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segunda-feira, 4 de novembro de 2024

Trabalhadores essenciais, mas com baixos salários

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CATEGORIA ORGANIZADA – Mesmo realizando um serviço essencial, garis têm salários atrasados e trabalham sem equipamento adequado. A categoria respondeu com greve. (Foto: Jornal A Verdade)
Rafael Freire

BRASIL – A reclamação é geral: mesmo exercendo um serviço essencial para a população, os agentes da limpeza urbana se sentem oprimidos de todas as formas pelas empresas capitalistas que lhes contratam por um salário miserável e pelas administrações municipais.

Tal situação agora é agravada pela pandemia da Covid-19, que escancarou os problemas estruturais de saúde no Brasil, a falta de saneamento básico e de acesso à água potável e a importância de vivermos em cidades limpas. Vale destacar, inclusive, que, com um grande número de pessoas passando a maior parte do tempo em suas residências, houve um aumento significativo do volume de lixo domiciliar produzido em todo o país, aumentando o trabalho dos agentes de coleta.

“O assédio moral que sofremos nas empresas é algo inaceitável. Os gerentes agem como coronéis, gritam, xingam, só sabem dar ordens”, afirma Wenderson Alves, presidente do Sindicato dos Trabalhadores da Limpeza Urbana do Mato Grosso (Sindilimp-MT). Wenderson, que é agente de limpeza em Cuiabá, já amargou duas demissões por organizar a categoria para lutar por seus direitos. Primeiro foram seis meses de desemprego, entre 2015 e 2016, e depois quase um ano, em 2017, quando entrou a empresa Locar, que possui contrato vigente com as Prefeituras de Cuiabá e Várzea Grande, cidade vizinha.

“As empresas não aceitam o sindicato e muito menos que temos o direito de estabilidade no emprego por sermos da diretoria, mesmo que o nosso Sindilimp ainda não tenha a carta sindical. Mas nós já conquistamos duas vezes na Justiça o reconhecimento à estabilidade. O pior é que agora, com o Governo Bolsonaro, travou tudo no Ministério do Trabalho e nosso pedido de carta não avança”, relata.

Desde 2017, a partir da entrada da empresa Locar no serviço de limpeza de Cuiabá, são frequentes os atrasos nos pagamentos dos salários e a falta de equipamentos de segurança individuais (EPIs). Até mesmo neste momento de epidemia a empresa não forneceu máscaras descartáveis aos agentes de limpeza, que são obrigados a usar suas máscaras de tecido durante toda a longa jornada de trabalho.

Em Caruaru, greve para receber em dia

E foi exatamente esta realidade de descaso que aproximou o Sindilimp-MT ao Sindlimp-Caruaru, no Agreste Pernambucano, entidade filiada ao Movimento Luta de Classes (MLC). A empresa Locar também é a detentora do contrato de limpeza urbana junto à Prefeitura de Caruaru.

Antônio Lira, presidente do sindicato da categoria na região, afirma que a prática desta empresa é idêntica: “Nós só recebemos o salário no quinto dia útil deste mês (junho) porque fizemos paralisações de 24 horas em março, abril e maio. Foram três meses seguidos recebendo nosso salário com vários dias de atraso, com os companheiros passando muitas dificuldades em casa”.

Na paralisação de maio, inclusive, a empresa tentou impedir a presença do sindicato no setor de trabalho, mas os trabalhadores disseram que, sem a presença de sua entidade representativa, não dariam expediente. Antônio diz ainda que o histórico de práticas antissindicais é longo, com ameaças de demissão dos agentes que defendem o sindicato e até mesmo com demissões dos diretores do Sindlimp. Em agosto de 2019, a empresa demitiu dez dirigentes sindicais e o sindicato conseguiu, até o momento, reverter quatro destas demissões.

Antônio informou ainda que o sindicato já fez várias denúncias à Secretaria do Trabalho sobre falta de EPIs e até de fardamento, além de ter cobrado da Prefeitura sua parcela de responsabilidade com a situação dos trabalhadores terceirizados, afinal, eles prestam um serviço à cidade. No entanto, “parece que vai terminar o mandato da prefeita sem termos nenhuma audiência”, finaliza.

Problemas também no serviço público

DEPOIMENTOS – Trabalhadores de Florianópolis conversam com o jornal e explicam a paralisação e lutam por salários em dia. (Foto: Jahy Pronsato/Jornal A Verdade)

Em Florianópolis (SC), os trabalhadores da Comcap, autarquia municipal da Prefeitura de Florianópolis que realiza o serviço de limpeza urbana na cidade, estão passando por um momento histórico em sua luta. Realizaram paralisação de um dia, em 15 de junho, que forçou a Comcap a aceitar algumas reivindicações do movimento, tais como retorno do pagamento do terço de férias e do 13º, direito ao plano de carreira e ao auxílio-alimentação sem restrições, conforme Acordo Coletivo. A autarquia, porém, descumpriu o acertado e os trabalhadores, que estão em estado de greve há várias semanas.

