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sexta-feira, 22 de novembro de 2024

“Quando a gente para, eles não ganham, então vão ter que nos ouvir com essa paralisação!”

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Diretoria da AIT 

Faixa dos trabalhdaores do telemarketing durante manifestação em São Paulo. Foto: Reprodução.

SÃO PAULO – A Associação Independente de Trabalhadoras e Trabalhadores Terceirizados (AIT) tem realizado uma campanha de mobilização dos trabalhadores do telemarketing do ABC para construir a paralisação do dia 24/03 entre os trabalhadores da Atento. Nesse processo conhecemos muitos trabalhadores, suas vidas, histórias e lutas. Foi assim que conhecemos um trabalhador da unidade São Bernardo do Campo que nos contou um pouco mais do que está passando na empresa. Para a segurança do trabalhador ocultamos suas informações pessoais.

AIT: Há quanto tempo você trabalha na Atento?

Trabalhador: Faz quase um ano que eu trabalho lá, já tinha trabalhado um período com eles e agora voltei. Sempre trabalhei no mesmo galpão.

Qual é a realidade de ser trabalhador do telemarketing? 

Tem muita gente que acha que trabalhar atendendo o telefone, ser um trabalhador do telemarketing no caso, não faz nada, fica sentado no ar condicionado, mas é muito complicado. Sofremos uma grande pressão psicológica, tanto referente a entrega resultados, quanto a monitoria da empresa nas nossas ligações, para saber se estamos trabalhando no padrão que a empresa quer, é muita cobrança em cima da gente. Além disso, nós temos três pausas, duas de 10 minutos e uma de 20 minutos, nós não temos descanso, um tempo da mente descansar para voltar a atender as ligações… Tem dias que a máquina não para de mandar uma ligação, sai de uma e entra em outra, não temos tempo de tomar um gole de água, respirar e voltar a falar com os clientes, porque já tem outra ligação. É muito difícil. 

Fale um pouco sobre a remuneração do seu trabalho. 

Nosso vale é entre R$220 – R$230 mensal, isso dá R$8 por dia para comer. Eu preciso tirar do meu próprio bolso para me alimentar durante o trabalho, não tem condições de trabalhar das 09h – 17h sem se alimentar. Na frente da Atento tem dois restaurantes que um salgado custa R$6, se você quiser beber vai precisar colocar do seu bolso para inteirar e poder tomar alguma coisa. A Atento é a empresa que menos paga nessa questão de alimentação, conversando com outros colegas que também trabalham de telemarketing em outras empresas dizem que o que recebemos é muito baixo. A questão do salário é o seguinte: antes da nova atualização do salário mínimo, na carteira estava registrado o valor de R$998. Livre eu pego mais ou menos R$850 e eu trabalho mais de 37 horas na semana. 

Quais mudanças foram realizadas no seu ambiente de trabalho decorrentes da pandemia da COVID-19?

Eles fizeram um planejamento de estender as PAs (posições de atendimento), as mesas com uma distância de 2 metros entre as pessoas, começaram a exigir máscaras. Uma vez por dia uma enfermeira ia medir a nossa temperatura, colocaram álcool em gel. Eles também deram um paninho para higienizar o PA e a cadeira –  porque tem gente trabalhando outros turnos também, as PA são compartilhadas, um fone único. Isso no começo, com o tempo foi diminuindo os cuidados, a enfermeira foi deixando de aparecer até chegar agora no ponto que não tem mais, trocaram a mão de obra da enfermeira por uma máquina que mede a temperatura, pelo menos onde era o antigo lugar era assim, lá em São Bernardo, agora em Santo André não tem. Você coloca o pulso ou a cabeça e entra, não tem fiscalização.

Qual o motivo dessa mudança de local de trabalho da Atento de São Bernardo para Santo André? 

