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sexta-feira, 22 de novembro de 2024

Prefeito de São Bernardo joga comida fora, em plena pandemia

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FOTO: REPRODUÇÃO

Thais Gasparini
Movimento de Luta nos Bairros Vilas e Favelas

Em meio a crise do novo coronavírus, a Prefeitura de São Bernardo do Campo deixou vencer produtos de pelo menos 1000 cestas básicas que estavam armazenadas no Centro de Referência do Idoso, por meio da Secretaria de Assistência Social.

Parte dos alimentos foram doados através do programa Alimento Solidário, intermediado pela Secretaria de Desenvolvimento Social do Estado de São Paulo. Foi notificado que muitos dos 9000 kits de alimentos continham produtos com data de vencimento entre 20 e 29 de junho, e que cada kit custou cerca de R$126.

A prefeitura, comandada por Orlando Morando (PSDB), alega não ter conseguido contatar as famílias que estariam à espera das cestas. É muito pretensioso, por parte da gestão, alegar dificuldade no contato das famílias da cidade de maior déficit habitacional do ABC Paulista. Ora, são essas famílias que o prefeito insiste em colocá-las na rua, mesmo em época de pandemia, como foi o caso do despejo truculento que aconteceu na Vila São Pedro durante o mês de junho.

Não é difícil andar pela cidade, principalmente nos bairros periféricos, e encontrar alguma família que esteja passando por dificuldades econômicas diante dessa crise sanitária. O fato é que, há anos, a população são bernardense carece: de fome, de emprego, de moradia, de transporte e de educação. Reflexo da incompetência dos governantes para sanar as necessidades da população mesmo antes da pandemia. São milhares de desempregados em São Bernardo do Campo, uma cidade que em sua base se construiu entre as fábricas, mas que agora sofre pela falta de investimentos públicos. Em 2018, apenas 34% da população ocupava postos de trabalho.

São Bernardo, atualmente, é a cidade do ABC com mais casos e mortes confirmadas pela covid-19. O Montanhão, um dos bairros pobres e periféricos da cidade, lidera o número de mortes. Para Lucas Barbosa, morador do Montanhão e da Coordenação Estadual do Movimento de luta nos Bairros, Vilas e Favelas (MLB) de São Paulo, “nossa população se revolta quando vê uma notícia dessa, de quase mil cestas estragarem. Um alimento que podia ter um destino certo que é na mesa do trabalhador e da trabalhadora, estragar num galpão da prefeitura, perder a validade por desleixo.” Em nota, a prefeitura diz que as tratativas para a regularização da situação está sendo feita. Claro, porque além de tudo, entregar ou vender alimentos vencidos configura crime previsto por lei. O resultado disso é dezenas de produtos sendo jogados fora enquanto o povo passa fome.

Na contramão do desleixo da prefeitura, os movimentos sociais se organizam para suprir a necessidade imediata da população. Tendo em vista a ineficiência das ações promovidas pelo governo, como auxílio emergencial e o cartão merenda, que deixa milhares de pessoas na fila de espera, o Movimento de Luta nos Bairros, Vilas e Favelas organiza desde o início da pandemia uma campanha nacional de solidariedade. De acordo com a Victória Magalhães, coordenadora do MLB e moradora de SBC, “nessa crise sanitária onde o mínimo que o Estado deveria fazer era cumprir o papel de não deixar com que a população pobre, a população trabalhadora não morresse de fome, o que a gente vê é justamente o contrário. O MLB tem cumprido um papel fundamental, com outros movimentos sociais, de além de continuar com os núcleos de politização, núcleo de luta por moradia, tem feito as brigadas de solidariedade no nosso país e na nossa cidade, que chegaram antes de qualquer outra ajuda nas favelas, nas ocupações”. Já são milhares de famílias atingidas, inclusive na cidade.

Em períodos como estes, fica cada vez mais evidente as contradições que o sistema que visa o lucro propõe para a população mais pobre. É muito cômodo deixar alimentos estragarem enquanto se tem um banquete oferecido durante todas as refeições do dia. É muito fácil se tratar de doença em hospitais particulares de outros municípios, enquanto não há médicos e leitos por falta de investimento na saúde pública da cidade. Enquanto muitos ficam aquém de políticas públicas, a prefeitura de São Bernardo não sai das páginas policiais.

Mas, se tem uma minoria que se beneficia com essa perversidade, tem uma maioria com disposição de reverter essa situação. O MLB organiza famílias há anos para lutar, não só pela reforma urbana, mas por um outro tipo de sociedade e segue fazendo esta luta mesmo nas condições pandêmicas da atualidade. Passeatas, mobilizações, greves, protestos e panelaços são organizados pelo movimento expressando a certeza de que a população sem-teto dará um basta na injustiça. Para todos aqueles que tiveram suas vidas ceifadas, principalmente nesse momento, nenhum minuto de silêncio. Mas sim toda uma vida de luta.

“… O que o senhor Juscelino tem de aproveitável é a voz. Parece um sabiá e a sua voz é agradável aos ouvidos. E agora, o sabiá está residindo na gaiola de ouro que é o Catete. Cuidado sabiá, para não perder esta gaiola, porque os gatos quando estão com fome contempla as aves nas gaiolas. E os favelados são os gatos. Tem fome.”

Trecho retirado do livro Quarto de despejo – Carolina Maria de Jesus.

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