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quarta-feira, 24 de abril de 2024

O Banco Mundial e a Saúde no Brasil

No último mês, várias reportagens foram exibidas na imprensa mostrando a falta de estrutura física dos estabelecimentos de saúde vinculados às universidades públicas, bem como a deficiência de profissionais, que reflete a precariedade do ensino dos futuros profissionais de saúde. Com todas as notícias veiculadas, é impossível não trazer novamente a discussão das organizações sociais de saúde (OSS) e suas implicações na vida dos usuários dos serviços públicos de saúde.

Paralelamente à discussão sobre a terceirização, aparece uma nova legislação sobre o gerenciamento dos hospitais universitários: em dezembro do ano passado foi sancionada a Lei nº 12.550, que criou a Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares (Ebserh), entidade de caráter privado responsável pela gerência dos recursos, tanto humanos quanto financeiros, dos hospitais-escola. Trata-se da transferência da responsabilidade de gestão do Estado para entidades privadas, mantendo-se a fonte financiadora governamental. Resumindo, o governo financia os hospitais, mas a administração dos recursos passa para a mão das empresas privadas.

Práticas como essa são cada vez mais frequentes na atual administração pública, retomando as políticas de privatização dos anos 1980 e 90. A terceirização dos serviços é a alternativa dada pelo governo à precarização da gestão pública, primeiro passo rumo à privatização.

Para Nelson de Souza e Silva, professor titular da Faculdade de Medicina da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), tal atitude é explicada através de fatos de um passado recente, baseados no relatório sobre o desenvolvimento mundial de 1993, do Banco Mundial: “A criação dessas organizações sociais para gerir as unidades públicas de saúde do SUS eram parte de um movimento articulado pelo Banco Mundial que pretendia, através da reforma do Estado, implantar um novo sistema de saúde no Brasil. (…) A criação das OSS, a lei dos planos de saúde, a não orçamentação dos hospitais universitários, deixando-os quase que exclusivamente dependentes dos recursos de prestação de serviços, claramente insuficientes para um hospital de ensino, todas essas ações se articulam dentro dessa proposta de modificação do SUS”. E completa: “O interesse do Banco Mundial em saúde fica claro pelo fato de a saúde se constituir em um importante mercado a ser explorado pelo capital”.

Vinculada ao Ministério da Educação, a Ebserh, do mesmo modo que as demais organizações sociais de saúde, por seu caráter privado não se submete à mesma regulação das empresas públicas, dispensando inclusive o processo de licitação para compra de materiais e serviços, apesar de seus recursos serem provenientes da União e da prestação de serviços. Na prática, isso significa possibilidade de favorecimento de fornecedores, o que pode gerar superfaturamento nas compras de materiais hospitalares. Além disso, por se tratar de uma empresa privada, que visa ao lucro, poderá haver restrição de atendimentos gratuitos e diferenciação entre os pacientes do SUS e dos planos de saúde, com favorecimento dos últimos.

Para os profissionais também há modificações. A contratação de trabalhadores se dá de acordo com a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), abrindo possibilidade de contratação por favorecimento, de cunho político e campanhista, além da criação de disparidades salariais entre os diferentes profissionais contratados. Outra prática comum nesse tipo de gerência é a terceirização dos profissionais, que gera, como já observamos em outros setores, a precarização das condições de trabalho e a redução dos benefícios trabalhistas.

Para as Universidades, a Ebserh representa a perda da autonomia para gerenciar seus hospitais-escola, além da quebra da tríade ensino-pesquisa-extensão, já que os serviços hospitalares ficarão a cargo de uma empresa externa, que não será obrigada a financiar pesquisas.

A contratação de empresas privadas para gerência de setores e serviços públicos caracteriza nada mais que a privatização desses serviços, tirando do Estado sua responsabilidade constitucional. Retira dos profissionais de saúde vários direitos conquistados, encerrando-se inclusive a abertura de concursos públicos e restringindo os serviços a contratos temporários. Também retira da população sua participação reguladora, instituída pela Constituição Federal e reforçada nas chamadas leis orgânicas da saúde, exercida principalmente através dos Conselhos de Saúde. Em resumo, trata-se de um retrocesso tanto para a saúde, quanto para a educação.

Ludmila Outtes, Recife

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