Presos políticos no Rio: MP quer usar movimentos como bodes espiatórios

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Militantes de direitos humanos tiveram acesso ao documento vazado à imprensa pelo Ministério Público do Rio de Janeiro, que pede a prisão de 19 ativistas e mantem presos outros 2. É um documento de elevada importância para entender a atual escalada repressiva aos movimentos sociais, e todos os militantes devem se esforçar para conhecer. (documento reproduzido na íntegra abaixo)

Fica claro que o inquérito policial 218-01646/2013, utilizado pelo Ministério Público para embasar suas acusações, mobilizou uma enorme quantidade de agentes e recursos públicos para vigiar, fazer escutas telefônicas e, inclusive, infiltrar informantes no seio de várias organizações sociais.

Os ativistas que tiveram mandato de prisão emitido estão sendo acusados de formação de quadrilha armada, organização de atentados e depredação de patrimônio. Entre os presos políticos está a advogada Eloísa Samy, que se encontra refugiada na embaixada do Uruguai e pediu asilo político para aquele país.

O objetivo dos governos estadual e federal é isolar determinadas organizações com o objetivo de intimidar todos os ativistas sociais e, assim, criminalizar o protesto, a luta por direitos e colocar na defensiva todo o movimento social. É preciso conformar uma unidade popular contra todos os perseguidos políticos em todos os estados do país.

Da redação

Reproduzimos abaixo a íntegra da denúncia do Ministério Público do Rio de Janeiro:

Exmo. Sr. Dr. Juiz de Direito da 27ª Vara Criminal da Comarca da Capital 

Ref. Inquérito Policial Nº 218-01646/2013

O Ministério Público de Estado do Rio de Janeiro, por intermédio do Promotor de Justiça que esta subscreve no exercício de suas atribuições legais vem oferecer

DENÚNCIA

em face de:

1. ELISA DE QUADROS PINTO SANZI, vulgo “SININHO”, qualificada à fl. 758;
2. LUIZ CARLOS RENDEIRO JUNIOR, vulgo “GAME OVER”, qualificado à fl. 215;
3. GABRIEL DA SILVA MARINHO, qualificado à fl. 1517;
4. KARLAYNE MORAES DA SILVA PINHEIRO, vulgo “MOA”, qualificada à fl. 1408;
5. ELOISA SAMY SANTIAGO, qualificada à fl. 679;
6. IGOR MENDES DA SILVA, qualificado à fl.1055;
7. CAMILA APARECIDA RODRIGUES JOURDAN, qualificada à fl. 1310;
8. IGOR PEREIRA D’ICARAHY, qualificado à fl. 1517;
9. DREAN MORAES DE MOURA CORRÊA, vulgo “DR”, qualificado à fl. 1072;
10. SHIRLENE FEITOZA DA FONSECA,qualificada à fl. 1058;
11. LEONARDO FORTINI BARONI PEREIRA, qualificado à fl. 1060;
12. EMERSON RAPHAEL OLIVEIRA DA FONSECA,qualificado à fl. 1331;
13. RAFAEL RÊGO BARROS CARUSO, qualificado à fl. 1436;
14. FILIPE PROENÇA DE CARVALHO MORAES, vulgo “RATÃO”,qualificado à fl. 1064;
15. PEDRO GUILHERME MASCARENHAS FREIRE, qualificado à fl. 1065;
16. FELIPE FRIEB DE CARVALHO, qualificado à fl. 1067;
17. PEDRO BRANDÃO MAIA, vulgo “PEDRO PUNK”, qualificado à fl. 1077;
18. BRUNO DE SOUSA VIEIRA MACHADO,qualificado à fl.1068;
19. ANDRÉ DE CASTRO SANCHEZ BASSERES, 
20. JOSEANE MARIA ARAUJO DE FREITAS, qualificado à fl. 1458;
21. REBECA MARTINS DE SOUZA, qualificada à fl. 1618;
22. FABIO RAPOSO BARBOSA, qualificado à fl. 261;
23. CAIO SILVA RANGEL, qualificado à fl. 260;

Pela prática das seguintes condutas delituosas:

Em período iniciado após o mês de junho de 2013 e que estendeu-se até o presente momento, os denunciados, de forma livre e consciente, associaram-se com a finalidade de praticar no contexto das manifestações populares iniciadas no primeiro momento, crimes diversos, notadamente os seguintes: 

