Mariane Vincenzi
RIO DE JANEIRO (RJ) – Com o início da quarentena, uma série de mudanças começaram a surgir. A necessidade de ficar em casa e manter o isolamento social fez com que as várias atividades passassem a ser online, além de trazer várias dificuldades para a vida das mulheres como a sobrecarga por conta do trabalho reprodutivo da casa (o cuidado das pessoas e a manutenção da casa, como limpeza e preparo de comida) e também o aumento da violência doméstica. Esse cenário, que no Rio de Janeiro é gravíssimo, mostrou a necessidade de fazer uma série de ações de apoio e solidariedade voltada as mulheres e aprofundar as atividades de formação e plenárias para engajar essas mulheres e mantê-las próximas.
Quarentena Brincante e Participação na Rede Solidária do MLB
Com a pausa das aulas presenciais nas escolas e o não funcionamento das creches, muitas mães se viram cuidando dos filhos por muito mais tempo, aumentando a quantidade de trabalho dentro de casa. Na maioria dos lares do Rio elas são as únicas a se dedicarem a esse trabalho.
Junto com o Movimento de Luta nos Bairros, Vilas e Favelas (MLB), o Movimento de Mulheres Olga Benario criou a campanha Quarentena Brincante, que tinha como principal objetivo arrecadar doações de brinquedos, livros infantis ou quantias de dinheiro para compra de materiais de pintura para a montagem de kits que seriam doados principalmente com cestas básicas para as famílias que tivessem crianças em casa. A campanha se encerrou no fim de agosto, após várias doações terem sido feitas, inclusive se expandindo para além da rede.
Plataforma Todas Olgas e o Combate à Violência contra a Mulher
Por conta da recomendação de se ficar em casa, muitas mulheres se viram na presença de seu abusador constantemente. Segundo os dados disponibilizados pelo Tribunal de Justiça do Rio, houve um aumento de 50% na quantidade de denúncias feitas com apenas dois meses de quarentena, aproximadamente.
Nessa realidade, uma série de ações começaram a ser mobilizadas pelo movimento. Foram feitos panfletos e cartazes com informações para que as vítimas pudessem denunciar suas agressões, assim como vídeos silenciosos para que mulheres em situação de risco conseguissem receber essas instruções sem levantar suspeitas dos seus abusadores.
Com o aprofundamento da pandemia, essas ações foram ampliadas e foi criada a plataforma de combate à violência contra a mulher do Movimento de Mulheres Olga Benario, com o nome de Todas Olgas.
A Todas Olgas tinha a ideia de ser um canal de comunicação com caráter informativo para essas mulheres poderem pedir ajuda. Através do aplicativo Wickr Me, que tem como proposta um ambiente seguro para a troca de mensagens sem a necessidade de um número de telefone. O aplicativo também não permite tirar prints da tela e deleta as mensagens automaticamente depois de um período de horas.
Além disso, foi montado um roteiro a se seguir para ajudar as vítimas que entrassem em contato. Nesse roteiro, o foco principal era auxiliar como levar os casos para a delegacia, casas de referência para mulheres, ajudar a encontrar ajuda jurídica à longa distância, consultas psicológicas e ajuda médica prestada por profissionais da área da saúde caso a vítima estivesse machucada. Desde o início da pandemia, algumas mulheres já foram auxiliadas através de denúncias.
Para conseguir melhorar o auxílio prestado às vítimas, foi montado um formulário para conseguir voluntários homens e mulheres que fossem profissionais já formados ou estudantes da área jurídica, saúde entre outras que estivessem dispostos a ajudar. No total, há 20 voluntários no comitê jurídico e técnico, formado por pessoas da área jurídica e de áreas diversas que podem ajudar com planejamento familiar ou econômico caso a vítima queira sair de casa. Já no comitê de saúde, há 12 profissionais formados por psicólogos e enfermeiros.
A coordenação estadual do movimento criou grupos de trabalhos, um deles sendo voltado para o trabalho do Todas Olgas. A criação desse GT tinha também o objetivo de aproximar mais mulheres dessa campanha, assim como as voluntárias mulheres que passaram a conhecer o movimento e a integrá-lo.
Caso queira fazer alguma denúncia de violência contra mulher, precise ou conheça alguém que necessite de ajuda por se encontrar em situação de risco, entre em contato com o usuário @movimentolga no aplicativo Wickr Me, ou entre em contato com alguma militante do movimento para que seja encaminhada ajuda o mais rápido o possível.
Ações contra a LGBTfobia
Com a quarentena, muitas mulheres LGBT’s se veem presas com familiares que não as aceitam. Mulheres lésbicas e transsexuais, por exemplo, são grande parte das estatísticas de violência doméstica, mas esses números muitas vezes são escondidos com a intenção de invisibilizá-las.
Em parceria com a Unidade Popular, o movimento promoveu no mês de maio um curso intitulado “A Teoria Marxista e o Seu Papel na Luta contra a LGBTfobia”. No decorrer da atividade foi explicado um pouco sobre a origem da opressão aos LGBT’s e como podemos nos organizar para combater o preconceito. Em Junho, por ser o mês Orgulho LGBT, o curso foi liberado no canal de Youtube do Olga.
Foram organizadas também uma série de rodas de conversa chamadas “Escuta a Sapatão” em parceria com o coletivo Ocupa Sapatão – Baixada no mês de agosto para falar sobre a Visibilidade Lésbica. Foi um encontro por semana durante o mês, com o temas como a história do Movimento Lésbico no Brasil, a Questão Racial, a saúde das mulheres lésbicas e o Dia da Visibilidade Lésbica.
Atividades de Formação
Para não parar com a formação teórica das militantes, o Movimento Olga Benario criou dois Grupos de Estudo online semanais para mulheres. Foram lidos diversos textos de várias autoras, como Alexandra Kollontai, Lélia Gonzales e Isabel Larguia. Os encontros promoveram também a leitura coletiva do livro completo Mulheres, Raça e Classe, de Angela Davis.
Em parceria com o Movimento de Mulheres da Região dos Lagos, foi realizado um curso de formação chamado Curso Rayzza Ribeiro de Formação Política para Mulheres da Região dos Lagos, com o intuito de fortalecer a formação das mulheres durante a pandemia. Sua duração foi de 5 encontros e debateu diversos temas ligados ao feminismo.
Além disso, foi criado um quadro no Instagram em que são postados vídeos sobre vários temas ligados ao feminismo chamado Fala, Olga. Paralelamente, foi criado um quadro mensal chamado Leia, Olga para recomendar leituras Feministas Marxistas assim como matérias do Jornal A Verdade.
A Luta Pelo Socialismo Continua
O Movimento de Mulheres Olga Benario no Rio entendeu que era importante não parar a luta mesmo com as dificuldades no período de pandemia. O ataques contra as mulheres e a classe trabalhadora não cessaram: demissões em massa, dificuldades em garantir o auxílio emergencial, a diminuição do valor do auxílio, aumento da violência contra a mulher, o aumento dos preços de alimentos entre outras dificuldades.