Sobre o contrato de trabalho intermitente da Reforma Trabalhista

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Intermitente é o trabalho prestado sem dia e horário fixos de trabalho. O contrato deverá ser por escrito e conter especificamente o valor da hora de trabalho, que não pode ser inferior ao valor-horário do salário mínimo ou àquele pago aos de- mais empregados que exerçam a mesma função em contrato intermitente ou não.

O empregado deverá ser convocado com, no mínimo, três dias corridos de antecedência. No período de inatividade, o trabalhador poderá prestar serviços a outros contratantes. Ao final de cada período de prestação de serviço, o empregado receberá o pagamento imediato das parcelas do salário, férias e décimo terceiro salário proporcionais. Também haverá o recolhimento da contribuição previdenciária e do FGTS.

A maior crítica que pesa a essa nova modalidade contratual assenta no § 4º, segundo o qual aceita a oferta para o comparecimento ao trabalho, a parte que descumprir, sem justo motivo, pagará à outra parte, no prazo de trinta dias, multa de 50% da remuneração que seria devida, permitida a compensação em igual prazo. Feita a convocação pelo empregador, com três dias de antecedência, o empregado tem um dia útil para responder, cujo silêncio equivale a recusa. Mas se o trabalhador confirmar e faltar injustificadamente indenizará à empresa no equivalente a 50% do que ganharia no período para o qual faltou, valor este que poderá ser compensado com os ganhos futuros auferidos no prazo de trinta dias.

Como se vê, a real preocupação do Governo, ao formalizar essa relação que era apenas da prática informal, é com a arrecadação.

            Essa modalidade contratual atinge em cheio a categoria de trabalhadores em bares, restaurantes, casas noturnas, bufês e similares, que não mais terão remuneração estável no estabelecimento em que trabalham, tendo que trabalhar como loucos em múltiplos estabelecimentos para garantir uma base salarial digna.

Por solicitação e pressão da categoria dos aeronautas, o projeto passou a definir que trabalho intermitente será proibido em casos de profissões regidas por legislação específica.

Em nota técnica, a ANAMATRA, mais seis entidades trabalhistas, assim se posiciona:

“Do trabalho intermitente ou contrato a Zero Hora

Nos termos da redação dada ao art. 443 da CLT pelo PLC n. 38/2017, o contrato de trabalho poderá ter como objeto a prestação de trabalho intermitente. (…)

Nesta modalidade de contrato de trabalho, o trabalhador só trabalha e recebe remuneração quando chamado pela empresa, não havendo garantia de jornada mínima e de renda mínima. Assim, ao contrário do que ocorre no sistema vigente, em que o tempo à disposição da empresa é pago ao trabalhador, o trabalhador poderá trabalhar algumas horas em uma semana, em um mês, em um ano, fazendo jus apenas às horas efetivamente trabalhadas. Dessa forma, poderá nada receber ou auferir remuneração inferior ao salário mínimo, em flagrante ofensa ao disposto no art. 7º, inciso IV, da Constituição, segundo o qual trabalhadores urbanos e rurais têm direito ao salário mínimo fixado em lei, nacionalmente unificado, que deve ser suficiente para atender às necessidades vitais básicas do trabalhador e de sua família.

Além disso, o pagamento de direitos como 13º salário, férias, Fundo de Garantia do Tempo de Serviço e repouso semanal remunerado será sempre proporcional às horas trabalhadas, sendo que o trabalhador não terá qualquer garantia de que será chamado pela empresa para trabalhar, nem quando, nem por quantas horas. Trata-se de uma situação de total insegurança que impede o trabalhador de ter a previsibilidade da remuneração que ganhará para pagar as contas do mês. Tampouco poderá esse trabalhador, em jornadas intermitentes, assumir uma dívida para comprar a casa própria, por exemplo.

A prestação de trabalho intermitente iguala o trabalhador a uma máquina, que é ligada e desligada conforme a demanda. Além de transferir o risco da atividade para o trabalhador, o trabalho intermitente indiscriminado, porque independe do tipo de atividade do empregado e do empregador, ofende frontalmente o art. 1º da Constituição, que em seu inciso IV estabelece como fundamento do Estado Democrático de Direito o valor social do trabalho. Também o princípio da valorização do trabalho humano, em que se funda a ordem econômica, resta violado no texto do art. 170 da Constituição Federal.

