A possível venda de 40% da OGX a Lukoil revelaria a fragilidade do controle da política econômica do petróleo no Brasil. O mito do senhor X, o herói financiado com dinheiro do povo, desaba e seus escombros servem de degrau ao avanço dos oligopólios internacionais.
Para entender este fato é preciso analisar o processo histórico sempre renegado no Brasil a condição secundária. Desta forma este texto inicia-se apontando os motivos que levaram a criação da Petrobrás somada à importância do monopólio estatal do petróleo.
O movimento popular que resultou na criação da Petrobras buscava – principalmente – os meios necessários para a auto-suficiência. A dramática situação observada durante a Segunda Guerra Mundial quando o Brasil, então importador de gasolina, ficou praticamente sem combustível levantou a necessidade da rápida exploração do petróleo nacional.
Petróleo este cuja existência em território nacional era conhecida desde o século XIX quando foi concedida, ainda no período monárquico, uma concessão para a exploração na região de Maraú na antiga província da Bahia. Neste caso um cidadão inglês dedicou-se à produção de querosene destinado à iluminação pública.
Sua empreitada não durou muito, tendo em vista o predomínio ideológico liberal que impedia qualquer tipo de medida de proteção à iniciativa nacional sucumbindo a iniciativa em função da concorrência desleal dos produtos importados.
Ao longo do século XX diferentes iniciativas para a criação de empresas nacionais de exploração petrolífera foram realizadas. Todas fracassando diante do poderio dos oligopólios internacionais que criavam diversos obstáculos incluindo a utilização da imprensa para atacar os autores destas iniciativas.
Monteiro Lobato em seu livro O escândalo do petróleo e do ferro denuncia detalhadamente os métodos empregados por estes grupos econômicos internacionais. O próprio Lobato foi alvo de ataques na imprensa que o classificavam de louco a ladrão das economias dos eventuais investidores nas companhias petrolíferas que criou.
A situação mostrava-se ainda mais grave quando verificamos a disputa entre os defensores da nacionalização e aqueles favoráveis a entrega do petróleo aos oligopólios existente no interior do governo chefiado por Getúlio Vargas. Esta disputa, durante os anos de 1930 e inicio da década de 40 acabou por gerar desconfianças quanto aos verdadeiros interesses para a instituição do monopólio do petróleo.
A crise de abastecimento de combustíveis, todavia, obrigou o início de um debate no qual observava-se a fragilidade do capital privado diante do poderio dos oligopólios internacionais.
Simplesmente criar uma empresa de capital aberto para explorar o petróleo brasileiro significava a clara possibilidade de entrega aos oligopólios de mais uma forma de controle da exploração deste mineral diante da possibilidade da compra de ações por parte destes grupos.
A população brasileira sabia deste modo das dificuldades que encontraria para criar uma empresa privada nacional em condições de concorrer com os oligopólios petrolíferos e desta forma iniciou uma campanha cujo resultado foi a fundação da Petrobras.
O monopólio da Petrobras, deste modo, foi criado para vencer as dificuldades observadas desde o século XIX quando, em função da concorrência desleal, o projeto de Maraú acabou derrotado.
A criação da Petrobras possibilitou as bases para o rompimento com o modelo colonial, apresentando as condições econômicas básicas para o desenvolvimento industrial.
Lamentavelmente estes princípios fundadores da Petrobras foram abandonados. Em 1997 a Lei 9478 extinguiu o monopólio instituindo a prática dos leilões, entendendo estes como “modernização” e permitindo a presença dos oligopólios no processo de exploração do petróleo.
Para possibilitar a entrega total do petróleo brasileiro permitiu-se ainda a venda de ações ordinárias aos grupos internacionais. A velha prática retornava.
Seguindo o processo de entrega do petróleo brasileiro e a consequente manutenção do modelo colonial, a Agencia Nacional do Petróleo, Gás Natural e Bicombustíveis (ANP) anuncia para o mês de maio o leilão de 289 blocos ao longo de 155 mil quilômetros quadrados.
Vejam a crueldade deste fato. Este modelo de administração do petróleo – exatamente este – foi derrotado em 1953 quando o povo brasileiro, através da vitória da campanha O petróleo é nosso, sepultou o modelo proposto no governo do presidente Dutra denominado Estatuto do Petróleo. Durante 50 anos os oligopólios esperaram até retornarem com suas práticas de sempre.
Festejam ainda os oligopólios a ampliação das privatizações, agora elegantemente tratadas por concessões, motivando declarações de alegria conforme observa-se na entrevista do presidente da Bunge – gigante do agronegócio mundial – ao Financial Times: “Estamos começando a ver os incentivos agora; [no Brasil] há um monte de privatizações, especialmente em portos, ferrovias, logística.”
Enquanto isso a ANP divulga as empresas petrolíferas habilitadas para o leilão. A primeira da lista seria o orgulho do capital nacional, a OGX Petróleo e Gás S/A. Pouco depois de receber esta autorização, o senhor Eike Batista, presidente do grupo, passou a correr o mundo e anunciar a venda de 40% de sua parte à empresa russa Lukoil. Esta, por sua vez, apresenta como proprietária de 20% de seu capital a Conoco Philips, dos Estados Unidos.
A Conoco Philips, de forma individual, também encontra-se habilitada a participar do leilão de entrega do petróleo brasileiro. Vai concorrer, concretizando-se a negociação, graças ao patrocínio do dinheiro do povo brasileiro entregue a OGX, em condições de vantagem.
Wladmir Coelho, MG