Em 2014, o jornal mais conhecido do Rio Grande do Sul, Zero Hora, completa 50 anos, os mesmos 50 anos do início da Ditadura Militar brasileira. Coincidência? Não. E quando lemos sua primeira edição não restam dúvidas sobre o tipo de relação existente entre ZH e o regime.
Na capa de seu primeiro número, o jornal se identifica como independente e democrático, sem vínculos ou compromissos políticos. Afirma ter como objetivo servir ao povo, defender seus direitos e reivindicações. Apenas um mês após o golpe, porém, a publicação tenta justificar a quebra de direitos imposta pela ditadura. Na reportagem da página 4, intitulada “Pedida suspensão dos direitos políticos dos ex-ministros de Jango”, comemora o expurgo de policiais contrários à ditadura e a prisão de todos secretários de Estado do Rio de Janeiro que apoiavam João Goulart. Ainda declara que os ministros de Jango são acusados de participar de atividades contrárias ao regime democrático, e repudia as reformas sociais que Jango começava a instalar no País.
Hoje sabemos que o discurso utilizado pelo ZH condizia com o discurso militar, sendo um dos principais veículos voltados a enganar o povo, fantasiando o golpe de avanço para os brasileiros. Ainda cumpriu o papel de distorcer por completo ideologias de esquerda como o marxismo, chamando os militantes desta teoria de terroristas e ditadores, com o objetivo de fazer a população repudiá-los. Na verdade, os marxistas estavam do lado da luta para que fosse aprofundada a democracia no Brasil
Ano passado, com o retorno de lutas populares nas manifestações de rua,foi flagrante o poder que o jornal tem. No mês de junho, quando as passeatas caminharam rumo à Avenida Ipiranga com a intenção de protestar em frente à sede da Zero Hora (Grupo RBS), grande contingente da Brigada Militar já estava lá, armada, dispersando os manifestantes com muitas bombas de gás lacrimogêneo e cumprindo ordem para que nada acontecesse ao prédio.
Fica a prova de que os órgãos de “segurança” apenas defendem as grandes empresas e só obedecem a seus desmandos de poder, enquanto o povo é ignorado. Não foi por conta própria que a Brigada foi defender a tão amada sede do seu jornal favorito. Cumpriu ordens de quem realmente comanda o Estado, os grandes empresários, que foram os principais questionados nos protestos, já que controlam o transporte “público” no País, seu preço e sua qualidade.
A influência do grupo RBS, afiliado à Rede Globo, sobre o povo gaúcho também acontece nas eleições. O primeiro caso conhecido foi o do antes comentarista, apresentador e diretor de telecomunicação Antônio Britto (PMDB). Eleito, em 1994, governador do Rio Grande do Sul, Britto iniciou um intenso processo de privatização. Diminuiu o patrimônio público dos gaúchos, vendendo boa parte do Estado para multinacionais. Passaram-se anos de grande indignação por parte da população a esse tipo de política neoliberal, mas, por conta dessa mídia manipuladora, nunca conseguimos ter as condições de intervir como autores da nossa política.
Nas eleições de 2006, caímos no mesmo buraco: outra ex-funcionária da RBS, Yeda Crusius (PSDB), foi eleita governadora do Estado. De comentarista do telejornal noturno para porta-voz das grandes empresas. Com uma gestão conhecida por tratar os movimentos sociais como criminosos. Repetiu a política de Britto.
Outros políticos foram eleitos com as mesmas características. Saem da imprensa com sua candidatura, usando sua fama para arrecadar patrocinadores. São os casos de Mendes Ribeiro (PMDB), Sérgio Zambiazi (PTB), Paulo Borges (DEM), etc.
Nestas eleições, o histórico se repete: Lasier Martins (PDT), comentarista do Jornal do Almoço, da RBS, quer repetir o que, há quatro anos, aconteceu com Ana Amélia Lemos (PP). Sai dos comentários da TV com a defesa mais escancarada do agronegócio e vai direto para a campanha ao Senado cheio de coronéis nas suas costas. Para sua eleição ao Senado, em 2010, a ex-repórter Ana Amélia, que hoje se candidata a governadora, teve um total de 82% do financiamento de campanha ligado a doações de empresas privadas, segundo o sítio Donos do Congresso. E não será diferente neste ano, na candidatura ao Senado de Lasier.
Com financiamentos gigantescos, rostos conhecidos da televisão e discursos enganadores, dão passos largos para praticarem a política reacionária de criminalização dos movimentos sociais e privilégios da burguesia. A afirmação: não existe mais direita e esquerda – utilizada pelos dois – vem comprovar a tentativa de subestimar a inteligência da população.
Tanto na ditadura, nas manifestações de rua e nas eleições, o papel da nossa mídia hoje é defender a manutenção da ordem, a despolitização do povo, o lucro dos patrões (que financiam os seus jornais, rádios e TVs) e todos os candidatos que façam o mesmo. É o que Lasier Martins, Ana Amélia e o Grupo RBS realmente deveriam assumir, assim como a Rede Globo e seu candidato a presidente, Aécio Neves (PSDB).
Emiliano Zuchetti, Porto Alegre