Compra de votos ignora o discurso de crise com promessa de bilhões para emendas parlamentares
O presidente de maior rejeição da história, Michel Temer, já está condenado no julgamento popular por corrupção e roubo de direitos. Agora pode, também, ser condenado pela Justiça, se o Congresso Nacional autorizar o Supremo Tribunal Federal a investigá-lo por corrupção passiva no exercício do cargo.
A denúncia da procuradoria-geral da República contra o presidente, protocolada na Câmara Federal no dia 29 de junho, acusa Temer de receber propina da JBS para comprar o silêncio do ex-deputado Eduardo Cunha. A gravação telefônica e o recebimento de uma mala com R$ 500 mil pelo ex-assessor Rodrigo Rocha Loures – filmado pela Polícia Federal – são tidas como provas do envolvimento de Temer no esquema que deveria o beneficiar com R$ 38 milhões.
Na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), o relator da matéria, Sergio Zveiter (PMDB-RJ) recomendou, nesta segunda-feira, 10 de junho, o prosseguimento da denúncia. Entretanto, seu parecer, votado pelos 66 deputados membros da CCJ, foi derrotado por 40 votos contra 25, e uma abstenção.
Com medo de ter o processo aberto, ser afastado da Presidência e ser investigado por corrupção, Temer tenta de todas as maneiras o apoio dos deputados para não permitir que as investigações sejam realizadas. Comprou abertamente votos através da liberação de recursos para emendas parlamentares, substituiu membros da base aliada na CCJ – para impedir sua derrota já na primeira votação – e ainda distribuiu “bondades” para prefeitos, governadores, empresários e ruralistas com fim de pressionarem os deputados.
Essas táticas imorais, conhecidas popularmente como corrupção, tinham como um único objetivo afastar a possibilidade de Temer ser investigado na Justiça. O deputado Carlos Marun (PMDB-MS) justificou a ação dizendo que “governo é governo e não tem medo de ser governo”.
Compra de votos
A primeira e mais descarada forma de ganhar adesão de parlamentares para não ser julgado por corrupção é a compra de votos. Com as delações de Joesley Batista divulgadas, Temer foi desmascarado como grande corrupto. Desde então, perdeu qualquer pudor que lhe restasse e, para os parlamentares apoiarem seu governo e suas reformas, entregou R$ 1 bilhão através da liberação de emendas.
De acordo com o levantamento feito no Siga Brasil (Plataforma do Senado que acompanha esse tipo de recurso), nos meses de maio e junho – período de grande tensão, gerada pela greve geral do 28 de abril –, os deputados e senadores receberam o equivalente a 75% do recursos liberado em todo o primeiro semestre de 2017.
O maior beneficiado desse esquema foi o senador José Serra (PSDB-SP), com o valor de R$ 9,6 milhões. Ricardo Ferraço, relator da Reforma Trabalhista na Comissão de Assuntos Sociais (CAS), recebeu, por seu “trabalho”, o valor de R$ 7,9 milhões. Os valores liberados a lideranças do PSDB, somados ao apoio do PMDB contra a cassação de Aécio Neves, rendeu ao Governo Temer a manutenção dos tucanos na base aliada do governo, ao menos até agora.
Em rede nacional, o deputado Delegado Waldir (PR-GO), que recebeu cerca de R$ 600 mil durante todo o primeiro semestre, denunciou a postura do governo que só autorizou emendas suas ao decorrer desta semana de votação da admissibilidade da denúncia.
“A negociata funciona desta forma: você dá votos, você tem ministérios ou cargos, se não der, pescoço cortado, guilhotina”, afirmou o deputado Delegado Waldir (PR-GO), que teve R$ 8 milhões em emendas para passar para o lado do governo.
Troca de deputados na CCJ
Para ganhar a votação na CCJ, o governo pressionou os partidos da base aliada a substituírem seus membros que fossem considerados infiéis ao planalto. Foram retirados da comissão 13 deputados, sendo três do PMDB, três do PR, três do PRB, um do PP, um do PSD, um do SD e um do PTB.
A substituição causou revolta nos mais antigos da comissão, sendo denunciada como manobra política do governo. “Soube através da imprensa que fui tirado [da CCJ]. Me venderam. Fui vendido. Nojento isso. É barganha, é barganha. Sabe o que é barganha para se manter no governo? É isso, é barganha. Organização criminosa, e daí não medem consequências. Arrebentam com a vida, com a moral de uma pessoa. O que é isso? Dois anos e meio nessa comissão como titular. Aí, eu tomo conhecimento pela imprensa que eu estou fora. Eu não presto porque eu não vendo o meu voto, não troco por cargos, não troco por emendas, não”, afirmou Delegado Waldir (PR-GO).
