Trabalhadores ainda relatam más condições de trabalho, porém que a luta realizada em março conquistou vitórias para a categoria. Mas é preciso avançar.
Redação São Paulo
SÃO BERNARDO DO CAMPO (SP) – Os trabalhadores da empresa de telemarketing Atento iniciaram uma paralisação no dia 19 de março contra as más condições sanitárias da empresa em meio a pandemia.
Fruto dessa luta organizada pela Unidade Popular (UP) e pelo Movimento Luta de Classes (MLC), os trabalhadores conquistaram melhorias nas condições do ambiente de trabalho, transferência de vários trabalhadores para o trabalho remoto e a garantia de quarentena para quem fazia parte do grupo de risco.
Após 5 meses da mobilização, os trabalhadores que estavam em trabalho remoto estão voltando ao trabalho presencia. O Jornal A Verdade entrevistou Pedro (nome fictício) sobre a situação dos operadores e operadoras da Atento nesta tentativa de retorno.
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Como foi trabalhar de home office nesses 5 meses? Eu continuei trabalhando presencialmente, fui um dos poucos da empresa. Mas o pessoal que saiu de home office relata que foi um caos. Os operadores não tinham suporte, o sinal sempre caía, muitas vezes o sistema travava e os atendimentos eram realizados apenas para que a empresa faturasse o valor que recebe por ligação, mas não era possível resolver o problema do cliente.
Outro problema é que a empresa passou a dar uma ajuda de custo de R$80,00 para quem estava trabalhando em casa, mas isso não cobre os custos de energia elétrica e internet, logo o pessoal tinha que tirar dinheiro do próprio bolso para poder trabalhar. A internet das casas geralmente não suportava as ferramentas de atendimento e aí vinha a pior parte: quando acontecia falha no sinal da internet havia muita pressão psicológica por parte dos supervisores, que tratavam os operadores como vagabundos e ameaçavam descontar no salário o tempo em que não era possível atender. Por último, foi realizado desconto do vale-transporte e do vale -alimentação do pessoal, o que significa que nesse período recebemos menos pelo nosso trabalho.
E como foi para vocês que ficaram na empresa? Criou-se um clima de ameaças! Diziam que agora que haviam poucos funcionários seriam necessários que todos fizessem banco de horas, que nesse momento iriam ver quem ‘estava com a empresa’ e ‘quem não estava’, quem não colaborasse seria lembrado em um futuro momento de demissões.
O engraçado é que quem não fez banco de horas ou faltou por medo do contágio ficará lembrado, agora, quem trabalhou ainda mais nesse momento de pandemia, até hoje, não recebeu nem mesmo um ‘obrigado’.
Na época da paralisação dos operadores a empresa foi fechada pela vigilância sanitária por não garantir condições básicas para os trabalhadores. Como ficou esta questão depois da mobilização? É verdade que houve mudanças e que foi importante, a luta valeu a pena! Mas fizeram um serviço bastante porco. Primeiro que mesmo com o quadro reduzido a aglomeração era inevitável devido à dinâmica da empresa, por exemplo no horário do almoço; segundo que o álcool em gel que era disponibilizado era de péssima qualidade e parecia diluído em água. As toalhas descartáveis que a empresa disse que iria distribuir quase não existem e muitas vezes ficam só na sala da chefia.
E vocês continuaram denunciando para a Vigilância Sanitária? Sim, mas é complicado. A empresa acumula muitas denúncias há anos e mesmo nas visitas que fez a Vigilância nunca foi para os piores galpões da empresa onde as plataformas de atendimento são mais sujas e há pontos de goteira no telhado, onde o próprio telhado está caindo e a água passa perto da fiação com os operadores trabalhando sob risco de acidente, de choque, etc. As orientações da Vigilância Sanitária são cumpridas apenas na aparência; o distanciamento, o uso de máscaras, tudo… não há uma real preocupação com os trabalhadores, apenas com a aparência e em evitar problemas. De dois meses para cá, a quarentena está fracassando em muitos lugares, na Atento não está diferente.
Como está o processo de retorno do home office? Está como a saída, falta de planejamento. Chamaram muita gente de volta sem ter noção de quantidade. Chamaram mais pessoas do que mesas disponíveis. Nesse período de pandemia as coisas foram bem difíceis: no setor que presta serviço para a Vivo foram demitidos mais de 400 funcionários, há setores que prestam serviço ao Banco Pan que todos operadores foram mandados embora. Aqueles que haviam sido contratados até um mês antes do início da quarentena também foram todos demitidos. Ao mesmo tempo, nesse período, a Atento fez novas contratações. Aqui é assim! Para eles é fácil, podem demitir à vontade, sempre tem jovem desempregado na fila esperando uma chance.
E como tem sido a atuação do sindicato frente a essa situação? Somos representados pelo Sintetel, um sindicato filiado à Força Sindical. É um sindicato que não representa os trabalhadores e não é de hoje. Em outros anos os trabalhadores imploravam ajuda ao sindicato e a gestão no máximo fazia uma ‘manifestação’ de meia hora próxima à empresa, com música para quem quisesse dançar (coisas que não davam para levar a sério).
Quando cobramos por soluções e pela luta por nossos direitos o sindicato faz acordos desfavoráveis ou irrelevantes para os trabalhadores; como o nosso reajuste anual que nunca é respeitado ou o ‘cala boca’ de R$200,00 a R$300,00 que sempre recebemos no mês de abril como um ‘reajuste tardio’, mas que não resolve, pois nos próximos meses o salário só piora. Inclusive, até mesmo as inúmeras denúncias de assédio para o cumprimento de metas não são levadas a sério, e aqueles que denunciam muitas vezes são mandados embora em sequência, sem nenhuma justificativa. Parece que tudo que levamos ao sindicato chega ao ouvido da empresa. São inúmeros casos parecidos, de denúncias de assédio até denúncias de práticas ilegais que já presenciamos, denunciamos e só recebemos retaliações em troca.
Quando começou a pandemia o Sintetel não fez nenhum pronunciamento em prol dos trabalhadores. Até que surgiu na porta da empresa a galera da Unidade Popular fazendo os operadores voltarem a pensar e a ter esperança na luta por seus direitos; com isso conseguimos fechar a empresa até que ela oferecesse o mínimo necessário para proteger os funcionários contra o vírus. Assustados, os diretores do sindicato resolveram por dois dias andar pela empresa e conversar com os trabalhadores pedindo opinião, mas essa agitação durou menos de uma semana e logo eles sumiram de novo, como sempre.
Depois das paralisações e dos últimos meses que foram muito difíceis para os operadores de telemarketing, que recado você gostaria de deixar para os leitores do Jornal A Verdade? É diante destes abusos, humilhações e desvalorizações dos funcionários com um sindicato corrupto e comparsa da empresa, que se faz necessária a intervenção de organizações como o Jornal A Verdade e a Unidade Popular pelo Socialismo (UP) que levam aos trabalhadores a consciência, a força e a coragem para lutar por seus direitos, sendo a mídia, a voz daqueles que tentaram gritar por socorro e foram calados por seus algozes!
E digo mais: os militantes da Unidade Popular e do MLC deveriam estar na gestão do sindicato, pois eles, mesmo sem receber um centavo para estar ali, têm arriscado suas vidas e segurança diante da empresa e da pandemia, para defender nossos direitos. É um marco histórico em nossa luta por um salário digno e condições justas de trabalho ter o apoio e direcionamento de um grupo que está verdadeiramente conosco e não com o patrão.