Nana Sanches*
PORTO ALEGRE – O ano de 2021 se encerra de forma trágica para as mulheres do estado do Rio Grande do Sul.
Apesar dos dados indicarem o aumento de 26% nos casos de feminicídio no Rio Grande do Sul de 2020 para 2021, os ataques do Estado aos serviços de atendimento às mulheres vítimas de violência não diminuíram. Pelo contrário: neste mês de dezembro, as trabalhadoras do Centro de Referência Vânia Araújo e da Casa de Referência Mulheres Mirabal vêem seus serviços em risco, fruto de uma política misógina que tem destruído a rede de enfrentamento à violência de gênero.
Hoje, o Centro de Referência Vânia Araújo se encontra em um estacionamento, um “buraco”, localizado em um Centro Administrativo do estado, sem espaço adequado para acolhimento de mulheres, em um desrespeito tanto à população quanto às servidoras públicas que trabalham no Centro.
Já no caso da Casa de Referência Mulheres Mirabal, o Ministério Público do RS lançou uma recomendação para que a Casa não receba mais mulheres vítimas de violência encaminhada pelos serviços da já desgastada rede pública, na qual faltam vagas e profissionais para dar conta do aumento de casos de violência contra as mulheres, especialmente durante a pandemia. Lembremos que o mesmo Ministério Público, em junho deste ano (2021), respondeu à solicitação de vistoria com um parecer favorável, negando ter identificado as irregularidades denunciadas e reconhecendo o caráter diferencial do trabalho realizado: “Considerando que não foram identificadas pessoas em situação de vulnerabilidade, bem assim que a instituição não recebe verba pública nem firmou convênio com o Poder Público, não se configura hipótese de fiscalização nem acompanhamento, ausentes ainda irregularidades a demandar a intervenção do Ministério Público.”
E ainda: “Ademais, também não aportou ao feito denúncia de falta ou irregularidade na prestação do serviço de acolhimento às vítimas de violência doméstica, inexistindo então fundamento para se dar prosseguimento ao feito.”
O que mudou de lá para cá?
Por que, em 2016, quando a Secretaria de Mulheres do RS foi fechada, o Ministério Público não atuou contra tal decisão? Na época, as mulheres gaúchas alertaram que o fim da citada Secretaria traria como consequência o aumento dos casos de violência às mulheres gaúchas. E foi exatamente neste contexto que a Casa Mirabal surgiu e, ao contrário do que o MP-RS sustenta, trabalha com uma ampla rede de profissionais, além de uma equipe com assistente social, psicólogas e advogadas que trabalham diretamente nos casos encaminhados à Mirabal.
Não fica difícil entender porque os casos de violência contra as mulheres aumentaram em nosso estado. Se o Ministério Público, que tem como obrigação fiscalizar o poder público, não assume um posicionamento favorável à vida das mulheres, por que o Estado deveria fazê-lo?
Qual órgão institucional tomará a frente nesta luta? A quem as mulheres gaúchas devem recorrer?
São alguns dos questionamentos que ficam em meio a tantas violações, injustiças e violências que presenciamos diariamente no ano de 2021. Infelizmente, não temos nada a comemorar.
*Coordenadora da Casa de Referência Mulheres Mirabal e Coordenadora Nacional do Movimento de Mulheres Olga Benario