Desde o início do mês de março, os servidores da Educação da rede estadual estão em greve em MG. Entre as pautas defendidas pela categoria, estão o pagamento do piso salarial e o combate ao projeto de recuperação fiscal proposto pelo Governo, que congela em 9 anos os salários dos servidores públicos do estado.
Maura Silveira Gonçalves de Britto – Professora da Educação Básica no município de Ouro Preto, doutoranda em História pela UFOP e militante do Movimento de Mulheres Olga Benario/MG.
MINAS GERAIS – Educação é palavra comum nos discursos eleitorais que inflamam representantes da esquerda e da direita a cada quatro anos. Ao mesmo tempo, é um termo vazio de sentido, quando a cada ano assistimos nossos professores ocuparem as ruas para exigir o que lhes é direito constitucional.
Em Minas Gerais, desde o início do mês de março, os servidores da Educação da rede estadual estão em greve. Entre as pautas defendidas pela categoria, estão o pagamento do piso salarial e o combate ao projeto de recuperação fiscal proposto pelo Governo, que congela em 9 anos os salários dos servidores públicos do estado. Os servidores da Educação já estão desde 2015 sem que o seu salário seja reajustado e recebem menos do que o Piso Federal da Educação.
O Piso Federal é o valor mínimo que deve ser pago aos professores do magistério público da educação básica, para uma carga horária de, no máximo, 40 horas semanais. A lei 11.738, de 2008, estabelece que os reajustes devem ocorrer a cada ano, em janeiro. Em 04 de fevereiro último, o piso federal da Educação teve o reajuste de 33,24%, correspondendo ao valor de R$3.845, 63. Atualmente, o salário-base de um professor em Minas Gerais, para uma carga horária de 24 horas semanais é de R$2.135,64.
Em Minas Gerais, na legislação vigente, o artigo 201-A da Constituição do Estado estabelece:
A Mesa da Assembleia Legislativa do Estado de Minas Gerais, nos termos do § 4º do art. 64 da Constituição do Estado, promulga a seguinte emenda ao texto constitucional:
Art. 1º Fica acrescentado à Constituição do Estado o seguinte art. 201-A:
“Art. 201-A. O vencimento inicial das carreiras dos profissionais de magistério da educação básica não será inferior ao valor integral vigente, com as atualizações, do piso salarial profissional nacional dos profissionais do magistério público da educação básica previsto no inciso VIII do caput do art. 206 da Constituição da República.
- 1º Considera-se como jornada de trabalho, para fins de percepção integral do piso salarial a que se refere o caput, a jornada de vinte e quatro horas semanais.
- 2º Serão reajustados na mesma periodicidade e no mesmo percentual adotados para a atualização do piso salarial a que se refere o caput os valores de vencimento das carreiras de Professor de Educação Básica – PEB -, Especialista em Educação Básica – EEB -, Analista de Educação Básica – AEB -, Assistente Técnico de Educação Básica – ATB -, Técnico da Educação – TDE -, Analista Educacional – ANE -, Assistente de Educação – ASE – e Auxiliar de Serviços de Educação Básica – ASB -, sem prejuízo de revisão geral ou outros reajustes.”.
A referida lei trata do pagamento do piso nacional, que por sua vez está disposto no artigo 206 da Constituição da República e na Lei Federal 11.738, de 2008, que, no estado de Minas Gerais, deve ser pago integralmente para uma carga horária de 24 horas semanais e sendo corrigido a cada mês de janeiro.
Os investimentos em Educação no Brasil, são regulados pela nossa Constituição. Por ela, estados e municípios devem investir 25% de seu orçamento nessa área, seja em infraestrutura das escolas, seja na remuneração dos servidores. Para garantia desses investimentos, existe um fundo específico: o FUNDEB (Fundo de Manutenção da Educação Básica e da Valorização dos Profissionais da Educação). As verbas oriundas do FUNDEB são “carimbadas”, isto é, só podem ser aplicadas na manutenção de toda educação básica, que se estende da educação infantil ao ensino médio. É constituída por repasses do orçamento da União e dos estados que só podem ser aplicados na educação pública.
