As comunidades da região da Izidora, formada pelas ocupações Vitória, Rosa Leão e Esperança, localizadas na divisa entre os municípios de Belo Horizonte (região norte da cidade) e Santa Luzia (região metropolitana), em Minas Gerais, reúnem mais de oito mil famílias sem teto, com aproximadamente 30 mil pessoas, e estão ameaçadas de despejo forçado. “É o maior conflito urbano da América Latina e o sétimo maior conflito fundiário do mundo”, nas palavras do Tribunal Internacional de Despejos – órgão internacional que é, na prática, um tribunal de opinião realizado por organizações da sociedade civil por ocasião das Jornadas Mundiais Despejos Zero.
As comunidades nasceram em 2013 e hoje se encontram em processo de consolidação com mais de cinco mil casas de alvenaria construídas. Com o apoio e assessoria técnica de arquitetos, engenheiros, professores universitários, geógrafos e geólogos, foram formados três bairros com traçado de ruas segundo padrões urbanísticos, inclusive rede de esgoto alternativo. Por estarem em área de ocupação, as casas não têm acesso à rede regular de água, esgoto ou energia elétrica. As famílias pobres que ali residem usaram o Fundo de Garantia, fizeram pequenos empréstimos, ou compraram o material a crédito, tudo para realizarem o sonho da casa própria, sonho negado pelas políticas de habitação de seguidos governos.
É grande o número de crianças na comunidade, mas boa parte delas é excluída de utilizar as escolas, creches e postos de saúde públicos. Da mesma forma, aos idosos e mulheres é negado o acesso aos serviços básicos prestados pelo Estado ou Prefeitura.
Reintegração de posse
No dia 28 de setembro deste ano, numa decisão extremamente arbitrária por 18 votos a 1, o Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais autorizou o uso da força por parte da polícia para realizar o despejo forçado das milhares de famílias que residem nas comunidades da Izidora, contrariando a posição do Superior Tribunal de Justiça que, desde setembro de 2015, considera ilegal despejos que violem os direitos humanos básicos.
Apesar da gravidade do fato e o potencial do despejo a ser realizado pela PM resultar em um massacre de pessoas, a decisão do TJ/MG sequer questionou as providências mínimas de cadastramento e realocação das famílias, que caberia à Prefeitura de Belo Horizonte e ao Estado.
Após um grande esforço das coordenações das ocupações das comunidades da Izidora e de movimentos sociais (Comissão Pastoral da Terra, Brigadas Populares e Movimento de Luta nos Bairros, Vilas e Favelas) e uma ampla rede de apoio, que conta com representantes da Igreja Católica, de outras igrejas e religiões, universidades, advogados, jornalistas, etc., as negociações foram retomadas no último dia 18 de outubro.
Foi definido que haverá o cadastramento socioeconômico das famílias pelo Governo de Minas Gerais em conjunto com as coordenações, movimentos sociais e demais interessados, e que haverá reuniões semanais para tratar dos demais detalhes da negociação. Foi criada, para isso, uma Câmara Setorial do Cadastro. Ficou também acertado que representantes do Governo de Minas Gerais farão uma visita às comunidades em data a ser definida. Infelizmente, mais uma vez, o prefeito Márcio Lacerda não mandou nenhum representante, mostrando sua intransigência e indisposição ao diálogo com o povo.
Apesar da reabertura de negociações, o governador Fernando Pimentel não recebeu, nem uma única vez, a Comissão das Ocupações Urbanas, que representam mais de 50 mil famílias. Outra questão é que não está afastada nenhuma hipótese de despejo, já que o mandado de despejo não está suspenso.
Lutar e resistir
As oito mil famílias não têm para onde ir. Não receberam nenhuma garantia concreta do poder público e não há uma negociação séria em curso. Nestas comunidades encontram-se tudo que estas pessoas conseguiram na vida e por isso elas estão dispostas a resistir ao violento despejo; preferem morrer na luta.
Na última semana, aconteceram duas audiências públicas, uma em Brasília e outra em Belo Horizonte, e nenhum representante do poder público compareceu. Entretanto, entre as duas audiências, foram realizados os despejos de duas ocupações urbanas no interior de Minas Gerais, nas cidades de Montes Claros e Campo Florido, no dia 20 de outubro. A ação sempre violenta da Polícia Militar, se não for barrada, vai gerar um grande derramamento de sangue, um massacre de proporções inimagináveis. O governador de Minas Gerais, o prefeito de Belo Horizonte, o Ministério Público, a Defensoria Pública, o Poder Judiciário e todas as autoridades que têm responsabilidade pela solução deste gravíssimo conflito urbano responderão também pelas consequências do que vier a acontecer.
Diante de tamanho conflito, as famílias das ocupações da Izidora clamam por uma solução justa e avisam que vão resistir. “O que queremos mesmo é que garantam a urbanização de nossas comunidades. A Izidora já é um grande bairro popular e o que o Estado deve fazer é respeitar o direito das famílias de morar, de permanecer no local, de continuar reconstruindo suas vidas, de ter moradia digna. Como não há alternativa, somente nos resta resistir”, declarou Charlene Cristiane, coordenadora da ocupação Rosa Leão.
Redação Minas Gerais