Jornal A Verdade, edição nº 222, novembro de 2019, Página 10.
Redação Nacional
Movimento de Mulheres Olga Benário
Foto: Jornal A Verdade
ARGENTINA – Ocorreu nos dias 12, 13 e 14 de outubro, na cidade de La Plata, Argentina, o 34º Encontro Nacional de Mulheres, o maior da história do país, com a participação de mulheres da grande maioria das cidades, de diversas idades, etnias e profissões. O Encontro Nacional de Mulheres (ENM) é único no mundo por sua imensidão e pelo número de questões que discute. O primeiro encontro ocorreu em 1986 na cidade de Buenos Aires, quando participaram mil mulheres de vários setores. No último, foram cerca de 200 mil participantes.
Eram mulheres de todas as províncias, da cidade, dos bairros e do campo, originárias, independentes e de diversas organizações sindicais, estudantis, associações camponesas e de partidos políticos de centro e da esquerda. Havia garotas com suas mães, avós e bisavós, colegas da escola, do trabalho, da militância partidária, lideranças sindicais, parlamentares mulheres, povos originários, mulheres lésbicas, travestis, transgêneros e transexuais. Além disso, as imigrantes, principalmente, do Paraguai, Venezuela e Equador, estiveram presentes relatando sua situação de vida.
O Encontro Nacional de Mulheres tem sido o coração de organização e reivindicações das mulheres argentinas. São 34 anos de história de encontros em nível federal e de caráter horizontal, plural e autogestionário. Podemos dizer que é um grande encontro de amplas massas femininas. Muitas participam pela primeira vez, como donas de casa, empregadas domésticas, indígenas e imigrantes. É fruto da organização desse encontro a luta pela legalização do aborto seguro, público e gratuito, um debate que teve início na década de 1990 e que gerou, e ainda gera, repercussão nas ruas argentinas.
A principal discussão no encontro deste ano foi a política entreguista do presidente Mauricio Macri (Partido Proposta Republicana) e seu acordo com o Fundo Monetário Internacional (FMI), uma política que agrava ainda mais a dupla opressão das mulheres argentinas.
O país atravessa uma das piores crises econômicas de sua história. Com uma inflação que chegou a 60% no primeiro trimestre de 2019, a população se vê empobrecida. Mais de 15 milhões de argentinos estão em nível de pobreza, não tendo acesso à alimentação básica. São famílias que têm apenas uma refeição ao dia. Isso significa que uma a cada duas crianças argentinas passam fome, fato que contribui para que milhares de mulheres marcham contra a política nefasta de Macri.
No primeiro dia do encontro, as mulheres lotaram os prédios da Universidade de La Plata, buscando grupos de debates que passam por temas como mulher e trabalho (sindical e camponês); feminização da pobreza; mulher e violência (de gênero, racial, obstétrica, feminicídios, abusos); legalização do aborto; política e poder; família e justiça; mulheres originárias, entre outros.
Muitos grupos tiveram que se subdividir por causa da grande procura. Os grupos são autogestionados, tendo uma coordenadora que anota as propostas trazidas às mulheres para posterior produção de um documento unificado com suas resoluções políticas. No final do encontro, tudo é aprovado por consenso, isto é, não existe defesa de proposta por pessoas, e sim um acordo coletivo, por algo que seja um bem comum para todas.
No segundo dia, seguiram-se os debates e foram realizados diversos atos. O primeiro ocorreu em apoio ao povo curdo, que enfrenta uma nova ofensiva militar com a invasão de Rojava, promovida pelo governo fascista da Turquia, de Tayyip Erdogan. No ato, diversas mulheres de países latino-americanos se colocaram em solidariedade às mulheres curdas e equatorianas, que têm sido linha de frente em batalhas contra os países imperialistas.
Também foi realizada uma grandiosa marcha com 30 blocos, em torno de três quilômetros de feminismo nas ruas de La Plata. As mulheres caminharam mais de oito quilômetros exigindo acesso ao aborto legal, seguro e gratuito; o fim dos feminicídios, a implementação da Lei de Educação Sexual Integral e, ainda, políticas que garantam acesso à saúde, ao trabalho e à educação.
No terceiro e último dia, foi realizado o encerramento do encontro no Estádio de La Plata com a leitura das propostas dos grupos de debates e a escolha de local do próximo ENM, que será na cidade de San Luis.
Foi um encontro muito emocionante, do qual se pode concluir que a união das mulheres é um motor potente que eleva a consciência de milhares de estudantes e trabalhadoras. Há um sentimento de orgulho e alegria de mulheres que organizaram e garantiram a realização deste grande encontro, que se demonstra altamente democrático, embora existam forças oportunistas que tentem dividi-lo e descaracterizá-lo.
Importante ressaltar que o encontro ocorreu pouco antes das eleições, momento em que é necessário entender a conjuntura do país e fazer com que as mulheres se coloquem como protagonistas da construção de novas políticas voltadas para a vida e a dignidade femininas. E mais: que se voltem para a tomada do poder, já que, a partir do encontro, ficaram mais fortalecidas para decidir sobre suas vidas, a de seus filhos e a de seu país.
Unir as forças progressistas em um momento de avanço do fascismo no mundo é uma urgência, assim como compreender o papel revolucionário da mulher neste momento é crucial para vencermos o retrocesso, a violência e a fome.
Estiveram representando o Brasil no encontro Nana Sanches, da Unidade Popular (UP), e Claudiane Lopes, do Movimento de Mulheres Olga Benário. Elas participaram dos debates e distribuíram o jornal do Movimento com notícias das lutas das mulheres brasileiras contra o Governo Bolsonaro, além de levarem as experiências de luta do movimento e de nossas Casas de Referência em Belo Horizonte, Porto Alegre e São Paulo.