A exploração da imagem da criança na sociedade capitalista

432
EXPLORAÇÃO CAPITALISTA – No passado, o capitalismo explorava a mão de obra infantil nas fábricas; na atualidade explora também a sua imagem. (Foto: Reprodução/SEIAS)
Tiago Bezerra e Cleide dos Santos

SERGIPE – Diariamente, nas redes sociais, aumentam os números dos casos de denúncia de pais e adultos que exploram a imagem das crianças para obter lucro a partir de ‘likes’. Mas o que leva esses pais e adultos a fazerem isso? Que padrão estético é esse que tira a autenticidade das nossas crianças?

Cresce também o número de ‘youtubers’ infantis que são influenciadores para outras crianças. A cada like que recebem, aumentam sua capacidade de obter lucros. Por isso, grandes produções e patrocínios são feitos para que essas crianças apareçam cada vez mais nas telas de computadores e principalmente dos celulares.

Empresas como Capricho e Boticário patrocinam jovens com seus produtos e estampam em suas revistas e meios de comunicação as suas marcas nas crianças. Outras indústrias de cosméticos também se associam aos jovens youtubers para proporcionar propagandas rentáveis.

É importante entender que na sociedade divida em classes, sobre a qual a minoria oprime a maioria, a ideologia dominante é a dessa classe opressora. Portanto, a sociedade de consumo causa uma ilusão com o bombardeamento de propagandas e imprime a sua ideologia no pensamento das massas que, por conseguinte, impede o nosso povo de agir sobre os problemas reais que causam os sofrimento e tristeza. Todas essas propagandas são armadilhas de um sistema que adoece a sociedade, adoece as famílias e claro, adoce também os jovens.

O que leva as mães e pais a explorarem a imagem de suas filhas e filhos é reflexo dessa sociedade doente. Cada vez mais se padroniza as crianças, retirando delas a sua autenticidade, inibindo as suas qualidades criativas. Dizeres como por exemplo: “isso não dá dinheiro” ou “isso é coisa de quem não tem o que fazer” e práticas que usam a imagem dos filhos nas redes sociais, castram os sentimentos mais profundos de alegria e espontaneidade das crianças.

Há casos de sexualização das filhas para que virem mostras de marcas e se transformem em famosas, como o caso da garota de 11 anos Gabriella Severino, conhecida como Melody, que teve seu corpo erotizado pelo prórpio pai, Thiago Abreu, o MC Belinho nas redes sociais. A Melody tinha seu corpo sensualizado para angariar fãs.

No mês passado, foi o caso da Bel, que repercutiu nacionalmente e, em poucas horas, pessoas formaram um grupo para colocar a mãe na justiça. O caso da Bel que esteve em alta porque muitas crianças que a seguiam começaram a notar que ela não tem vontade própria, pois em muitos vídeos antigos e atuais ela é humilhada e constrangida e não tem nenhuma privacidade. O seu canal na internet começou em 2013 fazendo desafios de comida, “gororoba”, que fazia a garota vomitar. Há enquetes para definir o que Bel deve usar como vestimentas e até acontece de ser filmada o dia inteiro. Fran, a mãe, é responsável por monitorar os canais e as redes sociais pelo fato da Bel ser menor, mas é visível que a menina não tem escolha de absolutamente nada. O conselho Tutelar fez duas visitas à residência da família e elaborou um parecer para o Ministério Público. Fran e Maurício (o pai) e Nina (a irmã) de 5 anos, também têm canais no YouTube. O livro “Segredos da Bel para Meninas” lançado em 2016 foi muito vendido.

Atualmente a garota tem 13 anos e age e até se veste como uma criança, pois os pais também não deixam ela se vestir como uma pré – adolescente por que simplesmente terem medo de perder seu público infantil. A irmã, Nina, provavelmente vai passar pelo mesmo problema que a Bel ou já está passando.

Outro fator nesses dois casos é a imagem das meninas. O patriarcado que está emerso também na família e as lojas de cosméticos que patrocinam os produtos femininos da moda infanto-juvenil.

Vejamos como a legislação em defesa da criança se coloca, formalmente, na Lei 8069/90 | Lei nº 8.069, de 13 de julho de 1990:

No Art. 7 temos: “O direito ao respeito consiste na inviolabilidade da integridade física, psíquica e moral da criança e do adolescente, abrangendo a preservação da imagem, da identidade, da autonomia, dos valores, ideias e crenças, dos espaços e objetos pessoais.”