E tornando esse tipo de relação de trabalho ainda mais precária, impõe-se ao trabalhador o pagamento de multa de 50% (cinquenta por cento) da remuneração que seria devida, caso, depois de aceita a oferta para o comparecimento ao trabalho, não possa trabalhar.

Trata-se, em verdade, da ‘formalização’ e institucionalização do popularmente conhecido ‘bico’ ou ‘biscate’. As empresas eliminam o custo com o contrato de trabalho formal, digno, lançando mão da força de trabalho dos muitos trabalhadores que terão à disposição somente quando houver demanda para tanto. Tal medida visa, certamente, baratear os custos das empresas, o que seria legítimo não fosse fundada na retirada de direitos e precarização das relações de emprego. A jornada intermitente contraria, portanto, tudo o que o direito do trabalho preconiza, negando a própria razão de existir deste.

Ademais, não há qualquer dispositivo no PLC n. 38, nem no voto do relator Senador Ricardo Ferraço que garanta a manutenção dos atuais níveis de emprego para se utilizar mão desta contratação, de modo que nada impede que, depois de aprovada e sancionada essa Reforma Trabalhista, trabalhadores como garçons, cozinheiros, vendedores, por exemplo, sejam demitidos do contrato de trabalho a prazo indeterminado para serem recontratados como trabalhadores intermitentes, sem quaisquer garantias de renda e com grande possibilidade de receber menos do que o salário mínimo mensal.”

Pedro Ernesto Laurentino,

analista judiciário do Tribunal Superior do Trabalho – TST

Trechos do Projeto de Lei da Câmara 38/2017 aprovado e com previsão de entrar em vigor em novembro de 2017.

“Art. 443.  O contrato individual de trabalho poderá ser acordado tácita ou expressamente, verbalmente ou por escrito, por prazo determinado ou indeterminado, ou para prestação de trabalho intermitente.

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  • 3o Considera-se como intermitente o contrato de trabalho no qual a prestação de serviços, com subordinação, não é contínua, ocorrendo com alternância de períodos de prestação de serviços e de inatividade, determinados em horas, dias ou meses, independentemente do tipo de atividade do empregado e do empregador, exceto para os aeronautas, regidos por legislação própria.” (NR)

“Art. 452-A.  O contrato de trabalho intermitente deve ser celebrado por escrito e deve conter especificamente o valor da hora de trabalho, que não pode ser inferior ao valor horário do salário mínimo ou àquele devido aos demais empregados do estabelecimento que exerçam a mesma função em contrato intermitente ou não.

  • 1o O empregador convocará, por qualquer meio de comunicação eficaz, para a prestação de serviços, informando qual será a jornada, com, pelo menos, três dias corridos de antecedência.
  • 2o Recebida a convocação, o empregado terá o prazo de um dia útil para responder ao chamado, presumindo-se, no silêncio, a recusa.
  • 3o A recusa da oferta não descaracteriza a subordinação para fins do contrato de trabalho intermitente.
  • 4o Aceita a oferta para o comparecimento ao trabalho, a parte que descumprir, sem justo motivo, pagará à outra parte, no prazo de trinta dias, multa de 50% (cinquenta por cento) da remuneração que seria devida, permitida a compensação em igual prazo.
  • 5o O período de inatividade não será considerado tempo à disposição do empregador, podendo o trabalhador prestar serviços a outros contratantes.
  • 6o Ao final de cada período de prestação de serviço, o empregado receberá o pagamento imediato das seguintes parcelas:

I – remuneração;

II – férias proporcionais com acréscimo de um terço;

III – décimo terceiro salário proporcional;

IV – repouso semanal remunerado; e

V – adicionais legais.

  • 7o O recibo de pagamento deverá conter a discriminação dos valores pagos relativos a cada uma das parcelas referidas no § 6o deste artigo.
  • 8o O empregador efetuará o recolhimento da contribuição previdenciária e o depósito do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço, na forma da lei, com base nos valores pagos no período mensal e fornecerá ao empregado comprovante do cumprimento dessas obrigações.
  • 9o A cada doze meses, o empregado adquire direito a usufruir, nos doze meses subsequentes, um mês de férias, período no qual não poderá ser convocado para prestar serviços pelo mesmo empregador.”