– Danos, tanto na modalidade básica quanto na qualificada de que tratam os incisos II, III e IV do Parágrafo Único do art. 163 do Código Penal, consubstanciado pelas condutas de depredar o patrimônio privado – agências bancárias, lojas e veículos – e público ou de concessionárias de serviços públicos, com a destruição de pontos do mobiliário urbano e incêndio de ônibus;

– Resistência (arts. 329 do Código Penal, incidindo), notadamente com a utilização de violência contra a pessoa, tal como o arremesso de pedras e de artefatos incendiários tendo como alvo, principalmente, policiais militares e outros agentes de segurança pública; 

– Lesões corporais, consumadas e tentadas, na forma do caput e dos parágrafos do art. 129 do Código Penal, em geral decorrentes dos atos de resistência à atuação da polícia;

– Posse de artefatos explosivos, notadamente bombas de fabricação artesanal,como a apreendida sob a posse da denunciada Camila Jourdan (fl. 1731/1733);

– Corrupção de menores, consistente em incentivar a participação de adolescentes nas condutas acima descritas;

A referida associação não foi estabelecida instantaneamente entre todos os indiciados, tendo sido formada pela agregação sucessiva de membros, na forma que será abaixo descrita. 

Como é de conhecimento geral, no mês de junho de 2013 inaugurou-se uma onda de manifestações populares por todo o país, originalmente pacíficas e com grande adesão popular.

Com o decurso do tempo e a intensificação dos protestos, começou a ser identificada a atuação de indivíduos que adotavam tática denominada blackbloc, ou bloco negro, consistente na utilização de armaduras e armas improvisadas, sob o pretexto inicial de funcionarem como força de defesa dos manifestantes contra eventual violência excessiva, utilizada por parte das forças policiais na repressão dos protestos. 

Além da alegada intenção de defesa, faz parte do modo de atuação de tais grupos a ação visando causar danos a estabelecimentos que consideram simbolizar o capitalismo e seus valores, como, por exemplo, agências bancárias.

No curso da investigação puderam ser identificados diversos grupos, cujos objetivos declarados seriam lícitos – organização de protestos e difusão de idéias que contestam o status quo vigente – mas que conteriam indivíduos cuja atuação seria dirigida, de fato, para a prática de atos violentos e de confronto.

Dentre os grupos que originalmente existiam, podem ser identificados os seguintes: Organização Anarquista Terra e Liberdade (OATL), Movimento Estudantil Popular Revolucionário (MEPR), Frente Internacionalista dos Sem Tetos (FIST), Rede Estudantil Classista e Combativa (RECC), Movimento Feminino Popular (MFP), “ALDEIA MARACANÔ, Movimento de Resistência Popular (MRP), Rede de Comunidades e Movimentos Contra Violência, “OCUPA CABRAL”, “ANONYMOUS RIO”, Unidade Vermelha (UV), Comitê de Apoio ao Jornal A Nova Democracia – RJ e Coletivo Inimigos do Rei (UERJ).

Com a intensificação das manifestações e com o início das chamadas ocupações, passou a ser tentada uma unificação dos grupos, tendo havido a criação da chamada Frente Independente Popular (FIP), cujo objetivo seria a definição de uma linha de atuação para os diversos grupos e indivíduos envolvidos na realização de protestos.

Até tal momento não se pode identificar a prática de qualquer ilícito penal – a realização de protestos e a reivindicação popular direta são atos que inserem-se no constitucionalmente assegurado direito à livre manifestação do pensamento.

Ocorre que a chamada FIP era gerida através de dois tipos de reunião: as públicas, realizadas através de assembleias a todos abertas e outras de natureza fechada, das quais somente participavam as lideranças. Nestas reuniões fechadas estabeleceu-se que o protesto pacífico não seria meio hábil ao alcance dos objetivos dos grupos, tendo sido, então, definido que deveria ser incentivada a prática de ações violentas no momento das manifestações, tais como a depredação de bancos, de estabelecimentos comerciais e o ataque a ônibus e viaturas policiais.

