhes for conveniente; a outra é com o mesmo objetivo, mas por hora trabalhada.

Com o verniz de manutenção do emprego no país o BNDES prepara uma linha de crédito de 500 bilhões, para as empresas.

“Redução do Custo Brasil”: desoneração tributária da ordem de R$ 24,5 bilhões. Isto é, ao mesmo tempo em que o Governo dá dinheiro através da Finep e BNDES, faz uma grande renúncia fiscal.

 O “Brasil Maior” em lucros para os industriais e “Menor” em salários para os trabalhadores5.

Mas a ânsia por lucros da burguesia e a luta para obter meios mais rentáveis e fáceis não para. Segundo Paulo Skaf, presidente da Fiesp, além de achar tímidas as ações governamentais, opina sobre as concessões no Brasil: “O Governo precisa chamar os leilões para as concessões de energia elétrica que vão vencer em 2015. Com eles, e com as usinas hidrelétricas que já existem e não precisam de investimento, vai ser retirado do preço da energia o valor da amortização que a sociedade já pagou duas vezes durante 56 anos”. Isto é, o povo investiu durante 56 anos, e, agora que o parque hidroelétrico está quase pronto, sendo possível baixar o alto preço da energia no país, o lobby pela concessão/privatização se fortalece.

Competitividade e inovação tecnológica

São palavras que imperam nos discursos de Dilma e outros dirigentes da nação. Na prática, a tentativa é preparar o Brasil para competir com a China, que detém importante produção industrial. Para tornar o Brasil competitivo é necessário aumentar a produção e baixar o preço, portanto, é uma inovação com dinheiro público, canalizado para melhorar o rendimento de indústrias privadas somadas ao regime de trabalho chinês, que começa com medidas de flexibilização, terceirização e precarização.

Pedindo as sobras

É cada vez mais claro que toda a campanha de aliança com a burguesia brasileira para desenvolver a nação é um caminho para ter algumas políticas paliativas de amortecimento das revoltas populares por salários, melhores condições de trabalho, contra a carestia, moradia popular, terra, saúde, educação, acesso à informação e tecnologia. Entretanto, o aprofundamento da crise econômica, cíclicas e inevitáveis, é um fato que derruba o voo sem asas da socialdemocracia6.

A inovação tecnológica pode e deve ser destinada a resolver problemas históricos do povo brasileiro. Para isto, é preciso esforço político. A organização da produção, aliada a um planejamento do uso das riquezas do país, é capaz de resolver nossos problemas sociais, meta a ser alcançada plenamente sob um novo regime econômico e social, o socialismo.

É hora de ampliarmos o debate sobre esses temas na juventude.  Questões como as mudanças do Código Florestal, O “AI-5 digital”, o fruto das pesquisas acadêmicas serem privatizadas através das patentes, “concessões selvagens” de serviços públicos como defendida pela Fiesp, “parceira” da atual direção da UNE e da Ubes, os leilões do Pré-sal e o ensino público tecnológico sendo passado para a iniciativa privada através do Fies e Pronatec, são alguns exemplos dos desafios inseridos no campo da tecnologia.

 Notas:

1 – https://averdade.org.br/2012/02/crescimento-capitalista-aumenta-submissao-do-brasil-ao-capital-estrangeiro/

2 – Os servidores públicos lutam por um reajuste salarial que totalizam 0,5% do PIB.

3 – Segundo o Sistema Integrado de Comércio Exterior (Siscomex), nos últimos seis anos, a balança comercial tinha um superávit de R$ 5 bilhões e caiu para um déficit de R$ 70 bilhões, ou seja, uma perda de R$ 75 bilhões. Resultando uma maior dependência econômica com o aumento da importação de produtos industrializados.

4 – Extraído do jornal Valor Econômico.

5 – A renúncia fiscal de 2011 totaliza mais de R$ 100 bilhões. 10% do PIB de 2011, que defendemos que vá para educação, totalizam R$ 105 bilhões.

6 – “O imperialismo está indissoluvelmente ligado ao capitalismo, e, consequentemente, as tentativas de reformar as bases do imperialismo constituem um desejo ingênuo e recuam em direção a uma adulação servil ao imperialismo dissimulada sob pretensões científicas. Bela lógica, na verdade!”. Lênin, em Imperialismo, fase superior do capitalismo.

Ricardo Senese, Diretor de Ciência e Tecnologia da UNE