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terça-feira, 23 de abril de 2024

Mulheres de Campinas contra o machismo

CAMPINAS

Na noite do último dia 05 de janeiro, cerca de 1.500 pessoas foram às ruas de Campinas, interior de São Paulo, em defesa dos direitos das mulheres e em combate ao machismo e à misoginia. A manifestação, organizada por mais de 40 coletivos, foi motivada pela chacina ocorrida na cidade na noite da virada do ano, quando Sidnei Ramis de Araújo, 46 anos, matou a ex-esposa, Isamara Filier, de 41 anos, o próprio filho, João Victor, de 8 anos, e mais dez pessoas da mesma família – entre elas, oito mulheres.

O ato marchou pelas ruas do centro de cidade entoando palavras de ordem como “Quem ama / Não mata / Não humilha / Não maltrata” e “Vivas nos queremos”, chamando a atenção de quem transitava na região. Através de cartazes e intervenções, as manifestantes demonstraram solidariedade à família de Isamara e também lembraram dados sobre o feminicídio no país, denunciando que, entre 83 países, o Brasil ocupa a 5ª posição no ranking de homicídio de mulheres.

Ao fim da manifestação, nomes de dezenas de mulheres que foram assassinadas apenas nos primeiros cinco dias do 2017 em todo o país, vítimas de feminicídio, foram lembrados em uma homenagem emocionante.

O crime aconteceu em plena noite de réveillon. A família de Isamara estava reunida na casa de um dos seus parentes. Sidnei, armado com uma pistola, dois carregadores e dez bombas caseiras, pulou o muro da residência e entrou na casa atirando em todos, matando doze pessoas (entre elas, nove mulheres) e ferindo outras três. Na sequência, o autor do crime se matou com um tiro na cabeça.

Na cena da chacina foi encontrado um gravador com uma mensagem de Sidnei, que também deixou cartas para amigos para justificar seu crime. Diversos trechos do áudio e dos escritos expõem o ódio de Sidnei não só à ex-esposa, mas como a todas as mulheres e às leis de proteção conquistadas. “(…) tenho raiva das vadias que se proliferam e muito, a cada dia, se beneficiando da lei vadia da penha!”, escreveu o assassino, que atribuiu a perda da guarda do filho a “um sistema feminista e a umas loucas”. 

O caráter misógino é claro quando o autor insiste em chamar de “vadias” mulheres que não se sujeitam aos seus mandos, que não atendem às expectativas de submissão reproduzidas pela cultura patriarcal. Referindo-se a Isamara, ele disse que “a vadia foi ardilosa e inspirou outras vadias a fazerem o mesmo com os filhos, agora os pais que irão se inspirar e acabar com as famílias das vadias”, numa aberta incitação ao ódio, esperando que outros homens cometam semelhante atrocidade às mulheres que os enfrentam e a quem as apoia.

Ao longo de dez anos, Isamara chegou a registrar cinco boletins de ocorrência contra Sidnei. Entre os motivos apresentados estão ameaça, injúria e violência doméstica.

Nenhuma a menos

Os fatores que constituem o crime em Campinas não deixam dúvidas de que se trata de mais um caso brutal de violência a mulheres. Ainda são muitos os homens que assassinam suas ex-companheiras motivados pelas condições de gênero. Na maioria dos casos, não se trata de meros crimes passionais, nem de indivíduos doentes ou de sanidade mental comprometida. Trata-se de uma terrível e covarde consequência da cultura machista que reproduz, nas mais diversas esferas da nossa vida, a ideia de que mulher é um ser inferior perante o homem, menos inteligente, menos capaz, indigna de respeito e direitos.

Junto a essa profunda e persistente discriminação, a intolerância nutre o ódio, especialmente quando as mulheres estão decididas a se libertar das opressões sofridas por sua condição de gênero, quando lutam e avançam em suas conquistas – daí a raiva às leis de proteção à mulher, como a Lei Maria da Penha e a Lei do Feminicídio, vistas por machistas como um privilégio às mulheres. No entanto, é pela vida das mulheres e por uma sociedade que supere todas as formas de exploração e opressão que muitas lutadoras não se calarão frente ao machismo e à misoginia. Nenhuma a menos!

As mulheres de Campinas deram um importante recado à cidade, lugar da chacina e de onde saiu até uma “moção de repúdio” da Câmara de Vereadores a uma questão do Enem por trazer um trecho da filósofa e escritora francesa Simone de Beauvoir: frente ao machismo e à misoginia, não nos calaremos!

Carolina MatosCampinas

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