Segundo dados do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese), o saldo atual do FUNDEB, referente ao ano de 2021, no estado de Minas Gerais é de 3,45 bilhões de reais. Isto é, Romeu Zema terminou o ano financeiro de 2021 investindo 6,6 milhões de reais a menos que o percentual exigido pela Constituição na Educação Básica, mesmo havendo saldo para isso. Desde o início de seu mandato, Zema tem investido menos que esse percentual na educação pública de Minas Gerais. Ao investir menos em educação básica do que o percentual de 25% do orçamento e se recusar a fazer o reajuste de 33,4% de reposição salarial dos servidores da Educação, ele está descumprindo tanto a Constituição Federal quanto a Constituição do Estado de Minas Gerais. O Governador de Minas Gerais já foi desmentido pelo Tribunal de Contas do Estado (TCE), que reforçou o entendimento do Sindicato da categoria de que há verba para se fazer o reajuste legal, definido pela Lei do Piso Federal do Magistério. Romeu Zema usou até mesmo a Lei de Responsabilidade Fiscal para justificar seu descumprimento às Constituições Federal e Estadual. Argumento que foi rebatido pelo TCE/MG, em parecer do último dia 23 de março. Para o conselheiro Durval Ângelo: “Acho que agora é um momento mais que especial, quando nós tivemos mais de 33% de reajuste no piso nacional do magistério, para ficar bem expresso pelo órgão de contas de Minas Gerais. A vedação da LRF não pode, em hipótese nenhuma, modificar o texto constitucional”.
Zema se recusa a fazer o reajuste de 33,24%, mesmo com o repasse da verba já tendo sido feito pela União. Propõe um reajuste de apenas 10,6%, e requer o congelamento do salário dos servidores do estado de Minas Gerais por mais 9 anos, em seu projeto de Recuperação Fiscal que penaliza ainda mais a situação da população mineira, atendida pelos serviços públicos de educação e saúde.
No último dia 23, os servidores da Educação se reuniram em frente à Assembleia Legislativa de Minas Gerais para a realização da assembleia estadual da categoria e votaram pela continuidade da greve. Duas coisas sempre impressionam em todas as manifestações dos servidores da Educação: a presença esmagadora de mulheres e de mulheres de todas as idades. Há servidoras com mais de 50 anos, que já deveriam ter a tranquilidade de uma aposentadoria digna, após uma vida inteira dedicada a educar os filhos dos outros. Há servidoras jovens, em início de carreira, participando pela primeira vez, caminhando ao lado de servidoras que já conhecem a luta, mas que também esperam que essa luta não seja necessária a cada governo, a cada ano letivo.
E a cada greve, vemos como é cansativo para essas mulheres a necessidade de ficar explicando o tempo todo para os governantes e para a sociedade o que todos já deveriam saber: docência é profissão, não é filantropia. E como toda profissão, precisa ser valorizada socialmente e financeiramente, para muito além do falatório demagogo que ocupa as redes no mês de outubro.
Ninguém gosta de entrar em greve. Ninguém viaja horas e horas para ocupar a Assembleia Legislativa e exigir que os seus direitos constitucionais sejam respeitados, por ser algo divertido! Cada uma das professoras, servidoras e servidores que ocupou as ruas de Belo Horizonte na última quarta-feira, preferia estar na sua sala de aula. Mas nenhum trabalhador paga suas contas com amor à profissão. A inflação não é mais baixa para os professores. A gasolina não custa menos para os professores. Mas o salário dos professores pode ser congelado por 5 anos? Os direitos dos servidores da Educação podem ser usados como moeda de troca nas negociatas do governador com os deputados estaduais? Orçamentos ocultos – verba pública paga aos deputados em emendas parlamentares, sem destinação definida – podem ser usados como propina para comprar o voto dos deputados para aprovar um regime de recuperação fiscal que congela por mais 9 anos os salários dos servidores públicos? É isso que está acontecendo em Minas Gerais! É por isso que os professores estão em greve e tomaram as ruas ontem e irão tomar novamente no dia 31 de março!
Na última semana, os servidores da Educação obtiveram vitórias importantes:
1) O TCE votou que a Lei de Responsabilidade Fiscal não é justificativa para não dar o reajuste da educação. O Piso da Educação é uma Lei Federal e está acima de uma lei complementar.
2) Na audiência pública do dia 22 de março, foi demonstrado em números que há em caixa R$7 bilhões em recursos da educação. Isto é: há dinheiro para pagar o Piso Federal aos servidores da Educação. Romeu Zema se recusa porque não valoriza a educação pública e muito menos nossos professores e demais servidores da categoria.
3) Há disposição dos(as) deputados(as) e da presidência da Casa em votar um reajuste maior para nossa categoria. Por isso, é importante pressionar os representantes do Legislativo estadual que votem a favor das emendas que garantem a complementação do reajuste dos servidores da Educação até atingir o percentual de 33,24%.