A denunciada ELISA DE QUADROS PINTO SANZI, pode ser identificada como uma das principais lideranças da FIP, juntamente com os denunciados IGOR MENDES DA SILVA, LEONARDO FORTINI BARONI PEREIRA, EMERSON RAPHAEL OLIVEIRA DA FONSECA, CAMILA APARECIDA RODRIGUES JOURDAN, FELIPE PROENÇA DE CARVALHO MORAES, LUIZ CARLOS RENDEIRO JUNIOR e DREAN MORAES DE MOURA CORRÊA, vulgo “DR”), sendo responsáveis pela decisão de incitar os ocupantes do movimento Ocupa Câmara (iniciado no mês de agosto 2013) a promoverem a queima de um ônibus, o que foi feito após a realização de uma das reuniões fechadas da frente.

Também durante tal ocupação, Elisa Sanzi foi vista comandando manifestantes no sentido de carregarem três galões de gasolina para a Câmara Municipal, passando a incitar os demais manifestantes a incendiar o prédio, objetivo não alcançado em razão da intervenção de outros participantes dos atos, fatos apontados no depoimento da testemunha XXXXXXXXX.

Em continuidade às atividades, a FIP passou a atuar em duas frentes,uma delas operacional, dedicada a organizar as ações violentas, incentivando sua prática quando da realização de manifestações e fornecendo os meios de ação. A outra frente dedicava-se à comunicação e a propaganda, destinadas a dar publicidade às decisões e às ações planejadas, bem como cooptar de novos integrantes. 

Note-se que, dada a estrutura pulverizada da organização, não é possível estabelecer, por muitas vezes, o liame entre integrantes de diversos subgrupos – que podem sequer se conhecer. A existência, todavia, de um comando centralizado e a convergência de desígnios existente entre os integrantes das diversas estruturas orgânicas permite o reconhecimento da associação entre todos, ainda que de forma compartimentalizada, passando-se, a seguir, a especificar a conduta dos denunciados e a estrutura dos grupos.

Há que se considerar, ainda, que o só fato de pertencer um indivíduo a um dos grupos acima arrolados não é suficiente a caracterizar a responsabilidade pelos fatos de que ora se trata, posto não ser o planejamento – e a posterior prática – das ações violentas efetuado de forma aberta e acessível a todos os membros e simpatizantes. Ao contrário, trata-se de atividade restrita a uma parcela dos integrantes, os quais serão a seguir apontados. 

Os denunciados FILIPE PROENÇA DE CARVALHO MORAES, CAMILA APARECIDA RODRIGUES JOURDAN e PEDRO GUILHERME MASCARENHAS FREIRE desempenham função de direção na OATL(Organização Anarquista Terra e Liberdade), reportando-se diretamente à direção da FIP. 

As atribuições de tal grupo incluem o planejamento dos atos violentos, bem como a preparação do material ofensivo a ser utilizado nos confrontos: coquetéis molotov, artefatos explosivos, além de fogos de artifício alterados para adquirirem potencial lesivo, como, por exemplo, com a colocação de pregos em morteiros, posteriormente disparados em direção aos agentes de segurança pública.

Os denunciados FELIPE FRIEB DE CARVALHO, PEDRO BRANDÃO MAIA (Pedro Punk), BRUNO DE SOUSA VIEIRA MACHADO, ANDRÉ DE CASTRO SANCHEZ BASSERES e JOSEANE MARIA ARAUJO DE FREITAS eram incumbidos de efetuar a distribuição de tal material, bem como utiliza-lo diretamente na agressão de policiais, muitas vezes disparando artefatos de dentro de veículos e fugindo em seguida. 

Foi, ainda, identificada a participação da denunciada REBECA MARTINS DE SOUZA em atos de tal natureza, cedendo um veículo de sua propriedade para ser utilizado em tais ocasiões.

Cabe, ainda, aos integrantes de tal grupo a incitação e a prática de atos de depredação do patrimônio público e privado.

As escutas telefônicas autorizadas pelo Juízo, permitiram acompanhar a preparação de tais atos, notadamente a participação da denunciada Camila Jourdan na elaboração dos artefatos e em sua posterior disponibilização aos Black Blocs.