No artigo 100 – 5: privacidade: a promoção dos direitos e proteção da criança e do adolescente deve ser efetuada no respeito pela intimidade, direito à imagem e reserva da sua vida privada; (Incluído pela Lei nº 12.010, de 2009) Vigência*.

Há leis de restrição a exploração da imagem, como os artigos 240 e 241 e a OIT (Organização Internacional do Trabalho), que declara o trabalho doméstico como um dos mais abusivos tradicionais e a exploração sexual como um dos maiores e mais perigosos para as crianças. Porém essas leis tem o caráter simplesmente formal, provando o abandono do Estado capitalista. As crianças ficam a mercê de todos os tipos de violências, impedidas da garantia de socialização e de realmente crescerem como crianças.

A criança que tem suas potencialidades reprimidas vai explorar outras formas de externar a sua criatividade. Por isso temos o aumento do consumo de drogas, a violência e doenças psicossomáticas como a depressão, a ansiedade, a hiperatividade, déficit de atenção, o nervosismo, dificuldade na aprendizagem e socialização e etc. Com certeza a saúde mental dessas crianças está mais fragilizada e também suas famílias estão enfrentando novas dificuldades nesse período de isolamento social. Segundo relados do Departamento Científico de Desenvolvimento e Comportamento da Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP), nos últimos anos no Brasil aumentaram os casos de tentativas de suicídio entre as crianças e os adolescentes. Problemas na relação familiar ruim e violenta causam entre 15% a 23% da depressão infantil. Das mais de 350 milhões de pessoas com depressão no mundo, cerca de 2% são crianças segundo Organização Mundial da Saúde (OMS).

Reflexões Sobre os Problemas da Exploração da Imagem Infantil

Deve-se fazer uma reflexão mais profunda desse problema, entendendo como a lógica da sociedade atende ao lucro de meia dúzia de megaempresas, a indústria da moda e as redes “sociais” e como a família, que tem papel fundamental na educação moral e ética, se insere nessa sociedade.

Embora a população deva estar atenta aos casos de exploração infantil e denunciar, a solução para esse problema não está nos indivíduos em si, mas na forma como a sociedade produz o seu sustento. No modo de produção capitalista a lógica é a de que precisamos passar por cima do outro, de escravizar o outro e de ter cada vez mais coisas. Diante disso, tem que se explorar o trabalho do homem pelo homem. A sociedade sente a necessidade de padronizar os seus filhos. As pessoas são tratadas como uma propriedade privada, seus espíritos são podados. Sem sentimentos próprios acreditam que o supérfluo e o passageiro vai lhes trazer a felicidade.

Pois bem, a criança é reflexo da sociedade, pois é nessa fase que aprendemos a ser um ser social e se absorve mais rápido as experiências da vida. Vivemos na sociedade de consumo, onde tudo é supérfluo e descartável, que coloca nas pessoas que a felicidade vem a partir da quantidade de produtos que consumimos, na busca do lucro a todo o momento. Modelo de sociedade que transforma os seres humanos em máquinas, que ignora os seus sentimentos mais humanos do afeto, da felicidade e do amor em troca da casa mais bonita, do corpo mais perfeito, das melhores roupas, dos melhores carros e etc. Essa é a lógica do próprio sistema capitalista. A competição pelo celular do momento a cada 6 meses, a busca por mais likes, mais comentários, mais dinheiro etc. Essa competição atende ao enriquecimento daqueles que controlam as fábricas e megaempresas de produtos de beleza, automóveis, da especulação imobiliária, das revistas de moda e etc. Ilude e aliena pessoas, mesmo as mais pobres (a maioria), de que para ser feliz é preciso ter o inalcançável, que todos podem ser milionários e sonhar com a vida dos grandes artistas da TV e dos influenciadores digitais, quando muitas vezes a maioria do nosso povo trabalhador tem dificuldades em conseguir alimento para casa, de pagar aluguel, de ter banheiro em suas residências, de conviver com a falta de saúde, escolas de qualidade, tratamento de esgoto e colocar o pé na lama sempre quando chove e etc.

Nesse sentido para salvar as crianças do desespero e da agonia dos seus espíritos, temos que lutar pelo definhamento da sociedade capitalista, construir um Estado socialista em que todas as vidas importem, em que todas as pessoas participem das decisões dos rumos da sociedade e que todas as crianças sejam valorizadas pelas suas capacidades criativas para construir um futuro colorido, fraternal e feliz.