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quinta-feira, 21 de novembro de 2024

Profissionais de saúde trabalham sem proteção em vários hospitais

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ABANDONO – Profissionais da saúde precisam arriscar a própria saúde para continuar atendendo. (Foto: Reprodução/Reuters)
Redação Rio de Janeiro
Jornal A Verdade

RIO DE JANEIRO – O Movimento Trabalhadores pelo SUS, que compõe a editoria de Saúde da Redação de A Verdade no Rio de Janeiro, entrou em contato com diversos profissionais que estão na linha de frente do combate à epidemia do coronavírus para saber das condições de trabalho encontradas na rede de saúde do município durante a quarentena. 

Falamos com Dioneia (nome fictício), enfermeira que trabalha num dos hospitais administrados pela Prefeitura do Rio. O quadro descrito é alarmante, principalmente por se tratar das condições em que os profissionais se encontram no cuidado às vítimas da pandemia da Covid-19. 

“Estamos trabalhando sem EPIs (equipamentos de proteção individual) na minha unidade hospitalar. Isolaram um andar inteiro para a Covid-19, mais de 20 leitos, com apenas uma enfermeira de isolamento respiratório! As outras enfermeiras normais não têm nenhum preparo para receber pacientes com essa patologia. Neste andar não há respiradores e nem recursos humanos suficientes. Muitos colegas moram longe e estão sem condições de vir ao trabalho pelo grave problema de condução. Alguns estão completamente nervosos, estressados. Já vi colegas surtarem em pleno corredor. Isso em apenas uma semana! Para piorar, as nossas chefias nos ameaçam o tempo todo”, relata.

A carga de trabalho dos profissionais da saúde aumentou enormemente devido à quarentena. A Prefeitura suspendeu férias e licenças e convocou médicos e enfermeiros aposentados para ajudarem no combate à epidemia.

Sem estrutura adequada e com equipes médicas sobrecarregadas pela demissão, no começo do ano, de centenas de profissionais, quem continua trabalhando nos hospitais sofre com as consequências dos sucessivos ataques ao SUS.

“Ontem, tive que dobrar. E amanhã terei que dobrar novamente. Estão misturando os pacientes com tuberculose e Covid-19 no mesmo setor. Muitos colegas estão surtando. Tá um desespero só, pois a enfermaria teria de ter pressão negativa e uma antessala, mas não temos. Usamos capote de pano, quando o ideal é o impermeável. Porém, nenhum hospital do SUS tem. As máscaras também estão em pequena quantidade. O pessoal está usando saco de lixo para proteção, um absurdo”, desabafa Dioneia.

Outra enfermeira, Sandra (nome fictício), relata os mesmos problemas no hospital onde trabalha. “Aqui no hospital não temos condição nenhuma de receber esses pacientes. E acredito que nenhum hospital do SUS tem. Na minha unidade só temos sete respiradores e nada mais. Estamos sofrendo demais. Não há EPI para quem está na assistência direta. Imagina pra quem não está na assistência, mas precisa rodar o hospital todo?”.

Sandra lembra dos elogios dados pela imprensa aos profissionais de saúde, muito distantes do tratamento recebido do governo. “Para a mídia, [os governantes] fazem aquele discurso de ‘grandes guerreiros da saúde’, tapinha nas costas e tal, mas essa é uma valorização que não passa de retórica. Na vida real, é só descaso e abandono. Sei de alguns colegas que são de UPA e de emergência aberta que utilizam sacos de lixo como capote para proteção. Na minha unidade só chegaram cinco kits de teste para o coronavírus, nunca achei que viveria para ver isso”, lamenta. 

“Quando o trabalhador vai reclamar, as chefias alegam que estamos assediando, e que não é papel delas, mas do Ministério da Saúde, comprar os EPIs”, revela, indignada.

SUS Abandonado

Um médico no Rio de Janeiro explicou a A Verdade que a maior parte dos médicos de cidades como o Rio e São Paulo trabalha sob o regime de PJ (pessoa jurídica). “Precisamos fazer uma empresa para poder trabalhar para os outros hospitais, e isso tira todos os nossos direitos de férias, 13º, inclusive o direito de adoecer e ter faltas abonadas”.

Segundo ele, a consequência desse regime de trabalho é que muitos profissionais estão adoecendo, mas não podem se recolher. “Tem muito médico com síndrome gripal indo trabalhar, pois não pode perder o dia de trabalho. Médicos que potencialmente podem estar infectados com a Covid-19 e que podem estar passando isso para outras pessoas!”.

O caso se torna grave, pois, durante a quarentena, a quantidade de pessoas atendidas por esses profissionais aumentou enormemente. “A gente faz, em média, de 50 a 60 atendimentos por plantão, sem contar as outras pessoas com quem a gente interage. Eu mesmo, há três semanas, tive que dar plantão com febre alta (estava com uma arbovirose). Acho que essa denúncia é importantíssima, uma vez que a recomendação do Ministério da Saúde é a de afastar todos os pacientes e familiares com síndrome gripal por 14 dias!”, explica. 

A crise do coronavírus afetou duramente a rotina da população e os profissionais da saúde passaram a absorver grande parte do trabalho de cuidado e tratamento dos infectados pela Covid-19. Como a epidemia ainda não atingiu seu pico de propagação no Brasil, a tendência é de que as próximas semanas sejam ainda mais duras.

Infelizmente, a população mais pobre será a maior prejudicada. E o SUS, única defesa que temos contra uma hecatombe humanitária, tem sofrido sucessivos golpes desde a aprovação do Teto dos Gastos, que congelou por 20 anos os investimentos federais nas áreas sociais. Estima-se que, somente em 2019, o SUS tenha deixado de receber R$ 9 bilhões em investimentos. 

Dessa forma, a política de desmonte e sucateamento do sistema público de saúde nos deixou ainda mais vulneráveis ao coronavírus. Esse bombardeio contra o SUS também se expressa nas condições de trabalho e emocionais de seus profissionais, como afirma André. “Eu tô exausto. Tô pra desistir de trabalhar no SUS de vez! A situação não tá legal pra gente. Eu tô comprando muito EPI com meu dinheiro. As máscaras que dão aqui são as piores. Queriam me dar uns óculos usados!!! Me falaram que são quatro óculos de proteção pra unidade toda”.

Há algo de positivo: a população tem percebido mais claramente que é preciso defender o SUS, que um sistema de saúde público universal é fundamental para defender a vida dos brasileiros e, portanto, não pode ficar refém dos interesses privados. Essa é uma tarefa que deve ser assumida pelo conjunto dos movimentos populares, sindicatos e partidos verdadeiramente comprometidos com a soberania nacional e o bem-estar do povo brasileiro.

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