O Movimento Estudantil Popular Revolucionário (MEPR) tem como seus integrantes os denunciados IGOR MENDES DA SILVA, RAFAEL REGO BARROS CARUSO, LEONARDO FORTINI BARONI PEREIRA, EMERSON RAPHAEL OLIVEIRA DA FONSECA, SHIRLENE FEITOZA DA FONSECA e a adolescente XXXXX.

Estes membros participam da coordenação da FIP e, ainda, diretamente da prática de atos de agressão e vandalismo.

Dos grupos que integram a FIP, foi apurado que o MERP é o que apresenta perfil mais violento, dedicando-se a promover o confronto com as forças de segurança.

A organização dos eventos é feita na forma acima descritas, sendo que, na concretização dos atos, participam os indivíduos adeptos da tática blackbloc que, sob a direção e influência dos mentores intelectuais, praticam, diretamente os atos de violência contra pessoas e coisas.

Dentre estes destaca-se a atuação dos denunciados GABRIEL DA SILVA MARINHO, DREAN MORAES DE MOURA CORRÊA, vulgo “DR”, KARLAYNE MORAES DA SILVA PINHEIRO, vulgo “MOA”, LUIZ CARLOS RENDEIRO JUNIOR, vulgo “GAME OVER”, os quais, além de praticarem diretamente as condutas criminosas acima descritas, também praticam atividades de organização. 

Identificada, ainda, a participação do então adolescente XXXXXX, conhecido como XXXXX, que demonstrava comportamento extremamente violento, constando nos autos que teria afirmado ter a intenção de matar um policial nos protestos contra a copa.

Gabriel da Silva Marinho tinha, dentre outras, a incumbência de atirar coquetéis molotov, que eram fabricados por ele e por sua namorada, Karlayne, vulgo Moa, para uso próprio e também fornecimento a outros integrantes do grupo.

O denunciado IGOR PEREIRA D’ICARAHY, namorado de Camila Jourdan, também participava da organização das atividades do grupo, auxiliando no transporte do material ofensivo a ser utilizado nas manifestações e informando aos demais sobre a movimentação das forças de segurança, dentre outras atividades. É, ainda, apontado como participante dos atos de violência realizados em manifestações.

A denunciada ELOÍSA SAMY SANTIAGO, advogada, inicialmente juntou-se aos demais no exercício de sua atividade, tendo, após, desvirtuado sua conduta e passado a participar ativamente dos atos violentos, inclusive passando instruções aos ocasionais participantes, tendo sido vista ordenando o início de atos de violência. Além disso, escudando-se em um suposto exercício da atividade profissional, presta apoio logístico, inclusive cedendo sua residência para reuniões.

O denunciado FABIO RAPOSO BARBOSA, participava das deliberações da FIP, tendo seu nome sido cogitado por Elisa Sanzi para assumir a posição originalmente ocupada por Luiz Carlos Rendeiro Júnior. Tinha, ainda, atuação no fornecimento de artefatos explosivos e com potencial ofensivo aos Black Blocs, tendo sido co-autor do homicídio que vitimou o cinegrafista Santiago Ilídio de Andrade.

O denunciado CAIO SILVA RANGEL era participante habitual dos grupos Black Blocs, tendo sido autor do homicídio acima referido. 

A associação criminosa utilizava-se de armas próprias – como facas, explosivos, estilingues, rojões alterados para disparar pregos – e impróprias, como porretes.

Além disto, desta participavam adolescentes, como XXXXXX e XXXXXX, que praticavam diretamente os atos criminosos, sendo do conhecimento dos denunciados a circunstâncias de serem menores de 18 anos.

Por derradeiro, consigne-se que as condutas acima foram praticadas pelos denunciados de forma livre e consciente, não militando em seu favor qualquer circunstância justificante ou exculpante.

Assim agindo, estão os denunciados incursos nas sanções do art. 288, Parágrafo Único do Código Penal.