O deputado Waldir chegou a entrar com um mandado de segurança pedindo ao STF a anulação da substituição dos deputados no curso do julgamento da matéria. A Presidenta do STF, Carmen Lúcia, sem nenhum constrangimento, negou o pedido do deputado, validando o troca-troca na CCJ.
Ameaça
A decisão do PMDB de indicar um relator de seu partido para dar um parecer sobre a admissibilidade da denúncia contra o Presidente da República não surtiu o efeito esperado. O deputado Sergio Zveiter (PMDB-RJ) ignorou a pressão partidária e, em seu parecer, tachou a denúncia como gravíssima e que, portanto, precisava ser investigada.
Essa situação ligou o alerta no governo e levou a Executiva Nacional do PMDB a aprovar o fechamento de questão na votação contrária a denúncia. De acordo com a sigla, seus deputados que votarem a favor da aceitação da denúncia, como recomenda o parecer de Zveiter, estão sujeitos a punições, entre as quais a expulsão.
“A Executiva do PMDB fecha questão contra a denúncia ao presidente Temer. Quem não cumprir a decisão será enquadrado pelo Conselho de Ética do partido e sofrerá punições”, afirmou nas redes sociais o presidente do partido, senador Romero Jucá (RR). A legenda tem 63 na Câmara. Segundo o portal “342 agora!”, 4 deputados do PMDB são declaradamente favoráveis a investigação e 8 se declararam como indecisos.
Decepcionado com seu partido, Zveiter retrucou: “Se tivessem me dito, quando me convidaram para ingressar no PMDB, que eu teria que votar de acordo com liberação de emendas ou distribuição de cargos eu não teria ingressado”.
Pacote de “bondades”
A semana da votação do parecer na CCJ tirou o sono do governo em busca de impedir as investigações, seja tratando diretamente com os deputados ou agradando os financiadores de suas campanhas e parceiros políticos das bases eleitorais.
Como forma de agradar à bancada ruralista, que tem mais de 200 dos 513 deputados, Temer sancionou, na terça-feira (11), uma lei para permitir a concessão de título definitivo do imóvel a pessoas que ocupam irregularmente terras da União.
Já para diminuir as tensões da falta de recursos nos estados e municípios e retomar as obras que enriquecem as empreiteiras, Temer anunciou nesta quarta-feira (12) a liberação de R$ 11,7 bilhões em linhas de crédito para obras públicas e para financiar o aumento das concessões na área de infraestrutura. Os bancos públicos, por exemplo, vão passar R$ 4 bilhões do dinheiro que já serviu ao “Minha Casa, Minha Vida” para os empresários que investirem na privatização.
Disputa pela Presidência
A ambição do presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia (DEM-RJ) em chegar à Presidência não significará uma mudança dos rumos da economia. Pelo contrário, Maia e Temer estão juntos, a serviço dos banqueiros, comandando a retirada de direitos trabalhistas e o fim da Previdência.
A disputa entre esses e outros políticos representantes dos banqueiros, todos investigados ou condenados por corrupção, para assumir a Presidência revela a falência desse Estado e a necessidade de ampliação da luta por uma democracia verdadeiramente popular, na qual o poder econômico não determine o resultado das eleições e os trabalhadores, os que produzem toda a riqueza na sociedade, determine os rumos do seu país.
“Os representantes das elites brigam pelo poder, mas representam, todos eles, uma mesma classe, a dos donos das terras, das fábricas e dos bancos: a burguesia. Só acabando com o poder econômico da burguesia, ou seja, estatizando os bancos e as grandes empresas capitalistas, democratizando os meios de comunicação e realizando uma ampla reforma agrária, é que será possível ter uma democracia real”, disse Leonardo Péricles, presidente nacional da Unidade Popular (UP).
Para Péricles, a saída é a construção do poder popular. “Nesse momento, não podemos depositar confiança em nenhuma alternativa oferecida pelos representantes das elites, querendo reestabelecer uma normalidade ou uma repactuação nacional. É preciso ampliar e radicalizar as lutas da classe trabalhadora, construir uma grande unidade popular e lutar pela transformação completa da sociedade, como ocorreu há 100 anos na Rússia. É necessária uma revolução que acabe com toda a farra dos ricos e coloque os trabalhadores no poder”, concluiu o representante da UP.
Ésio Melo – redação Alagoas