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quinta-feira, 26 de dezembro de 2024

Existir não é resistir

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De certa forma, todos os trabalhadores e trabalhadoras, pessoas pobres e assalariados em geral resistem todos os dias, acordando cedo, pegando dois ou três transportes para chegar ao trabalho do qual o menor atraso é capaz de fazê-lo perder seu meio de vida, única forma de se sustentar e alimentar seus filhos e filhas.

Também é verdade que pessoas trans enfrentam uma realidade adversa ao extremo, não tendo acesso ao trabalho, muitas vezes, regular. Assim, é certo que pessoas trans resistem de forma cotidiana. De um determinado ponto de vista, é correto também afirmar que “sair do armário”, revelar-se, mais do que descobrir-se trans, é um ato de coragem, pois isso implica enfrentar a rejeição familiar e todos os tipos de revezes, o que é para poucos e poucas.

Diante de tais fatos inegáveis, cabe constatar que não é esta a forma de resistência de um militante ou defensor de uma causa e, ora, não é a luta contra a Lgbtfobia uma causa? Então devemos definir dois tipos de resistência: a primeira, está na qual me detive, é a resistência passiva, a sobrevivência, esta resistência a qual estamos, pelo nosso lugar de classe, condenados a exercer para sobreviver; a segunda, a qual pretendo incentivar aqui, é a resistência ativa, que visa a organizar-se, a atuar diretamente para mudar esta realidade.

É muito dito por grupos oprimidos: “Eu sou resistência!”. É isto correto? Lembremos do primeiro parágrafo. Se é assim, todos os trabalhadores e trabalhadoras o são, embora alguns grupos dentro da classe trabalhadora, em especial as pessoas trans, sofram para sobreviver mais do que os outros. Resistência não é identidade, é um estado, um fardo, nos dois sentidos colocados, tanto trabalhar ganhando pouco quanto tirar tempo e estressar-se organizando um movimento social, e ninguém conhece mais o sofrimento do dia a dia do que as pessoas trans, abandonadas pela família e relegadas à prostituição. Elas sabem muito bem o fardo de resistir, mesmo que passivamente.

Resistir não é uma identidade, não é um ser, é um estado que recai sobre o ser, um ato direto sobre a realidade.

Pensar que se “é” resistência é um pensamento falho, o objetivo da resistência é esgotar a si mesmo. Quem luta o faz para que não seja mais necessário lutar, pois um mundo em que as pessoas LGBTs, em especial as pessoas trans, precisam lutar, é um mundo em que estas pessoas não têm seus direitos, com uma expectativa de vida de 35 anos, são espancadas e violentadas todos os dias. Assim, a necessidade de lutar implica algo a ser vencido… E o mais rápido possível.

Resistir é um fardo, pois o motivo de resistirmos é o nosso sofrimento e o sofrimento de terceiros. Sofrer não é ser, sofrer é um infeliz estado e sem uma resistência ativa que vise a esgotar-se, este sofrimento será permanente.

Mas como resistir de forma ativa? Organizando-se, entrando em movimentos sociais, partidos políticos, estudando a própria condição e ensinando a outras, indo a protestos, apoiando greves e ocupações e entre outras maneiras. Isso não é pouco, não é ilusão.

Um mundo onde pessoas trans não sejam condenadas à marginalização, silenciamento, assassinato, erotização e prostituição é possível, mas só será alcançado através da nossa luta organizada, com fins pensados. A nossa ponte entre o mundo que vivemos e um mundo mais humanizado chama-se resistência ativa.

Existir não é resistir, mas agir sim. Você, pessoa trans, que sofre, tem o papel de mudar esta realidade e, ao lutar, melhorar também os movimentos nos quais milita, levar a eles a prova viva de que a sua causa é sim relevante. LGBTs são parte da classe trabalhadora, uma parte mais rejeitada e sofrida sim, mas ainda assim parte dela. Façam com que percebam que sem vocês não há revolução possível, só provarão isso se entrarem na luta.

Pessoas trans, as queremos na luta! Sua ajuda e participação é vital, não acreditem que um novo mundo é impossível, ele não é apenas possível, como não existirá sem sua força.

Sued, militante da UJR no Cariri

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