Pelo exposto, requer o Ministério Público:

a ) O recebimento da presente, com a conseqüente citação dos réus para que, desejando, apresentem defesa, sob pena de revelia;

b) Seja a presente, ao final da instrução criminal, julgada procedente, condenando-se os réus às penas do dispositivo legal acima invocado.

c) A intimação/requisição das pessoas abaixo arroladas, para, em Juízo, serem ouvidas, por imprescindíveis à elucidação da verdade:

XXXXXXXX

Ref. Inquérito Policial Nº 218-01646/2013

MM. Dr. Juiz

1 – Segue denúncia em separado, imputado a prática do delito tipificado no art. 288, Parágrafo Único do Código Penal aos indiciados ELISA DE QUADROS PINTO SANZI, LUIZ CARLOS RENDEIRO JUNIOR, GABRIEL DA SILVA MARINHO, KARLAYNE MORAES DA SILVA PINHEIRO, ELOISA SAMY SANTIAGO, IGOR MENDES DA SILVA, CAMILA APARECIDA RODRIGUES JOURDAN, IGOR PEREIRA D’ICARAHY, DREAN MORAES DE MOURA CORRÊA, SHIRLENE FEITOZA DA FONSECA, LEONARDO FORTINI BARONI PEREIRA, EMERSON RAPHAEL OLIVEIRA DA FONSECA, RAFAEL RÊGO BARROS CARUSO, FILIPE PROENÇA DE CARVALHO MORAES, PEDRO GUILHERME MASCARENHAS FREIRE, FELIPE FRIEB DE CARVALHO, PEDRO BRANDÃO MAIA, vulgo “PEDRO PUNK”, BRUNO DE SOUSA VIEIRA MACHADO, ANDRÉ DE CASTRO SANCHEZ BASSERES, JOSEANE MARIA ARAUJO DE FREITAS, REBECA MARTINS DE SOUZA, FABIO RAPOSO BARBOSA e CAIO SILVA RANGEL;

2 – Deixa o Ministério Público de incluir na denúncia os indiciados LUIZA DREYER DE SOUZA RODRIGUES, GERUSA LOPES DINIZ, RICARDO EGOAVIL CALDERON, vulgo “KARYU”, TIAGO TEIXEIRA NEVES DA ROCHA e EDUARDA OLIVEIRA CASTRO DE SOUZA por entender que não existem nos autos elementos seguros no sentido de atestar sua participação na incitação da prática de condutas criminosas ou, de qualquer modo, na prática direta de tais condutas.

O objeto da investigação que embasa a denúncia é a identificação dos responsáveis pela incitação e prática de atos de vandalismo e de agressões contra policiais, condutas estas que são iniciadas, por incentivo e planejamento dos denunciados quando da realização de atos legítimos reivindicação.

As lideranças violentas, aproveitando-se do natural clima de tensão que há em tais atos, insuflam os participantes contra a polícia – independente da existência de ação abusiva por parte desta – instigando-os ainda, à prática de atos de destruição do patrimônio de empresas, notadamente bancos, e do mobiliário público, sob o pretexto de se estarem atacando símbolos do status quo.

Assim como nem todos os participantes das manifestações, ainda que insuflados, participam dos atos violentos, também não se pode imputar indiscriminadamente a todas as lideranças dos movimentos populares a responsabilidade pela escalada da violência. Ainda que se exerça posição de liderança quanto aos grupos e ainda que haja risco de que os protestos descambem para a violência, não se pode, sem elementos concretos, responsabilizar os organizadores, sob pena de se cruzar a linha que separa a repressão do crime da repressão política. 

No caso dos indiciados referidos no ítem1, resta claramente caracterizada nos autos a organização e prática das atividades criminosas, o que não ocorre, todavia, em relação a Luiza Dreyer, Gerusa Lopes, Ricardo Egoavil, Tiago Rocha e Eduardo Souza.

Quanto a Luiza, é fato que esta participava ativamente das manifestações e de sua organização, inclusive dialogando com alguns dos denunciados. Não há, todavia, elemento que permita liga-la diretamente à prática dos atos descritos na denúncia, ao menos no estado que a investigação se encontra.

No que toca aos demais, verifica-se que eram administradores da página Anonymous Rio, mantida no facebook. Embora, de fato, tal página se preste á divulgação das manifestações, não se pode apurar, concretamente, o incentivo à prática de ilícitos.

Note-se que nem mesmo eventual menção à indumentária a ser utilizada – o preto – pode ser interpretada como incentivo à violência, haja visto que mesmo no que se convencionou chamar estratégia blackbloc há uma diversidade de objetivos. Se de um lado não se pode tolerar, sob qualquer pretexto, o ataque direto às vidas de policiais e ao patrimônio público e privado, tampouco se pode afirmar a ilegitimidade da preparação para resistir a um eventual uso excessivo da força por parte dos agentes do Estado, fato este que, como é de conhecimento, já ocorreu.