Não sabemos o porquê dessa mudança. Os superiores dizem que essa mudança foi para manter os nossos empregos. Foi de uma hora para outra, eu estava saindo do trabalho e avisaram para todo mundo que ia ser assim, que não tinha opção, nós tínhamos que ir trabalhar lá em Santo André porque em São Bernardo do Campo não poderíamos mais trabalhar. Não sabemos se foi a empresa que contrata o serviço ou a própria Atento que decidiu isso, porque só falam que foram os superiores que decidiram. Nós não estamos recebendo um adicional de transporte, eles dizem que vão ressarcir, mas até agora somos nós que pagamos com o nosso próprio dinheiro. Hoje falaram que vão providenciar um transporte de São Bernardo à Santo André, isso só aconteceu porque várias pessoas foram reclamar, inclusive eu, sobre isso. Fiquei indo e voltando de bicicleta, quase 7km porque não tinha o dinheiro da passagem para todos os dias e quando tinha pegava os ônibus sempre lotados. Eles não estão nem aí se temos condições de chegar, se estamos ficando mais tempo expostos ao vírus. Eles reclamam das pessoas que apresentam atestado da COVID, reclamam das pessoas que estão doentes em casa, que moram com pessoas de risco. Eles só querem ver a gente sentado atendendo o telefone independente de qualquer coisa

O que a Atento fez ou disse com relação ao trabalho remoto/home office

Foi oferecido que os trabalhadores fossem trabalhar em home office, uma promessa deles há duas semanas atrás, antes de ter toda essa mudança de local de trabalho. O que eles disseram foi que todos iriam fazer home office, cada um com a sua máquina, mas a realidade é que menos da metade do pessoal foi trabalhar em casa. Lá no galpão onde a gente trabalha tem mais ou menos 200 pessoas em todos os horários, sai um e entra outro no lugar. Então foi isso, um grupo de pessoas foi trabalhar em home office e as outras pessoas que ficaram esperando a resposta da data de quando iriam não receberam nenhuma resposta, ninguém tocou mais no assunto e agora mudamos de galpão e continuamos sem saber se vamos ou não trabalhar em casa.

O que você acha da paralisação organizada pela AIT do dia 24 de março? 

Fiquei sabendo esses dias da paralisação. O pessoal da Atento tem medo de se envolver com isso porque tem medo de ser mandado embora e também nós não conseguimos ser unidos, porque não temos tempo de falar uns com os outros lá. Eu acho importante essa parte de lutar pelos nossos direitos, o cara que está lá em cima, que é o chefe, não anda de transporte público, não anda a pé, não vem trabalhar aqui com a gente, de qualquer forma ele vai continuar lá na casa dele, protegido, cada dia mais rico e nós vamos continuar aqui sendo cada vez mais explorados. Boa parte das pessoas querem fazer a paralisação, mas essa desunião não ajuda a gente, o medo é grande de meia dúzia trabalharem normal e o restante ser mandado embora. Isso é bem recorrente aqui das pessoas serem mandadas embora porque questionam. Eles acham que só porque nós trabalhamos seis horas sentados, que não temos direito a nada, mas nós somos trabalhadores também! Os terceirizados são uma classe que é largada às traças, quase esquecida. Eles nos exploram tanto, porque desprezam o nosso trabalho e nós não reagimos. Antes de trabalhar na Atento, estava procurando emprego e fui ver uma vaga em uma loja de departamento, dessas famosas, o salário era baixíssimo, de R$300 mensal para trabalhar três dias na semana, sem nenhum adicional, era isso e pronto. Isso é um absurdo! Precisamos nos posicionar, no Brasil é assim: muito trabalho, pouco salário e quase nenhum benefício. Temos que lutar pelos nossos direitos, senão vamos continuar cada vez mais prejudicados, cada dia recebendo menos, cada dia com mais trabalhadores terceirizados sendo explorados. 

Qual a mensagem que você diria para os outros trabalhadores do telemarketing?

Eu diria: não aceitem tudo que eles te falam, às vezes é bom apenas pra eles, mas é prejudicial pra você. Não adianta você se prejudicar por uma empresa que não está nem aí pra você! Pra eles somos só mais um número, só mais um atendente, pra eles tem várias outras pessoas querendo a nossa vaga. Não aceite que eles sempre estão com a razão, porque não estão. Quem sempre é visto como mau funcionário somos nós, aqueles que não aceitam as injustiças. Precisamos falar mesmo, temos direitos assim como qualquer outro trabalhador. Quando a gente para, eles não ganham, somos nós que damos lucro pra eles, então somos muito importantes e eles vão ter que nos ouvir com essa paralisação!

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