“Nós estamos igual aos médicos, trabalhando excessivamente para não deixar o lixo acumular, porque, se não tiver coleta, vai ter rato, mosquito da dengue. Por isso nós estamos trabalhando tanto. Mas aí chega num ponto desses de cortar nossos direitos. Viram as costas pra nós. Pô! Nós estamos igual ao pessoal da saúde, merecedores eles e nós também”, declarou Ivan, que trabalha há 11 anos para o Município de Florianópolis.

Sandro, conselheiro do Conselho Deliberativo do Sindicato dos Trabalhadores no Serviço Público Municipal de Florianópolis (Sintrasem), ainda aponta outro aspecto: “A maioria da população reconhece nosso trabalho e entende nossas reivindicações. O ataque que vem ao movimento é da mídia. A gente sabe que a mídia é comprada. Infelizmente, no Brasil a mídia não é isenta, é tendenciosa e é paga, a mídia serve aos interesses do governo”.

Já em Natal, o Movimento Luta de Classes denunciou, em nota, que a Urbana (Companhia de Serviços de Urbanos da Prefeitura Municipal), contratou um laboratório com dispensa de licitação, no dia 02 de junho, para fazer a testagem de Covid-19 nos trabalhadores e afastar os infectados para evitar mais contágios, mas, até agora, apesar dos vários registros de pessoas com sintomas e de uma morte confirmada, não apresentou sequer um cronograma de quando serão realizados os exames.

No Município do Rio de Janeiro, a categoria dos trabalhadores da limpeza urbana sofre com a falta de garantias de inúmeros direitos trabalhistas. A reportagem de A Verdade visitou, em junho, a gerência da Comlurb (Companhia de Limpeza Urbana) e recebeu a denúncia, por parte de alguns agentes de limpeza, de que, há 20 anos, a gerência só conta com um trator, o qual não passa por manutenções regulares.

Como se não bastasse, a Prefeitura do Rio nunca cumpriu com a lei 1.234/2015, que obriga a Comlurb a esterilizar os uniformes dos garis. Todos os trabalhadores da categoria da cidade afirmam que isso nunca aconteceu, nem mesmo agora, durante o período da pandemia do coronavírus. Esse tipo de descaso se reflete no alto número de mortes desses trabalhadores pela Covid-19, que já passa de 20 na cidade.

Paraíba: lutas em várias cidades

No início da pandemia, as empresas de limpeza urbana na Paraíba só passaram a adotar medidas de segurança e saúde especiais após várias patrulhas e denúncias realizadas pelo Sindlimp-PB, inclusive, nos programadas locais de TV. Foram detectadas condições desumanas de trabalho, sem qualquer preocupação em prevenir o contágio pelo coronavírus, descumprindo todos os protocolos das autoridades de saúde.

Numa das empresas terceirizadas da capital, João Pessoa, a água potável estava cortada há dias. Em outra, não havia refeitório e os trabalhadores faziam suas refeições em meio a material infectado, ao lado dos caminhões coletores. E em nenhuma delas havia sabão ou detergente em quantidade suficiente, nem muito menos álcool em gel (70%).

Tudo isso só aconteceu pelo descontrole da Prefeitura Municipal no processo de licitação para a prestação do serviço de limpeza urbana, que acarretou num contrato temporário e precário de três meses (já prorrogado por mais três), em que as empresas tentaram a todo custo burlar o Acordo Coletivo vigente, negando direitos e promovendo demissões em massa, especialmente dos trabalhadores que se sindicalizavam.

Em Campina Grande, a empresa LimpMax está obrigando os agentes da coleta domiciliar a trabalharem uma jornada média de 14 horas por dia, além de não efetivar a limpeza dos caminhões e de fornecer quentinhas no lugar do vale-alimentação, conquista histórica da categoria. No último dia 25, a categoria paralisou suas atividades durante o turno da manhã e a empresa finalmente prometeu apresentar soluções.

Já em Patos, no Sertão Paraibano, a Prefeitura Municipal conta hoje com o sexto prefeito num período de quatro anos, gerando grande instabilidade administrativa e falta de pagamentos à empresa terceirizada, que, por sua vez, repassa sem pena o ônus financeiro aos trabalhadores com frequentes atrasos nos salários.

“Os trabalhadores da empresa Conserv, em Patos, estão muito sobrecarregados porque, além das demissões, apenas dois caminhões coletores estão em operação, sem a devida manutenção, para dar conta de um grande aumento do lixo produzido nas casas das pessoas, coleta que antes era realizada com cinco caminhões. Isso sem falar na falta de EPIs básicos, como luvas e máscaras”, relata Radamés Cândido, presidente do Sindlimp-PB.

Categoria em luta

Diante de tamanho descaso com esta categoria fundamental para a sociedade, os trabalhadores da limpeza urbana no Brasil têm dado uma grande demonstração de coragem para se organizarem e defenderem seus direitos. Também dão provas diárias de abnegação para desempenhar sua profissão, ajudando a preservar milhares de vidas, mesmo em meio à grande exposição a que estão expostos nesta pandemia.

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