De toda sorte, não havendo elemento que permita imputar a tais indiciados o incentivo direto à prática de crimes, deixa o Ministério Público de incluí-los na denúncia.

Esclarece, todavia, que tal omissão não importa em pedido de arquivamento de qualquer natureza, eis que, ainda que se haja encerrado a maior parte da investigação, ainda se encontram pendentes a realização de algumas diligências que, se não prejudicam o oferecimento de denúncia em face da maioria dos indiciados, podem fornecer elementos que permitam identificar outros participantes ou alterar fundamentalmente o quadro probatório em relação aos indiciados de que ora se trata.

Assim, requer o Ministério Público a extração de cópias do relatório da autoridade policial, bem como de fls. 764/764, 851/912, 963/965 e 1044/1094 do apenso, para remessa à DRCI, visando o prosseguimento das investigações em relação aos indiciados ainda não identificados.

3 – Em diligências, requer o Ministério Público:

– Venha aos autos o laudo pericial dos dispositivos de processamento e armazenamento de dados apreendidos;

– Seja determinada a busca e apreensão dos dados já requisitados ao Facebook, que até o momento ignorou a ordem judicial, sem prejuízo responsabilidade penal de seus administradores por desobediência;

– A remessa de cópias dos laudos e das informações obtidas à DRCI, para instruir o procedimento a ser originado pelo pleito anterior;

4 – Quanto à representação pela prisão preventiva dos indiciados, entende o Ministério Público deva esta ser acolhida no que toca aos que foram denunciados.

Consoante se verifica dos autos, tratam-se de indivíduos com forte atuação na organização e prática dos atos de violência em manifestações populares, havendo nos autos indícios claros de que, em liberdade, voltarão à prática de atos de tal natureza. A custódia cautelar é, pois, necessária a assegurar a ordem pública.

Verifica-se haver relacionamento estreito entre os denunciados e algumas das testemunhas, sendo que os depoimentos de XXXXXXX e XXXXXXX fazem menção à atuação no sentido de tentar controlar o que estes iriam dizer quando inquiridos em sede policial.

Assim sendo, opina o Ministério Público no sentido da decretação da prisão preventiva de ELISA DE QUADROS PINTO SANZI,

LUIZ CARLOS RENDEIRO JUNIOR,

GABRIEL DA SILVA MARINHO,

KARLAYNE MORAES DA SILVA PINHEIRO,

ELOISA SAMY SANTIAGO,

IGOR MENDES DA SILVA,

CAMILA APARECIDA RODRIGUES JOURDAN,

 IGOR PEREIRA D’ICARAHY,

DREAN MORAES DE MOURA CORRÊA,

SHIRLENE FEITOZA DA FONSECA,

LEONARDO FORTINI BARONI PEREIRA,

EMERSON RAPHAEL OLIVEIRA DA FONSECA,

RAFAEL RÊGO BARROS CARUSO,

FILIPE PROENÇA DE CARVALHO MORAES,

PEDRO GUILHERME MASCARENHAS FREIRE,

FELIPE FRIEB DE CARVALHO,

PEDRO BRANDÃO MAIA,

 BRUNO DE SOUSA VIEIRA MACHADO,

ANDRÉ DE CASTRO SANCHEZ BASSERES,

JOSEANE MARIA ARAUJO DE FREITAS,

 REBECA MARTINS DE SOUZA

5 – Quanto aos indiciados LUIZA DREYER DE SOUZA RODRIGUES, GERUSA LOPES DINIZ, RICARDO EGOAVIL CALDERON, vulgo “KARYU”, TIAGO TEIXEIRA NEVES DA ROCHA e EDUARDA OLIVEIRA CASTRO DE SOUZA, considerando que não lhes é imputada a prática de conduta delituosa na denúncia, opina contrariamente á decretação de sua prisão preventiva, requerendo, ainda, a revogação da prisão temporária decretada, nos casos em que ainda se encontre em vigor a Decisão.

Pede Deferimento

Rio de Janeiro, 18 de julho de 2014

Luís Otávio Figueira Lopes
Promotor de Justiça