No último dia 26 de maio, o Conselho Universitário da UFPR aprovou, por unanimidade, a recolocação do busto do ex-reitor da UFPR e ministro da Educação durante o governo do militar Castelo Branco. A polêmica em torno do assunto se arrastava desde 2014, quando alunos da universidade repetiram um ato feito em 1968, e removeram o busto.
O engenheiro civil Flávio Suplicy de Lacerda foi reitor da UFPR durante a década de 1950, tendo acontecido, sob sua gestão, a ampliação da estrutura da universidade. Dentre outras obras, foi construído o Complexo da Reitoria, onde foi colocado o busto de Suplicy de Lacerda, que a Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras lhe concedeu em agradecimento pela ampliação do espaço.
Apoiador do golpe militar, Suplicy de Lacerda ocupou o cargo de ministro da Educação entre 15 de abril de 1964 e 10 de janeiro de 1966. Enquanto ministro, foi um dos articuladores do Acordo MEC-Usaid (United States Agency for International Development), cujo fim era tornar a educação brasileira tecnocrática, além da ameaça de privatização de universidades públicas, de acordo com os interesses da política imperialista estadunidense. Em 1968, quando os calouros da UFPR começariam a pagar mensalidade, veteranos se opuseram, organizando um boicote em que a maioria dos alunos pediu isenção e o busto de Suplicy de Lacerda foi derrubado. Além de ser um dos responsáveis pelo Acordo MEC-Usaid, ele foi criador da lei que colocou a UNE na ilegalidade e proibiu atividades políticas nas organizações estudantis.
Em 2014, em um ato para lembrar os 50 anos do golpe militar, os alunos removeram o busto novamente e o arrastaram pelo Centro de Curitiba, por não aceitarem que a universidade tivesse espaço para homenagem a um agente da ditadura. Na época, o reitor que então ocupava o cargo criticou o ato dos estudantes, defendendo que não se pode apagar a história e que Suplicy de Lacerda foi importante enquanto reitor da universidade. Entretanto, o busto não foi recolocado e, só no final de maio deste ano, após várias discussões, encontraram uma saída para o impasse: recolocar o busto em seu pedestal, porém, com informações sobre os motivos que o levaram a ser derrubado duas vezes. Além disso, também se propõe a criação de um Museu de Percurso, que abrangerá, além do busto, outros três pontos de visitação: o pátio da Reitoria, um prédio da UFPR que foi usado pela Polícia Federal para repressão e, por último, um busto na Praça Santos Andrade em homenagem ao advogado cassado José Rodrigues Vieira Netto.
Embora essa proposta tenha sido aprovada de forma unânime pelo Conselho Universitário, alunos questionam se é realmente necessária a recolocação do busto de uma figura que simboliza a ameaça à educação e a repressão ao movimento estudantil, além de ser um desrespeito à memória dos que foram perseguidos, torturados e mortos pelo regime militar.
Em tempos de aberrações políticas como o “Escola Sem Partido”, quando se fala em uma reforma do ensino médio focada, mais uma vez, no ensino tecnocrático, e o avanço de medidas neoliberais que ameaçam a educação superior pública, a recolocação do busto ganha ares de absurdo. Os escombros do busto fazem parte do memorial de resistência do movimento estudantil, enquanto a sua recolocação é uma saída que visa a conciliar e “agradar” tanto aos opositores quanto aos apoiadores das medidas de Suplicy de Lacerda. Não por acaso, organizações liberais, que se dizem a favor do Estado mínimo, apoiaram a decisão do COUN.
Em memória dos presos, torturados, mortos e desaparecidos da ditadura militar, é inaceitável a recolocação do busto de Suplicy de Lacerda. Uma saída que, como a Lei de Anistia, que concedeu perdão a torturadores, tenta conciliar o inconciliável.
Carolyne Dornelles, estudante da UFPR