Além de se mostrar intransigente na negociação com a categoria – em mediação proposta pelo Judiciário estadual, a secretária adjunta abandonou a mesa de negociação sem apresentar nenhuma proposta ou avaliar a proposta dos representantes dos servidores em greve – Romeu Zema tenta ganhar tempo, com uma decisão monocrática do desembargador Raimundo Messias, que considerou a greve ilegal, mesmo com toda a documentação apresentada pelo Sind-Ute-MG (Sindicato Único dos Trabalhadores em Educação de Minas Gerais). A respeito dessa liminar, em nota o sindicato dos servidores da Educação afirma:
“Na data de ontem, 23/03/2022 (quarta-feira), foi disponibilizada a decisão do desembargador Relator Raimundo Messias na ação de greve movida pelo Estado, cuja decisão não acatou o pedido do Sind-UTE/MG, de suspender a liminar que foi concedida. No entanto, é importante esclarecer que o mérito definitivo do recurso do Sind-UTE/MG ainda não foi julgado, trata apenas de uma decisão do relator desembargador que manteve a liminar já concedida anteriormente sem qualquer modificação.
Também é importante dizer que não há nenhuma determinação de lançamento de falta comum para os profissionais que aderiram a greve, tanto que a própria SEE emitiu o Memorando-Circular nº 4/2022/SEE/SGP – GABINETE em 21/03/2022, orientando que as faltas decorrentes da adesão à greve devem ser lançadas como falta-greve. Assim, o mérito do recurso do Sind-UTE/MG contra a decisão liminar será ainda apreciado pelo colegiado do TJMG, não havendo que se falar em ilegalidade da greve e lançamento de falta comum, até que o processo tenha o seu mérito julgado de forma definitiva.”
O Movimento de Mulheres Olga Benario conclama a todos que apoiem os professores e servidores da Educação de Minas Gerais. Se você sabe a importância que a Educação tem para uma sociedade, questione o governo, não os servidores em greve. Fortaleçam o movimento da Educação pressionando os deputados da sua região e se manifestando nas redes sociais do Governo de Minas Gerais.
Seguiremos em luta em defesa dos nossos direitos!
Fontes: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2007-2010/2008/lei/l11738.htm
https://www.almg.gov.br/consulte/legislacao/completa/completa.html?tipo=EMC&num=97&comp=&ano=2018
https://sindutemg.org.br/noticias/sind-ute-mg-destaca-tce-reconhece-que-a-lei-de-responsabilidade-fiscal-nao-e-impeditivo-para-a-aplicacao-dos-reajustes-do-piso-salarial-em-minas-gerais/
https://sindutemg.org.br/noticias/nota-de-esclarecimento-sobre-a-acao-movida-pelo-governo-do-estado-na-greve-de-2022/
https://www.otempo.com.br/politica/pagamento-do-piso-da-educacao-nao-precisa-observar-limites-da-lrf-diz-tce-1.2640815?fbclid=IwAR3I-HF1Fo7l8hQch73SxYegXfvmWdrm2SXxNTnf011j82n7tcPlxYBUuzk
Acho justíssima a reinvindicação, só lamento o uso da expressão “TODES” pelos que deveriam ser os representantes da educação….
Bom dia! Vamos juntos lutar por salários justo que é por nosso direito quanto trabalhadores da educação .
Matéria muito esclarecedora. #ZemaPagueoPisoda Educação
Entender a linguagem neutra como uma demanda do presente também faz parte do trabalho de representantes da Educação, uma vez que devemos estar atentos às questões do nosso tempo. Sempre. Já a escolha do uso termo termo “todes” ou da expressão “todos e todas”, fica a critério de cada autor.
Concordo com a greve e angustia me estarem nessa situação, sou esposa de professor e sei que é a profissão mais justa e perfeita e vejo somente descaso com essa categoria que todas as profissões necessitam dela: do professor que ensina a ler, a escrever a ser alguém e em pleno século 21 além de não darem aumento querem tirar o pouco que foi conquistado. É vergonhoso.
Muito justa a greve dos professores, essa é uma classe que deveria ser valorizada e muito bem remunerada em todas as épocas, e nunca foi. Se há um valor destinado para isso, por que não pagar o piso salarial? Professores, saibam: a sociedade apoia essa causa, está com vocês. Não cedam!